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O inquietante ‘fenômeno Bolsonaro’

Mais de 460.000 votos coroaram o político ultraconservador como deputado federal para defender o Rio de Janeiro no Congresso

O deputado Jair Bolsonaro fala à imprensa em 2011.
O deputado Jair Bolsonaro fala à imprensa em 2011.Renato Araújo (Agência Brasil)

É a caricatura do político de extrema direita, o non plus ultra do reacionário, o fustigador público das liberdades civis, mas também a voz de centenas de milhares de eleitores que o escolheram em grande número como deputado federal para defender os interesses do Rio de Janeiro no Congresso de Brasília. Jair Bolsonaro (Campinas, 1955) colheu mais de 460.000 votos coroando-se como o deputado mais votado no estado do Rio. Embora, ironicamente, defenda as siglas do Partido Progressista (PP) – nada mais longe da realidade –, suas permanentes investidas contra tudo aquilo que se pareça com modernidade o consagram como o paladino do conservadorismo mais recalcitrante. Bolsonaro obteve nas eleições de 2010 quase 120.000 votos, de forma que seu eleitorado se multiplicado por quatro nos últimos quatro anos.

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Mas isso não é tudo. Bolsonaro também se tornou o patriarca e mentor de uma prole de jovens políticos que seguem sua doutrina de pés juntos. Flávio, de 33 anos, acaba de ser reeleito com mais de 160.000 votos para deputado estadual no Rio de Janeiro, onde defenderá as mesmas siglas e ideias de seu progenitor. Eduardo, de 30, cruzará com o pai no Congresso Nacional, mas representando o Partido Social Cristão de São Paulo, depois de receber 82.000 votos como deputado federal. O terceiro da saga é Carlos, de 32 anos que se gaba de ser o vereador mais jovem da história do Brasil quando tinha 17 anos. Segue exercendo o cargo na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, pelo Partido Progressista. Os três são leais seguidores do espírito antiliberal do pai e prometem manter viva as suas polêmicas ideias durante muitos anos.

A pergunta inevitável é: o que arrastou quase meio milhão de pessoas a elegê-lo como seu representante na Câmara dos Deputados? “A eleição de Bolsonaro mostra claramente que no Brasil existe uma parcela crescente da população, principalmente nas classes médias e altas, que têm uma visão muito conservadora do mundo. São os mesmos que atacam o Partido dos Trabalhadores, porque consideram que só governa para os pobres”, opina o analista político Felipe Borba.

Militar aposentado e católico fervoroso, Bolsonaro não é um político conservador comum com um cavalo de batalha claramente definido, mas o conservador elevado a sua máxima potência. Em suas frequentes manifestações públicas ataca com o mesmo ímpeto os homossexuais, aos quais insulta e ridiculariza sistematicamente, ou contra os consumidores de cannabis e dependentes de drogas, sobre os quais diz que poderia colocar na linha na base da paulada. Quando se trata de opinar sobre a necessidade de endurecer as penas para delitos graves, o deputado se transforma então no paladino da pena de morte. Quando o tema do debate é a tortura, denunciada por diversas organizações como um problema que continua existindo nas delegacias e prisões brasileiras, Bolsonaro opina que “se o objetivo é que o cara abra a boca, então é preciso arrebentá-lo”. Mas nada do anterior pode competir com seus delirantes comentários sobre a ditadura brasileira (1964-1985), considerada pelo deputado como um período de “20 anos de ordem e progresso”.

“É algo lamentável que alguém que levanta a bandeira da violação dos Direitos Humanos tenha este respaldo popular. Se o Brasil quer ser um país avançado, não é suficiente reduzir a pobreza e a desigualdade. Este tipo de discurso não tem lugar em um Estado democrático de direito”, comenta o sociólogo Ignacio Cano. “Bolsonaro conta com o voto corporativo de militares e policiais, e também com um voto ideológico da extrema direita, que tem a ver com a ditadura. O Rio também é um lugar especial, onde a violência e a insegurança fazem com que muita gente apoie estas soluções ilegais e o recurso à truculência”, conclui.

Bolsonaro arrasa com tudo. Nem sequer deixa os milhões de índios viverem em paz (“são pestilentos e mal-educados”, sic) ou os negros que povoam o Brasil. Muito menos as mulheres, contra as quais, em repetidas ocasiões, se referiu com condescendência. É preciso ser o homem perfeito para ter tanta aversão acumulada. No entanto, o ex-militar tampouco deve ser este homem perfeito depois de um divórcio e da enxurrada de denúncias conquistadas por sua língua incontrolável.

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