_
_
_
_
_

O cidadão se apropria de sua cidade

Especialistas debatem soluções no seminário Cidades Inteligentes, promovido pelo EL PAÍS

Felipe Betim
Ciclistas no Rio de Janeiro.
Ciclistas no Rio de Janeiro.Alexandre Macieira (Riotur)

Em Londres, mendigos guiam os turistas pelas ruas da cidade e lhes contam historias que só eles, moradores de rua, conhecem. Em Istambul, uma máquina automática recebe latas e garrafas garrafas pet que, em troca, oferece ração para os cachorros de rua. Os cariocas em breve também poderão trocar objetos recicláveis, neste caso por um ticket de metrô. Já em Rotterdam, os próprios cidadãos se mobilizaram para construir uma passarela de madeira, devido à falta de interesse da prefeitura em concebê-lo. E, em São Paulo, um corredor de rua propõe um aplicativo de GPS que lhe permita, com apenas um clique, notificar um vazamento de gás à empresa concessionária no momento em que está correndo e sente o cheiro.

Mais informações
Onde se encontra a inteligência de uma cidade?
Seminário: modelos colaborativos e inovação em cidades inteligentes
“É compartilhando a cidade que a tornamos mais segura”

Estas e muitas outras ideias são exemplos de como a relação entre os cidadãos e sua cidade vem mudando de forma rápida. Uma relação que cada vez menos se resume a ter o dever de pagar seus impostos e o direito de receber serviços públicos em troca. Hoje, muitos querem se engajar, ser parte da solução. "Temos a tradição de terceirizar a responsabilidade. Mas a cidade somos todos nós. Não queremos apenas saber do problema, queremos uma solução”, resumiu Murilo Farah, fundador da Benfeitoria Rio+, nesta quinta-feira no seminário Cidades Inteligentes - Mobilidade e Sustentabilidade, promovido pelo EL PAÍS no Rio de Janeiro.

Para Ana Carla Fonseca Reis, sócia-diretora da Garimpo de Soluções, “uma cidade tem que ser criativa”, que se reinventa de maneira constante. “Temos que zelar pelo espaço público, ter um olhar diferente para diversas questões”, opinou. “E isso deve envolver não apenas uma determinada classe de pessoas. A economia criativa deve envolver desde o agricultor e o trabalhador operário até um homem de negócios”.

O Rio é uma das cidades brasileiras onde seus cidadãos mais vêm utilizando a tecnologia para participar diretamente das decisões que afetam o seu dia a dia. O Rio+ é de um canal de participação popular que vem permitindo que os próprios cariocas enviem suas ideias e soluções para o poder público; uma forma de participação popular e de aproximação entre cidadãos, governo, empresas e universidades.

No ano passado, as melhores ideias foram selecionadas e 13 delas votadas para que fossem viabilizadas pela prefeitura. A troca de objetos recicláveis por um bilhete de metro é um deles. Com o Lixuveiro, os cariocas poderão usar um lava-pés nas praias de graça depois de depositar seu lixo na lixeira. Poderão também ver shows e filmes gratuitos em espaços públicos através do circuito itinerante Cinecidade. Ou trocar livros, revistas e jornais em bibliotecas livres instaladas por toda a cidade. “Se trata de uma PPPP: parceria popular-público-privada”, explicou Farah.

A tecnologia também tem permitido que a cidade processe melhor os dados que possui, muitos deles gerados por nós mesmos, para desenvolver políticas públicas e melhorar a rotina das pessoas. A prefeitura possui um grande centro de operações para, por exemplo, analisar melhor a demanda por transporte público em determinadas zonas, planejar a logística de um grande evento como o Réveillon de Copacabana, ou identificar e solucionar um problema de forma rápida.

Os aplicativos de celular são um importante fator nesse processo, principalmente com relação a mobilidade urbana. Também no Rio, o Waze, que combina GPS com alertas de trânsito, é um sucesso absoluto: as pessoas informam sobre congestionamentos e acidentes, e essas informações ajudam a prefeitura a monitorar a cidade em tempo real; em troca, o governo disponibiliza seus dados para o aplicativo. “Através dos dados, o governo conhece melhor os cidadãos para quem governa, passa a saber sobre suas percepções e reclamações”, afirmou Pablo Cerdeira, Chefe do Escritório de Dados da Cidade e Coordenador do Grupo PENSA.

Mas não basta tecnologia e vontade de se engajar. Para Washington Fajardo, presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade e do Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural, o entorno deve permitir, facilitar que os cidadãos se apropriem de sua cidade e se engajem. Deve-se retirar carros das ruas, ocupar lugares inutilizados, melhorar o acesso das pessoas ao espaço público. “O carro é o convidado do pedestre, não o contrário”.

Ainda no caso do Rio, Fajardo acredita que é urgente recuperar a relação dos cidadãos com o centro da cidade, e permitir um melhor acesso até ele. “Ninguém mora no centro, nos fins de semana está vazio”, explicou. “A recuperação da zona portuária vai permitir, por exemplo, que a poluição da Baía de Guanabara esteja mais evidente para as pessoas. Elas vão passar a frequentar o local e ver de perto sua situação. E só assim irão cobrar mais ação do poder público”.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_