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Eduardo Cunha e Renan Calheiros definem seu futuro político sob a mira do Supremo

Deputado ainda pode ser afastado, apesar de ganhar tempo no Conselho de Ética Presidente do Senado vê ressurgir escândalo de pensão de amante paga por empreiteira

Cunha e Calheiros no Congresso, no dia 2.
Cunha e Calheiros no Congresso, no dia 2.Lucio B. Junior

O comando do Congresso Nacional vive um momento ímpar. Ainda que em estágios diferentes, os dois presidentes das principais Casas Legislativas do Brasil, o terceiro e quarto da linha sucessória da Presidência da República, encontram-se cada vez mais encurralados, e não só pela Lava Jato.

O parlamentar que preside a Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), luta em duas frentes, uma no Supremo Tribunal Federal, onde é alvo de ao menos três inquéritos, e outra no Conselho de Ética da própria Câmara, onde responde a uma representação por ter mentido aos seus pares e que pode resultar em sua cassação. Neste segundo caso, ele ganhou, após nova manobra, um tempo extra para se defender.

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Já o congressista que chefia o Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), pode se tornar réu nos próximos dias no caso em que ele é acusado de ter despesas pagas pela empreiteira Mendes Júnior em troca da apresentação de emendas que beneficiariam a empresa. O ministro do STF, Edson Fachin, liberou para que o plenário decida se Renan deve ou não se tornar réu pelos crimes de peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso. O Renangate, como escândalo ficou conhecido em 2007 quando veio à tona, envolvia a então amante de Calheiros, a jornalista Monica Veloso, com quem ele tem uma filha. O aluguel do apartamento dela em Brasília e a pensão alimentícia da criança (totalizando 16.400 reais) eram pagos pela empreiteira, segundo a denúncia do Ministério Público apresentada em 2013. O senador nega as irregularidades.

Assim, mal os trabalhos do Legislativo retornaram em 2016, Cunha e Calheiros voltaram a dividir a atenção da mídia e da classe política brasileira. O deputado conseguiu nesta semana, pela oitava vez, postergar o andamento do processo que corre contra si no Conselho de Ética. Um aliado dele, o primeiro vice-presidente da Casa, Waldir Maranhão (PP-MA), outro parlamentar investigado pela Lava Jato, acatou um pedido de anulação da sessão que votou pela abertura do processo contra o peemedebista.

Dessa forma, dificilmente o caso, que tem tudo para resultar na cassação do mandato parlamentar de Cunha pelos conselheiros, será encerrado antes de junho no colegiado. A previsão era de que a conclusão ocorresse em abril. “Eduardo Cunha é um dos deputados que mais conhece o regimento interno e o usa de todas as maneiras para prorrogar a análise de seu processo”, afirmou o relator do caso, o deputado Marcos Rogério (PDT-RO). Rogério diz que tentará ser célere na apresentação de seu relatório complementar, mas já está contando que a tropa de choque de Cunha tentará encontrar novas brechas regimentais (legais ou não) para adiar ainda mais o processo.

“Ainda que eu discorde do mérito, tenho que admitir que quase todos os recursos apresentados pelos aliados do deputado Cunha tinham alguma fundamentação legal, menos este último. A decisão do deputado Maranhão foi ilegal e o Conselho deverá recorrer ao STF para tentar mudá-la”, disse Marcos Rogério.

O objetivo do deputado peemedebista e de seus aliados é adiar as discussões sobre sua suposta quebra de decoro parlamentar e misturar o assunto com a análise do pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff (PT) pela Câmara dos Deputados. “Se conseguirmos focar na presidenta, todo mundo se esquece do Eduardo”, afirmou um de seus aliados sob a condição de não ter seu nome divulgado. “Só queremos que o regimento seja seguido”, disse outro membro da tropa de choque de Cunha, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS).

O próprio Cunha, contudo, diz que as prorrogações só o prejudicam e acusa o presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PSD-BA), de agir irregularmente para “continuar na mídia”. “O presidente do Conselho de Ética parece agir ao meu favor e acaba me prejudicando. Basta ele agir seguindo o regimento. Ele me prejudica na medida em que a mídia coloca essa prorrogação como uma manobra minha”.

Cunha e o Supremo

Se por um lado Cunha ainda demonstra força e ganha tempo entre os seus colegas, por outro, até o fim do mês ele pode ser afastado de seu cargo, ainda que preventivamente. Pouco antes do recesso parlamentar do ano passado, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou uma denúncia no STF de que Cunha estaria usando de seu cargo para “delinquir” e obstruir o trabalho dos investigadores da Lava Jato. Na ação, Janot pede que Cunha tenha seu mandato suspenso. A expectativa no Judiciário é que esse pedido seja analisado pelo plenário do Supremo até o fim de fevereiro.

As principais suspeitas contra o deputado são de que ele recebia propina dentro do esquema que desviou bilhões de reais da Petrobras e que parte desses recursos circulavam por ao menos contas suas em bancos do exterior que jamais foram declaradas à Receita Federal. Em sua defesa, Cunha afirma que não era obrigado a declarar esses valores e nega que faça parte do grupo político que agia na empresa petroleira.

Déjà vu no Senado

Ao ver o processo que envolve a jornalista Monica Veloso reavivado, com a possibilidade de ele ser aceito pelo STF, Renan Calheiros teme o retorno de alguns de seus fantasmas. Há quase nove anos, ele também era o presidente do Senado e teve de fazer um acordo, deixando o cargo máximo na Câmara Alta, para se safar da cassação. Esse foi seu maior revés político em 38 anos de vida pública. Agora, poderá responder oficialmente por peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso.

No Senado, nesta quarta-feira, um grupo de parlamentares reviveu aquele período. “Se ele [Renan] virar réu, não duvido nada que algum colega justiceiro faça uma nova representação contra ele no Conselho de Ética. Aí o caos da Câmara vai chegar aqui. Será que é isso que precisamos?”, perguntou um dos parlamentares ouvidos pela reportagem.

Uma breve análise feita por outro senador mostra, no entanto, que as cabeças brancas do Senado, o apelido dado aos senadores, mais velhos e mais moderados que os deputados, dificilmente serão envolvidas por esse furacão. “Não vamos cair nessa. Nem o Governo quer que a gente caia. Somos a principal fonte de apoio da presidente. Se o Senado for envolvido na crise, corremos sério risco de aumentar a instabilidade política”, disse.

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