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Debbie Reynolds e o ocaso da Hollywood dourada

A morte da atriz aos 84 anos aproxima Hollywood do final do ocaso de sua época dourada, prestes a perder para sempre toda uma geração de estrelas

Debbie Reynolds em Nova York, em 1952.
Debbie Reynolds em Nova York, em 1952.John Rooney (AP)

A morte de Debbie Reynolds aos 84 anos  aproxima Hollywood do final do ocaso de sua época dourada, prestes a perder para sempre toda uma geração de estrelas que fizeram do cinema a sétima arte. Protagonista de Cantando na Chuva, Reynolds só tinha 19 anos quando ficou sob as ordens de Gene Kelly na comédia que o Instituto Americano de Cinema considera o grande musical de todos os tempos e o quinto melhor filme da história do cinema. Reynolds morreu no hospital Cedars Sinai de Los Angeles após sofrer uma embolia. Sua morte ocorreu apenas um dia depois da morte de sua filha, a também atriz Carrie Fisher. Mais conhecida como a princesa Leia de Guerra nas Estrelas, Carrie faleceu após sofrer um enfarte enquanto voava de Londres a Los Angeles. “Ela queria estar com Carrie”, disse o filho de Reynolds e irmão de Carrie Todd Fisher, à revista Variety.

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Nascida em El Paso, Texas (Estados Unidos) em 1 de abril de 1932, Reynolds passará à história não só como atriz, cantora e dançarina. O coração da estrela também esteve nos negócios, na preservação de uma indústria da qual fez parte e que soube valorizar como arte, e em seus trabalhos beneficentes centrados em proporcionar tratamento e diagnóstico para as doenças mentais por sua fundação. Além disso, será lembrada por seu talento jovial e divertido, sem ares de estrela, mas sabendo sempre como sobreviver às mudanças dessa indústria da qual tanto gostava e que só a morte de sua filha conseguiu derrubar.

Aos oito anos de idade a filha de um carpinteiro se mudou com toda sua família à dourada Califórnia. E em 1948 Mary Frances Reynolds já despontava como “Miss Burbank”, bairro de Los Angeles no qual morava e que atualmente abriga a maior parte dos estúdios de Hollywood. Uma beleza que lhe valeu imediatamente um contrato na Warner Bros. Foi Jack Warner a rebatizá-la como Debbie, ainda que profissionalmente o estúdio não a tenha feito progredir muito. De modo que quando seu contrato acabou Reynolds passou à concorrência, os estúdios MGM, onde trabalharia pelos próximos 20 anos. Lá rodou seu primeiro longa-metragem, Três Palavrinhas (1950), e seu grande filme de todos os tempos, Cantando na Chuva. O papel da inocente Kathy Selden buscando espaço no ninho de víboras que era Hollywood foi conseguido pelo estúdio. Gene Kelly, a estrela e diretor do projeto, não teve outro remédio a não ser aceitá-la, mas a submeteu a um rigoroso treinamento para prepará-la para o papel. Reynolds sempre o agradeceu. “Escolheram esse talento virginal, essa coisinha, e esperavam que estivesse à altura de Gene Kelly e Donald O’Connor, dois dos melhores dançarinos da indústria”, lembrou depois em uma entrevista.

Entre os amantes do cinema Reynolds também será lembrada por preservar a memória de uma Hollywood que agora desaparece

Nunca faltou trabalho a essa loira vigorosa, mas os títulos que vieram depois de Cantando na Chuva nunca estiveram à sua altura. De todos eles o único que lhe valeu o reconhecimento da indústria com uma indicação ao Oscar de melhor atriz foi A Inconquistável Molly (1964), musical que interpretou quando Shirley MacLaine se retirou da comédia. Ironicamente foi MacLaine que protagonizou com Meryl Streep o filme Lembranças de Hollywood baseado no livro que Carrie Fisher escreveu sobre a intensa relação que uniu mãe e filha. Uma Esperança Nasceu em Minha Vida, A Festa do Casamento, A Flor do Pântano, Será Que Ele É?, Mother, The Rat Race, A Conquista do Oeste e Dominique, entre outros filmes, completam sua filmografia. Sempre na ativa, Reynolds também trabalhou no campo da televisão com sua própria série, que só durou uma temporada, e com papéis recorrentes em outros sucessos televisivos como Roseanne, The Love Boat, As Super Gatas e Will & Grace.

Entre as principais premiações de sua carreira estão o prêmio pelo conjunto da obra entregue pelo Sindicato dos Atores em 2015 e o prêmio humanitário Jean Hersholt entregue no mesmo ano pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, mas que Reynolds não pôde receber em pessoa por estar convalescendo de uma operação. “Quando minha mãe recebeu o prêmio começaram a dizer como era bom que tivesse sido entregue a uma mulher. Ela preferiu lembrar que até aquele momento somente 17 mulheres haviam recebido a premiação entre 56 homens. É melhor que não o vendam como uma vitória à diversidade de gêneros”, lembrou sua filha durante sua última entrevista ao EL PAÍS.

Reynolds foi igualmente loquaz no que se refere a sua vida privada. As circunstâncias a obrigaram a ser. O divórcio de seu primeiro marido, o cantor Eddie Fisher, quando Carrie não tinha mais de dois anos, foi o escândalo da época. Reynolds se separou de Fisher ao descobrir que tinha um caso com sua melhor amiga, a atriz Elizabeth Taylor. Nunca quis ser a vítima. Seu segundo divórcio foi igualmente comentado, separando-se do fabricante de sapatos Harry Karl quando descobriu que a havia deixado na bancarrota com suas dívidas de jogo.

Entre os amantes do cinema Reynolds também será lembrada por preservar a memória de uma Hollywood que agora desaparece. A estrela comprou coleções inteiras de figurinos e outras peças de adereços quando estúdios como o MGM começaram a se desfazer de suas obras. Entre outras das peças preservadas estavam o vestido usado por Marilyn Monroe na cena mais lembrada de O Pecado Mora ao Lado, o chapéu-coco de Charlie Chaplin como Carlitos e os sapatos vermelhos de O Mágico de Oz. Seu desejo era que fizessem parte do museu que a meca do cinema ainda não tem, mas no final precisou leiloar a maior parte de suas peças. Algumas, entretanto, ficaram em poder da Academia para a futura construção do museu que Reynolds nunca chegará a ver.

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