“Ainda é cedo para dizer que Eduardo Cunha sairá debilitado”
Para o cientista político Paulo Kramer, Cunha usa a tática de "fugir para a frente"
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) pode até cair em decorrência das acusações de que recebeu 5 milhões de dólares em propina. Mas tudo indica que se cair, e ainda é cedo para afirmar que isso irá ocorrer, vai cair atirando, de acordo com o cientista político da Universidade de Brasília Paulo Kramer. Ao dizer, durante o discurso no qual anunciou seu rompimento com o Governo, que "o Planalto está cheio de aloprados", o presidente da Câmara dá a entender que tem "bala na agulha" para revidar os ataques.
Pergunta. O que está por trás da tática de Eduardo Cunha de anunciar o rompimento com o Governo no dia seguinte das denúncias?
Resposta. A tática dele está funcionando, pelo menos nos canais de notícia. Se você prestar atenção nas manchetes e nas legendas dos programas de TV, todas falam do rompimento, e não do pagamento de propina. Ele fez o que costuma se chamar no jargão político de fugir para a frente.
P. O recesso parlamentar é positivo para ele?
R. O que vai acontecer? É a pergunta que ele deve estar se fazendo. Ele vai passar a semana dando telefonemas e falando com aliados para saber o tamanho de sua base de apoio. Não haverá recesso para ele. E por outro lado, essa ida dos parlamentares às suas bases nestas semanas de folga será muito importante para ajudá-los a avaliar essa situação. Ver a quantas anda a popularidade da Dilma e ver também a repercussão destes últimos fatos políticos, como a acusação do Julio Camargo.
P. O que vai definir o tamanho do estrago em sua imagem?
R. Além da questão da perda de apoio político, o que vai definir o tamanho do estrago será a evolução da acusação feita pelo Julio Camargo na delação premiada para as evidências fortes do inquérito. Se houver essa evolução, e dependendo da força da evidência concreta, ele pode chegar ao final do recesso substancialmente debilitado. Mas é cedo para dizer.
P. Você vislumbra um cenário no qual o Cunha se afaste voluntariamente do cargo?
R. Ele se afastar voluntariamente seria tão ou mais difícil do que um afastamento voluntário da presidente Dilma. É mais fácil ela renunciar do que ele. Agora, faltando condições políticas e faltando apoio, uma parte substancial da oposição, que vê nele um instrumento para intimidar o Governo, pode debandar.
O Temer quer deixar claro que ele não é um conspirador
P. Quais as chances do resto do PMDB se juntar ao Cunha e romper com o Governo?
R. Quando falamos em atores políticos relevantes do PMDB não dá para pensar que agem em uníssono. Cada um tem seus interesses, cada um rema para um lado. Em casos raros eles remam juntos. A preocupação central do vice-presidente Michel Temer é, nesse momento, pelas atitudes que toma ou deixa de tomar, passar para a opinião pública a imagem de que ele não é um vice desleal. No passado o Itamar Franco foi acusado de ter sido um vice desleal, e isso é ruim para a imagem do político. O Temer quer deixar claro que ele não é um conspirador.
P. O que o uso do termo “aloprados” para se referir a integrantes do Governo quer dizer?
R. Quando ele falou dos aloprados foi um recado do tipo “eu também tenho munição contra vocês”. Ele está contra-atacando ao invés de ficar na defensiva. O termo aloprado tem uma carga política forte [que remete ao escândalo da compra de dossiês por políticos do PT para prejudicar rivais em 2006]. Quando ele usa esse termo se refere principalmente ao Aloizio Mercadante [o petista foi citado na delação premiada do empreiteiro Rodrigo Pessoa], que é um dos ministros mais importantes, embora seu espaço de articulação política tenha sido reduzida com a entrada do Temer na articulação política.
P. Os parlamentares petistas devem pedir a cabeça de Cunha na Câmara?
R. O Governo ainda não entrou em confronto aberto com o Cunha pedindo a saía dele. Isso porque a situação da Dilma é frágil, ela tem menos de um dígito de aprovação. Por isso eles no momento estão usando o Silvio Costa [deputado que pediu o afastamento do presidente da Câmara] no momento. É óbvio que a expectativa do Governo é de que o Cunha se enrede nessas acusações e perca peso político, mas eles sabem que o peemedebista pode, até acabar de se desidratar, criar, situações embaraçosas para o Planalto.
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