Entenderá Dilma a mensagem?
“Entendi a mensagem”, afirmou Felipe González na noite de sua última vitória eleitoral em 1993. Os socialistas espanhóis tinham vencido por uma pequena diferença depois de uma campanha marcada por distintos casos de corrupção e cujo principal argumento foi insuflar o medo do retorno da direita. Mas o propósito de emenda não pôde evitar uma tendência negativa de desgaste e, em três anos, o PSOE perdia o Governo em eleições antecipadas.
No Brasil, o agônico triunfo e reeleição de Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT), descontando-se as diferenças, guarda semelhanças com aquela experiência. Na noite de domingo, Dilma prometeu ser “uma presidenta melhor do que até agora”, depois de uma campanha agressiva, apoiada na divisão social e étnica – pobres contra ricos, negros contra brancos, centros urbanos contra zonas rurais, sul contra norte, esquerda contra direita – salpicada por acusações de corrupção. Ganhou, com a imprescindível ajuda do carisma de Lula, por apenas três milhões de votos em um país com 146 milhões de cidadãos com direito a sufrágio, dos quais 50 milhões votaram em seu rival, o liberal Aécio Neves, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).
Depois dos protestos de junho de 2013, a presidenta prometeu reformas
As eleições configuraram um Brasil dividido em duas metades, mas é preciso destacar que o pleito demonstrou a solidez da democracia brasileira e levar em consideração que, embora a presidenta tenha de se esforçar para reconciliar os brasileiros, a polarização política atual é muito menor que em outros países da região e não existe tradição de enfrentamento nem na história do país, nem no temperamento de seus cidadãos.
Dilma terá de começar a trabalhar em três frentes desde o dia de sua posse em 1º de janeiro. No âmbito político, deverá enfrentar de uma vez por todas uma reforma consensual, da qual se fala há mais de 15 anos, que reduza o número de partidos parasitas no Congresso com suas corruptelas locais e disfunções de Governo.
No exterior, terá de definir o papel do Brasil, restaurando a relação com os Estados Unidos, muito deteriorada depois das revelações de Snowden, e encontrando seu lugar na América Latina, entre um Mercosul estagnado e uma Aliança do Pacífico em plena ascensão, com mais pragmatismo que preconceitos ideológicos como até agora.
Mais dura ainda será a tarefa na economia. O Brasil está em recessão técnica e seu desafio é crescer sem gerar inflação, que hoje ultrapassa a meta oficial de 6%. Para isso, segundo o consenso dos analistas, será necessário reduzir o intervencionismo do Estado em todas as áreas, o que significa uma burocracia asfixiante e encarece custos; uma reforma trabalhista e das aposentadorias que elimine os excessos atuais; uma reforma fiscal que realmente justifique a pressão que suportam os brasileiros – próxima aos 36% da OCDE – oferecendo serviços públicos de qualidade; uma revolução na educação, além de atrair investimentos estrangeiros para desenvolver a infraestrutura, cuja deficiência se tornou um autêntico entrave ao desenvolvimento do país.
Essa agenda estava nas exigências das grandes manifestações de junho de 2013. Naquela altura, Dilma disse ter entendido a mensagem e prometeu reformas, mas o que o público viu foi estádios caríssimos sendo erguidos enquanto tudo continuava igual ou a construção do porto de Mariel em Cuba, enquanto os grãos apodreciam no porto de Santos.
Os eleitores deram uma segunda oportunidade a Dilma. Será a presidenta capaz de encarnar a mudança da mudança? Terá entendido a mensagem desta vez?
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