Eduardo Cunha sofre revés no STF em sua cruzada pelo impeachment
Supremo determina que que senadores e deputados terão de votar as contas de Dilma Decisão tira da Câmara comando de processo que abriria caminho para saída da petista
A manobra do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para acelerar a votação das contas do Governo Dilma na Câmara, foi frustrada nesta quinta-feira pelo Supremo Tribunal Federal, em uma decisão que garante um pequeno alento à presidenta. O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, definiu que as contas presidenciais terão de ser analisadas em sessões do Congresso Nacional — Câmara e Senado— e não somente pelos deputados, como era o desejo do peemedebista. E quem deve colocar essas votações em pauta é o presidente do Congresso, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), o velho-novo aliado de Rousseff.
Cunha já havia cumprido parte do plano para abrir caminho ao pedido de impeachment de Dilma. A principal aposta da oposição passa pela análise das contas do Governo petista em 2014, a serem possivelmente rejeitadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) por causa das chamadas pedaladas fiscais. Para votar as contas de Rousseff, porém, era necessário seguir o rito da Casa, de aprovar antes as contas dos Governos dos ex-presidentes Itamar Franco (PMDB), Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que estavam esquecidas pelos parlamentares há anos. Entre os dias 6 e 7 os deputados aprovaram, em votação simbólica e a toque de caixa, todas as contas passadas. Esperavam agora só a decisão do TCU sobre Dilma para embasar um pedido de impeachment, que começa a tramitar pela Câmara.
Com a decisão do Supremo, Cunha se vê diante da primeira derrota concreta depois que anunciou o rompimento com o Planalto. Alguns analistas observam que o presidente da Câmara começou, efetivamente, a perder poder, sendo colocado para escanteio pelo próprio partido. Nesta semana, por exemplo, o senador Renan Calheiros e outros peemedebistas apresentaram uma série de propostas para ajudar o Governo a sair da crise política, a chamada 'Agenda Brasil'. Cunha não foi chamado para participar dos debates e classificou as sugestões como “espumas”.
Na prática, a sentença do STF é outra prova do fortalecimento de Renan. A decisão de Barroso atendeu a um pedido de uma senadora que é muito próxima do presidente do Senado, Rose de Freitas (PMDB-ES), a presidente da Comissão Mista de Orçamento. A parlamentar pediu ao STF que todos os julgamentos de contas de presidentes fossem suspensos porque nenhum deles havia sido feito em sessões conjuntas do Congresso. Barroso decidiu que apenas os próximos julgamentos deveriam ser feitos desta maneira. Ainda cabe recurso à decisão.
Cunha, o público e o privado
O martírio de Cunha, investigado no escândalo da Lava Jato, não acaba por aí. Nesta quinta-feira, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que comanda a investigação do núcleo político citado na operação, o acusou de usar uma estrutura pública para promover sua defesa pessoal no caso. Em parecer enviado ao Supremo, Janot diz que o deputado mistura o “público com o privado” em sua tentativa de anular as provas. Para entender o recado de Janot é preciso retomar um novelo que ganha cada dia mais tons rocambolescos.
O presidente da Câmara solicitou há três meses que a Advocacia Geral da União entrasse com recurso judicial – ou agravo regimental, na linguagem jurídica - no Supremo alegando que o Poder Legislativo e “seus membros em particular” usufruem da prerrogativa de imunidade parlamentar. O objetivo era anular eventuais provas encontradas na ação de busca e apreensão em seu gabinete no dia 6 de maio. O time comandado por Janot havia sido autorizado pelo Supremo a ir atrás de evidências de que o deputado teve participação na apresentação de dois requerimentos feitos pela Câmara em 2011, pedindo auditoria dos contratos entre as empresas Mitsui, Samsung e Petrobras.
Os pedidos da Casa, feitos naquele ano, seriam uma tentativa de paralisar os negócios dessas companhias, que estariam se negando a pagar propina a Cunha. O deputado sempre negou essa versão, alegando que a ex-deputada Solange Almeida, do PMDB do Rio, como ele, era a autora dos requerimentos. A equipe da Procuradoria Geral, porém, solicitou a ação no gabinete para colher provas de que o pedido teria sido elaborado num computador aberto com a senha de Cunha, como havia publicado a Folha.
Dois delatores da Lava Jato, Alberto Youseff e o lobista Julio Camargo, confirmaram a versão de que Cunha era o mentor desses requerimentos, usados para pressionar as fornecedoras da Petrobras a pagar milhões de dólares em propina.
Janot encaminhou nesta quinta os argumentos da Procuradoria ao Supremo para desmontar a ação de Cunha. “O único argumento do agravo que sugere evocação de prerrogativa institucional gira em torno da alegação de uma exótica imunidade de sede da Câmara dos Deputados, que, segundo Janot, age como se fosse “não apenas independente, mas verdadeiramente soberana”.
O texto do procurador faz menção ao lema que Eduardo Cunha tem tentado sustentar para o Legislativo durante o seu ‘reinado’: “Câmara independente, democracia forte”, costuma repetir o deputado, aproveitando a fragilidade do Governo Dilma para fortalecer o seu papel. Por ora, Cunha perde pontos nessa batalha.
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