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Recessão eleva torcida por saída de Dilma, mas está longe de ser consenso

Impeachment seria fator novo para começar etapa de retomada, segundo alguns agentes Nem todos veem diferença entre gestão Dilma e a do seu vice, Michel Temer

A presidenta Dilma Rousseff chega ao final de 2015 dentro de um rocambolesco quadro recessivo que já se estende para 2016, e pode gerar dois anos seguidos de recessão, ou oito trimestres de PIB negativo. Diante da imagem do precipício aumenta a torcida pela saída da presidenta como um caminho para que o país ganhe fôlego. “O impeachment tem o potencial de melhorar muito as coisas, e os mercados reagirão muito bem. Porém, se não passar, é ficarmos empacados com Dilma por mais três anos. Será uma catástrofe”, avalia Gustavo Franco, ex-diretor do Banco Central de Fernando Henrique Cardoso.

A presidenta Dilma e o vice-presidente, Michel Temer, nesta quarta, 16
A presidenta Dilma e o vice-presidente, Michel Temer, nesta quarta, 16U. Marcelino/Reuters
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Na semana passada, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) também tornou público seu apoio ao impeachment, depois de uma pesquisa com mais de 1.000 empresários e executivos associados à entidade. Mais de 90% apoiaram a ideia da FIESP anunciar seu posicionamento contrário à permanência de Dilma na presidência. A falta de credibilidade e confiança do Governo, segundo Paulo Skaf, presidente da federação, está inibindo investimentos. “O país está à deriva, e não há atitudes para solucionar os problemas”, disse Skaf, que calcula que a indústria paulista vai encolher 20% até o final do ano que vem.

No dia em que anunciaria sua demissão do Governo Dilma, no entanto, o agora ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou que um impeachment pode retardar a recuperação econômica, segundo descreveu o jornal Folha de S.Paulo. Levy lembrou que a FIESP também apoiou medidas durante o primeiro Governo Dilma, que agora estão cobrando seu preço. De fato, o setor industrial foi um dos que mais se beneficiou das isenções de impostos promovidas desde 2009, primeiro com Lula e estendidas durante o Governo Dilma.

Se a necessidade de acertar um norte para sair buraco negro econômico é consenso entre os entrevistados ouvidos pelo EL PAÍS, a saída da presidenta como alternativa não é unânime.

“O que está em jogo não é se é importante ter ou não impeachment, mas aprovar medidas de ajuste fiscal para que a economia seja retomada”, diz Vagner Alves, economista da Franklin Templeton. Alves não vê grandes diferenças numa gestão de Dilma ou do vice-presidente, Michel Temer, seu sucessor natural num eventual impedimento. “O importante é tirar as dúvidas sobre o assunto e depois recompor a base para aprovar o mínimo necessário no Congresso.”

Em relatório a seus clientes, a consultoria Eurasia Group destacou na semana que passou que há um otimismo exagerado no mercado com um eventual Governo Temer. Mas a ação da Polícia Federal, de busca e apreensão de documentos em endereços de aliados de Eduardo Cunha, Renan Calheiros e do próprio Michel Temer, “é uma indicação que a Lava Jato vai complicar os próximos meses da presidência, seja Rousseff ou Temer” no Palácio do Planalto.

O economista Delfim Netto também se diz contra o impeachment, muito embora julgue o projeto preparado pelo PMDB para um eventual governo de Temer melhor que o atual modelo adotado pelo Governo Dilma. Para ele, no entanto, “um mau Governo não é razão para ser substituído antes da eleição”, sob risco de fragilizar as instituições no longo prazo.

A saída do labirinto político se faz urgente para que o Brasil fuja de um quadro que só foi visto no Brasil no biênio 1929/1930, quando houve a quebra da bolsa americana com a crise do café. Por ora, a perda está tendo uma evolução semelhante ao do período Collor, entre 1990 e 1993, ou o triênio de 1981 a 1983, mas que foram entremeados por algumas altas, explica Armando Castellar, coordenador de Economia Aplicada do IBRE/FGV e professor do Instituto de Economia da UFRJ. “Realmente, com dois anos seguidos de queda você teria de volta uma crise nos moldes dos anos 1929/ 1930”, observa Castellar.

Embora seja difícil comparar uma época em que o Brasil era uma sociedade rural com os dias atuais, a paralisia do país já não deixa dúvidas de que é preciso estancar a crise política para tirar a economia da UTI. “Esta é uma crise mais fácil de manejar no sentido de que você depende de uma resposta política. Quando houver uma sinalização clara, uma dinâmica mais favorável, a confiança vai voltar e as empresas vão voltar a investir, os consumidores a consumir, bancos dando crédito”, completa o professor da UFRJ. O Governo coloca suas fichas em Nelson Barbosa, que à frente da Fazenda faria um ajuste fiscal como pede o mercado, mas não tão radical, o que atenderia a um desejo dos movimentos de esquerda que apoiam a presidenta. A eficácia desta versão light de Levy será testada na volta do recesso do Congresso, em fevereiro.

Por ora, o que impera é o medo que anula a vontade de ousar, observa o empresário Alberto Hiar, dono da marca de roupas Cavalera. “Você tem medo de fazer novos projetos, e não tem crédito. O banco não libera dinheiro porque tem receio de não ser pago. A taxa de juro está alta e você não quer pegar pois teme que não vai conseguir. Sem vendas, você vai reduzindo custos”, comenta Hiar, que está devolvendo três das quase 40 lojas da rede, e demitiu cerca de 15% do seu pessoal. O empresário não é um entusiasta do impeachment do modo que está sendo conduzido atualmente, com uso de prerrogativas que abriram margem para a anulação da sessão conduzida na Câmara pelo presidente Eduardo Cunha. Mas pelos trâmites normais, “se comprovado que ela desrespeitou a lei de responsabilidade fiscal, sou a favor”, afirma. Para ele, é necessário que algo aconteça para tirar o país da paralisia.

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