Sob pressão: quais são as acusações e a defesa da presidenta Dilma
Entenda quais são os argumentos sob análise para manter ou tirar Dilma do poder
As "pedaladas fiscais", manobras contábeis para mascarar rombos maiores no orçamento, são a base do pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Entenda quais são os argumentos da oposição e da defesa no âmbito das pedaladas.
De acordo com o TCU, o Governo deixou de pagar cerca de 40 bilhões em taxas aos bancos públicos, em 2014, por serviços prestados por eles ao Governo. Foram prejudicados, nesse processo, a Caixa, responsável pelo pagamento de programas sociais, o BB e o BNDES, responsáveis pela concessão de créditos subsidiados ao setor produtivo.
Ao deixar de pagar para os bancos um compromisso firmado, o Governo contraiu uma dívida. É como se os bancos tivessem emprestado dinheiro para a União, o que é proibido pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
O próprio TCU reconhece, em seu parecer, que a prática é comum e já foi vista antes em outras gestões. O que teria chamado a atenção do órgão, desta vez, foi o tamanho das pedaladas, montante sem precedentes na história e que já tem prejudicado toda a gestão orçamentária do Governo.
O órgão investiga, por meio do Ministério Público de Contas, se as pedaladas ocorreram também em 2015.
O Governo diz que nenhuma dessas ações ferem a lei de responsabilidade fiscal. No caso dos bancos, o atraso no pagamento de taxas é previsto em contrato assinado com as instituições. Além disso, não trouxeram prejuízo aos cofres públicos. Por quê? Porque o governo pode ficar, de fato, alguns meses sem pagar, mas também faz antecipação de pagamento outras vezes. Por exemplo, ele pode ter transferido o dinheiro para o banco em janeiro, referente a gastos até junho. Depois de junho, deixou de pagar, retomando os desembolsos somente em setembro.
No final do ano, quando as contas são feitas para saber quem deve o que para quem, o saldo sai sempre positivo para o Governo. Em 2014, por exemplo, a Advocacia Geral da União informou que o Governo ganhou 141 milhões de reais em juros pela antecipação do pagamento de taxas para a Caixa, ainda que a União tenha operado no negativo com o banco em boa parte do tempo.
"O que caracteriza uma operação de crédito não é o volume. Não faz diferença se é um real ou um milhão de reais. O TCU nunca viu problemas no pagamento de taxas antes. O argumento de que agora não pode porque o volume é maior não faz sentido", explica o ministro da AGU, Luís Inácio Adams.
O TCU questiona a "criação" de 15 bilhões de reais por meio de "créditos suplementares", via decreto presidencial, em dezembro de 2014. O Governo teria emitido esses decretos para pagar compromissos urgentes, mesmo quando já não tinha mais dinheiro sobrando em caixa.
A prática de criação de verba suplementar também é comum. Entretanto, um artigo da Lei de Responsabilidade Fiscal determina que, ao perceber que não será possível atingir a meta fiscal, estabelecida pela Lei de Diretrizes Orçamentárias, o Governo deve contingenciar verba.
O que aconteceu em 2014? Ao perceber que não seria mais possível alcançar a meta fiscal estabelecida, o Governo enviou, em novembro, um projeto de lei para alterar a meta. Enquanto ela não era aprovada no Congresso, durante o mês de dezembro o Governo emitiu decretos de créditos suplementares. Na análise do TCU, tal medida fere a Lei de Responsabilidade Fiscal, que impõe contingenciamento nessa situação.
O ministro do TCU defende que, em 2015, isso também aconteceu. Ao todo, 2,5 bilhões de reais teriam sido "criados" por meio de seis decretos irregulares este ano.
O ministro da AGU explica que o o Governo foi autorizado pela Lei Orçamentária Anual a criar verba suplementar. A Lei foi aprovada em Congresso.
"O TCU argumenta que o Governo deveria ter feito contingenciamento de recursos. Mas a meta fiscal não é impositiva, é só um objetivo. O Governo não pode deixar de pagar programas essenciais porque a meta não será atingida", defende.
Para Adams, "os decretos de verba suplementar não podem ser avaliados fora de um contexto. As metas de superávit, no fim, foram revistas. Isso derruba o argumento de que não havia dinheiro em caixa para baixar os decretos", diz .
Segundo o ministro, mesmo interpretando que a prática não é um problema, em 2015 o Governo mudou um pouco a postura e acatou a "nova interpretação da lei pelo TCU".
Ao perceber que a meta não seria atingida e, enquanto a nova meta não era aprovada no Congresso, o Governo mandou contingenciar 11,2 bilhões de reais.
Ao longo do ano, a União chegou a contingenciar 79,5 bilhões de reais, segundo informações do Ministério do Planejamento.
Quem está certo?
Para o cientista político da UFRJ, Charles Pessanha, a resposta mais coerente para essa pergunta é "ninguém". Nem o Governo, cuja "gestão errática" do orçamento tem deixado o país em um constante "cheque especial", nem a acusação, que está "agindo de maneira política demais ao recomendar a rejeição das contas por problemas que nunca foram reclamados no passado". "Ninguém está agindo apenas de boa fé", acredita.
Segundo a AGU, o TCU está reinterpretando a lei para desenquadrar as contas do Governo. O TCU desmente e contra-argumenta que o Governo está agindo de forma irresponsável, inflando o orçamento com manobras que só prejudicam a gestão das contas públicas no longo prazo. Para a AGU, são fatores políticos, e não técnicos, que estão pautando os pedidos de impeachment da presidenta.
Independentemente dos processos que correm no Congresso, o TCU está cobrando da União o ressarcimento das pedaladas de 2014 aos bancos. Como esse valor será quitado, ainda está em negociação. De qualquer forma, a nova meta fiscal de 2015, aprovada esta semana no Congresso, prevê um rombo de até 119 bilhões nos cofres públicos este ano - desse total, cerca de 50 bilhões seriam destinados ao pagamento das pedaladas de 2014.
As pedaladas podem culminar no impeachment?
Pessanha pondera que infringir a LRF não resulta automaticamente em impeachment. "A Lei Orgânica do TCU determina que seja aplicada uma multa aos infratores equivalente ao dano causado aos cofres públicos", explica. No caso da rejeição das contas de um ex-presidente, a punição pode ser a inelegibilidade por oito anos em cargo publico.
O que pode gerar o impedimento da Dilma é o entendimento, pelo Congresso, de que a presidenta incorreu de crime de responsabilidade contra a lei orçamentária, algo que está descrito no capítulo 6 da Lei do Impeachment. Definir quem está certo, e quem está errado, é uma questão que compete, agora, somente ao Congresso.
Em pronunciamento nesta manhã, após ter se reunido com cerca de 30 juristas e um grupo de ministros no Planalto, a presidenta Dilma destacou que o processo de análise de suas contas, tanto de 2014, quanto de 2015, ainda estão em curso. A primeira, é analisada na Comissão Mista do Orçamento (CMO). A segunda, está em investigação no Ministério Público de Contas. O ministro Luís Inácio Adams, complementa que seria "um contrassenso as contas serem aprovadas nessas instâncias e rejeitadas pelo Congresso no processo de impeachment"
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