Angelina e Brad: assim trabalha o casal indestrutível
Inconformista em seu papel de superestrela, ativista e mãe, Angelina se reinventa
Fabuloso, insólito e bonito, como o de uma estátua antiga de uma divindade. Assim é o rosto de Angelina Jolie Pitt (Los Angeles, EUA, 1975). Costumamos vê-lo com tanta frequência que nos esquecemos de como é extraordinário. A testa larga e proeminente, os olhos suaves como uma piscina, e uma leve fenda que corta o lábio inferior pela metade. Traços que são menos voluptuosos fora das telas.
Ela entra na suíte de um luxuoso hotel de Londres, vestida com jeans e camiseta pretos e nada de maquiagem. Surge sozinha, mas sua presença enche o recinto. É uma superestrela. Jolie está na capital britânica, para onde se mudou com a família, para divulgar À Beira Mar (lançado no Brasil em dezembro de 2015). É seu terceiro filme como diretora, e a primeira em que, além de dirigir, também serve como protagonista, produtora e roteirista. Brad Pitt, seu marido, é coprotagonista e coprodutor. Trata-se de um projeto muito pessoal. O mais íntimo até hoje. Ela escreveu o roteiro há vários anos, mas sempre encontrava motivos para adiar a filmagem. “Brad e eu nos referíamos ao roteiro como ‘a ideia louca’”, conta, sorridente. “Até que um dia decidimos não viver com esse tipo de preocupação. Quisemos ser artistas e livres. O fundamental é que, independentemente do resultado, fizemos algo juntos, confiando um no outro”.
Os atores estão juntos há 12 anos, mas este é apenas o segundo filme em que contracenam. O primeiro foi Sr. e Sra. Smith, quando se conheceram e se apaixonaram. Curiosamente, nas duas produções eles interpretam um casal, ainda que com premissas praticamente opostas. Sr. e Sra. Smith é um filme de ação sobre matadores de aluguel, e À Beira Mar presta homenagem ao cinema europeu dos anos 70. Tem aspirações artísticas, poucos diálogos e menos explicações. “Algumas pessoas vão amar o filme, outras vão detestá-lo. Mas é assim que a arte tem que ser”, opina sua autora, enquanto cobre os ombros com um xale de linho.
A fita conta a história de um escritor com bloqueio criativo e uma ex-bailarina, que viajam pelo sul da França em plena crise matrimonial. Enquanto ele troca a escrita pela bebida, ela se fecha, deprimida, no quarto do hotel. Ali descobre um buraco na parede que dá para o quarto contíguo, onde está hospedado um casal recém-casado. Essa descoberta mexe em algo nos protagonistas. Para Jolie, foi uma oportunidade de interpretar um papel que nunca lhe é oferecido, apesar de admitir que teve dificuldade em dirigir a si mesma. “Não gosto de me observar na câmera. Há alguns filmes meus que eu nem vi. Mas segui em frente porque não existem muitos papéis com uma natureza tão incomum”. Os amigos de Jolie e Pitt se preocuparam quando souberam do que se tratava o projeto. Eles advertiram o casal de que talvez não fosse uma boa ideia em algo tão intenso e que as tensões seriam levadas para casa. Mas Jolie garante que foi cautelosa com os riscos. “Escolhi dois personagens parecidos com meu marido e comigo, com quem pude me identificar, mas com problemas diferentes dos nossos”, responde.
Durante as filmagens, descobriram novas maneiras de se comunicarem como atores profissionais e em sua relação como ator e diretora. “É muito estranho dirigir o seu marido e mandá-lo discutir comigo. Ele acabou estapeando-se a si mesmo. Tire suas próprias conclusões!”, exclama Jolie.
O relacionamento dos dois começou quando o ator ainda estava casado com Jennifer Aniston, que, naquela época, era considerada a “namoradinha da América”. Poucos ficaram do lado de Jolie. Ela tinha uma imagem distante e intensa, e era dada a excentricidades, como carregar o sangue de seu segundo marido, Billy Bob Thornton, em um pingente em volta do pescoço. Poucos viam um futuro para “Brangelina”, mas o tempo acabou lhes dando razão.
Criam seis filhos – três adotados e três biológicos – com idades entre 7 e 14 anos, e têm vários interesses em comum. Apesar de a imprensa sensacionalista se empenhar em informar repetidamente que o casamento está em crise, a relação se mostra cada vez mais sólida. Aliás, pouco antes de começarem a rodar o filme, em agosto de 2014, Jolie e Pitt se casaram em uma cerimônia íntima na casa que eles têm na França, o Chateau Miraval. A atriz usou um vestido do Atelier Versace com um véu que trazia desenhos e mensagens dos filhos, Maddox, Pax, Zahara, Shiloh e os gêmeos Vivienne e Knox.
À Beira Mar é o primeiro trabalho em que ela aparece nos créditos como Angelina Jolie Pitt. “É complicado fazer uma autoanálise, mas chegamos à conclusão de que queríamos compartilhar um amor mais profundo e nos conhecermos melhor”. E responde à pergunta sobre por quê decidiu subir ao altar. “Nós perguntamos o que poderíamos fazer para irmos mais longe, e tomamos essa decisão. Estamos muito felizes”.
A filmagem foi a lua-de-mel. A família inteira viajou para Gozo, uma ilha da costa de Malta. Ali, montaram uma escola para que as crianças estudassem enquanto eles trabalhavam. “A gente os via constantemente. O governo maltês foi maravilhoso e nos permitiu usar uma enseada com exclusividade”, comenta a atriz com a espontaneidade de quem é recebida como rainha onde quer que vá.
Apesar de o filme ter sido crucial para aprofundar a relação do casal, o projeto originalmente surgiu para ajudar Jolie a superar “a perda e a dor” experimentadas após a morte de sua mãe, Marcheline Bertrand. A atriz e produtora morreu aos 56 anos por causa de um tumor de ovário. Oito anos depois, a atriz ainda derrama lágrimas furtivas quando fala da mãe. A crise provocada por sua perda a levou a se submeter a uma mastectomia dupla e, depois, à extirpação dos ovários. Adotou essas medidas preventivas quando soube que era portadora da mutação do gene BRC-1, que lhe dava grandes possibilidades de vir a sofrer de câncer. “Dessa maneira sei que meus filhos nunca dirão que sua mãe morreu de câncer de ovário”, disse ela, na época, ao New York Times. Sua decisão provocou um aumento nos exames genéticos para detectar essa mutação do gene e também de cirurgias preventivas – algo que nas publicações médicas já é conhecido como “o efeito Angelina”.
Em um momento da conversa, Jolie menciona que hoje não teria incluído algumas das cenas no filme, pois a fizeram se sentir muito exposta diante da câmera. Quando lhe perguntamos o motivo, a questão implica em um certo nervosismo. Mas Angelina responde abertamente e sem hesitar, o que ajuda a desfazer qualquer tensão: “O personagem que eu imaginei antes de me operar se despe física e emocionalmente”, explica. “É alguém cujo corpo a decepcionou. Eu tinha escrito o papel pensando em tudo o que minha mãe passou, e por isso foi muito doloroso para mim. Quando estava editando o filme, recebi um telefonema dizendo que havia uma possibilidade de eu mesma ter câncer. Então, senti de novo essa dor. Tudo acabou sendo muito catártico, mas ao mesmo tempo me descobri bastante”.
Passado um tempo, ela reconhece que estes foram anos muito intensos emocionalmente, mas garante que também há espaço para o humor na casa da família Jolie Pitt. Angelina, que emprestou sua voz a um dos personagens do novo filme da série Kung Fu Panda, levou seus filhos com ela para que eles fizessem participações especiais. “Eles adoraram porque estavam no trabalho com a mãe. Mas nenhum deles quer ser ator. É um alívio”, confessa. Apesar disso, os interesses das crianças não parecem estar muito distantes do cinema. Maddox, o mais velho, trabalhou como assistente de direção em À Beira Mar e agora quer coproduzir o próximo filme da mãe. Tem 14 anos. “Trata-se de uma história real, de uma mulher que viveu o momento em que os norte-americanos ocuparam o Camboja. A guerra é descrita pelo olhar de um menino. Os padres biológicos de Maddox tiveram uma experiência semelhante. O processo nos ajudará a conhecer juntos coisas sobre seu país”.
Angelina Jolie é um caso excepcional em Hollywood. Uma estrela que se sente igualmente à vontade posando no tapete vermelho, discursando em um parlamento ou visitando um campo de refugiados. Como embaixadora da boa vontade da ACNUR, e atualmente como enviada especial para os refugiados, ela visitou zonas de conflito, elaborou relatórios, fez discursos diante do Conselho de Segurança da ONU sobre a situação na Síria e (segundo a organização) fez doações no valor de 5 milhões de euros. Tanto o ministro do Exterior britânico como o secretário de Estado americano, John Kerry, elogiam seus esforços. Em 2014, a rainha Elizabeth II a condecorou como dama honorífica por seu trabalho contra a violência sexual. Além de tudo isso, já ganhou um Oscar e é respeitada como diretora. Apesar de a crítica não ter sido unânime em relação a À Beira Mar, quase todos concordam que se trata de um projeto arriscado e pouco previsível. “Todos os filmes que eu dirigi (Na Terra de Amor e Ódio, Invencível e À Beira Mar) são muito diferentes entre si. Quero experimentar diversas formas de fazer cinema porque ainda tenho muito o que aprender como diretora. Na vida é preciso fazer coisas que intimidem. O medo pode trazer muitas coisas boas”.
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