Um Janot sob pressão defende a Lava Jato em meio à crise com o STF
Procurador-geral nega citação de Toffoli em negociação de delação do dono da OAS, agora cancelada
Os vazamentos de informações confidenciais marcam há tempos o passo da Operação Lava Jato provocando enorme controvérsia. Para ficar nos casos de maior repercussão recente, há as publicações na imprensa de informações de delações do ex-senador Delcídio do Amaral e do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado quando elas ainda estavam em negociação. Nesta semana, porém, o caso envolvendo supostos dados repassados pelo empreiteiro Leo Pinheiro, ex-presidente da OAS, elevou a tensão a um novo patamar ao abrir uma crise na delicada relação entre o Ministério Público Federal e o Supremo Tribunal Federal durante as investigações.
Nesta terça-feira, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, negou de maneira enfática que a negociação da delação de Pinheiro tenha envolvido a citação de um suposto elo promíscuo entre o ministro do Supremo, Antonio Dias Toffoli, e a OAS, como publicado pela revista Veja no fim de semana. A negociação da colaboração, em curso há meses e uma das mais esperadas por seu potencial de implicação, foi cancelada. “Ele (Leo Pinheiro) quebrou a confiança na negociação. Se você não tem mais confiança, não há mais negociação”, afirmou. “O fato noticiado não existiu, o anexo não existe, jamais chegou a qualquer dependência do MP, seja em Curitiba ou Brasília, esse fato é inexistente, ele se assemelha a um quase estelionato delacional”, disse.
De acordo com Rodrigo Janot, “não houve vazamento, mas uma pressão indevida para que haja a delação". A reportagem da Veja publicou que Leo Pinheiro afirmou que a residência do ministro em Brasília foi reformada com auxílio da OAS. Toffoli afirma que o serviço foi pago com seu próprio dinheiro, e que não houve irregularidade alguma na obra.
O discurso enfático do procurador-geral foi feito durante a reunião do Conselho Municipal do Ministério Público, nesta terça. Foi a oportunidade que encontrou para se defender da bateria de críticas e duros ataques feitos pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo, tanto ao Ministério Público como à Operação Lava Jato. Até pouco tempo atrás um defensor da Lava Jato, Mendes analisou, em entrevista à Folha de S. Paulo, que os procuradores estavam se aproximando "do terreno perigoso de delírios totalitários. Me parece que [os procuradores da Lava Jato] estão possuídos de um tipo de teoria absolutista de combate ao crime a qualquer preço". Poucos dias atrás, quando a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou ir à ONU questionar a imparcialidade do juiz Sérgio Moro e da força-tarefa do Ministério Público, Mendes chamou a iniciativa de "precipitada" e de "índole política".
O ministro Mendes defendeu ainda a colocação de freios e “limites” na atuação da força-tarefa. Na leitura do magistrado, o vazamento envolvendo Toffoli seria uma represália dos procuradores, que teriam sido contrariados pelo ministro, que mandou libertar o ex-ministro Paulo Bernardo, preso em julho na Operação Custo Brasil, um desdobramento da Operação Lava Jato. “Esse habeas corpus no caso do Paulo Bernardo animou os procuradores a colocar artigo no jornal e coisas do tipo”, disse Mendes ao jornal Estado de São Paulo. “E eles estão com o sentimento de onipotentes, decidiram fazer um acerto de contas”, afirmou o ministro, emendando que “tem que se colocar um limite nisso”. Seguiu nesta terça-feira e criticou as propostas de combate a corrupção defendidas por Moro e pela Lava Jato e em tramitação no Congresso: "Veja as dez propostas que apresentaram. Uma delas diz que prova ilícita feita de boa fé deve ser validada. Quem faz uma proposta dessa não conhece nada de sistema, é um cretino absoluto. Cretino absoluto. Imagina que amanhã eu posso justificar a tortura porque eu fiz de boa fé?"
Momentos depois, Janot respondeu a Mendes, um controverso integrante do STF: "O Brasil vive hoje um jogo de dois lados e (...) estamos desagradando a ambos os lados. Na minha visão, é um sinal positivo", disse. O procurador-geral disse ainda que o Ministério Público não sofrerá pressões de "Poder da República" e defendeu atribuições constitucionais, como a independência de atuação de promotores e procuradores, "que eu espero que não seja retirado numa eventual reforma futura".
À espera de Odebrecht
Não é a primeira vez que vazamentos envolvendo o Supremo colocam Janot na berlinda. Nas outras oportunidades, no entanto, ele jamais afirmou que o fato vazado não existia. Em junho, o procurador-geral já havia irritado integrantes da Corte que, nos bastidores, atribuíam a ele o vazamento dos pedido de prisão contra os peemedebistas Renan Calheiros, Romero Jucá e Eduardo Cunha - os pedidos seriam negados dias depois. Rodrigo Janot afirmou, então, que o vazamento não "havia sido da PGR”, e disse que mobilizaria “todos os esforços” que estiverem ao seu alcance para “descobrir e punir quem cometeu esse crime”. “A quem esse vazamento beneficiou? Ao Ministério Público não foi", concluiu. Meses depois o caso continua sem solução. Neste terça, Mendes voltou ao tema e provocou: "E as investigações do vazamento daquelas prisões preventivas, onde estão? Já houve conclusão? O resumo da ópera é: você não combate crime cometendo crime. Ninguém pode se achar o ó do borogodó. Cada um vai ter seu tamanho no final da história. Um pouco mais de modéstia, calcem as sandálias da humildade."
A delação de Pinheiro, condenado a dezesseis anos e quatro meses de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa no escândalo do investigado pela Lava Jato, era vista como uma das mais abrangentes do caso, ao lado da de Marcelo Odebrecht – ainda em negociação. O empreiteiro da OAS tinha relações políticas plurais: da reforma ao sítio do ex-presidente Lula a doações para o presidente interino Michel Temer e pagamentos de propina ao tucano Aécio Neves. Todos os citados negam irregularidades.
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