Eduardo Paes: “A forma como a ajuda para o Rio foi pedida foi muito ruim”
Prefeito se queixa da repercussão do decreto de calamidade do Estado, mas celebra os bilhões enviados


Toca o telefone na recepção do gabinete do prefeito do Rio, Eduardo Paes. Uma agente da guarda municipal responde educadamente.
Do outro lado da linha há um homem maldizendo a crise econômica e reclamando que os bombeiros – como o resto de servidores públicos ainda com o salário de maio atrasado – estão ignorando seu pedido de socorro.
Esse tipo de ligação era mais comum no passado, quando os cariocas tinham uma concepção mais difusa das competências estaduais e municipais e Paes e o ex-governador Sergio Cabral faziam alarde da sua sintonia. Hoje ilustra uma das mais recentes preocupações do prefeito: separar sua gestão da crítica situação do Estado, governado pelos seus colegas do PMDB.
Na semana passada, dias depois de o governador em exercício, Francisco Dornelles, decretar o estado de calamidade pública por causa da crise financeira e pedir socorro ao Governo federal para poder assumir seus compromissos com a Olímpiada, Paes convocou uma coletiva de imprensa. O prefeito, que acabou de parar de fumar, estava na defensiva e chateado com a confusão, que ele atribui ao noticiário internacional, criada entre a cidade e o Estado do Rio. Naquele dia, defendeu as finanças saudáveis do município, responsável pela execução de 93% das arenas olímpicas, e descartou, enérgico, a hipótese de que os Jogos possam ser responsáveis pela crise. “Longe disso. Se alguém devia ter uma situação ruim [por ter investido na Olímpiada], era a Prefeitura do Rio. Nós que fizemos quase tudo e não quebramos”, explica Paes, enquanto devora um brownie com creme de leite.
O decreto de calamidade pública, manobra legal escolhida pelo governador para viabilizar a injeção de 2,9 bilhões a fundo perdido nas contas estaduais, pegou o prefeito de surpresa. Ele apoiou o pedido de ajuda, mas qualifica de “muito ruim” quando questionado sobre a publicação do decreto numa sexta à noite, sem explicações e sem coletiva de imprensa. “Poderia ter sido feito de uma forma suave. A gente precisava de ajuda para o Governo do Estado, mas eu acho que a forma foi muito ruim. Mas também é verdade que a situação do Estado do Rio é ruim.”
O buraco nas contas do Estado do Rio, governado pelo PMDB desde 2003, evidenciou-se no final do ano passado com o colapso dos hospitais estaduais, onde faltavam até gazes para fazer atendimentos básicos – a própria Prefeitura resolveu assumir a gestão de dois deles. O preço do petróleo tinha caído cerca de um 50% em menos de um ano, uma catástrofe para um Estado que sustentava cerca de 15% das suas receitas nos royalties. O próprio Dornelles reconheceu que “não se pensou que a cadeia de petróleo fosse despencar”, enquanto aumentavam os gastos fixos em pessoal e nas aposentadorias. Em mais uma tentativa de saber o que o prefeito faria para recuperar as finanças do Estado do Rio, Paes, que se revela candidato a governador em 2018, pega a tangente: “Gente, não tem receita de nada para 2018. Eu só tenho receita para 31 de dezembro de 2016. Só penso na Prefeitura do Rio de Janeiro”.
A situação do Rio já foi usada como paralelo para questionar a capacidade do Governo interino, também do PMDB, de superar uma crise nacional, quando seus correligionários navegam em uma situação insustentável no Rio. O The New York Times, em uma matéria de maio, dizia assim: “Os líderes do Rio haviam prometido que as Olimpíadas destacariam os trunfos do Brasil. Mas, em troca, enquanto Michel Temer tenta dar um novo ar à economia brasileira, Rio resulta um exemplo do que um governo dirigido pelo PMDB poderia significar para o resto do país”. Paes, o qual poupa criticas à gestão do Estado, discorda. “Foi uma generalização, uma agressão desnecessária. O PMDB governa a cidade, e a cidade está muito bem administrada, modéstia aparte. É mesma coisa que ter um prefeito ou um governador democrata nos Estados Unidos indo mal e dizer que a Hillary Clinton não pode ser presidenta e que vamos votar todos no [Donald] Trump. Acho que é uma visão preconceituosa e uma certa arrogância ianque em relação ao Brasil”, diz.
A pouco mais de um mês da Olímpiada, Paes, recém operado de um cálculo renal, não lida com boas notícias. A queda da ciclovia que causou duas mortes em abril abalou sua gestão, e o evento tem atraído o foco à ameaça do vírus Zika ante a iminente chegada de centenas de milhares de turistas, à crise de segurança, aos escândalos de corrupção que afetam também o seu partido e à crise política. A última das notícias que pouco ajudam a promover a imagem da cidade foi o corpo esquartejado que apareceu nesta terça-feira próximo da arena onde será disputado o vôlei, na praia de Copacabana. O próprio presidente do Comitê Olímpico do Brasil, Carlos Arthur Nuzman, reconheceu em entrevista ao UOL, que nunca uma Olimpíada sofreu tantas dificuldades como a do Rio. E disse mais: “Ninguém imaginava [a situação atual]. Ninguém. Senão não dariam os Jogos para Rio”. Paes se defende: "O Brasil é um país com problemas, o Rio tem problemas, mas o justo é comparar o Rio com o Rio. Ver o que a gente avançou".