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São Paulo tem nova onda de protestos, desta vez contra as enchentes

Em dois dias, moradores de áreas pobres queimam seis ônibus em manifestações contra alagamentos causados pelas chuvas

Ônibus incendiado em protesto.
Ônibus incendiado em protesto.Marcelo Camargo/Agência Brasil

A onda de protestos sociais que atinge o Brasil desde junho do ano passado ganhou neste verão mais um capítulo. Moradores de áreas atingidas constantemente por alagamentos, em regiões pobres da cidade, estão queimando ônibus para mostrar ao poder público que estão fartos de viverem embaixo d’água durante as fortes chuvas que atingem a cidade nesta época do ano.

Nesta sexta-feira, moradores da zona leste, a mesma que virou notícia nas últimas semanas com os rolezinhos, bloquearam uma das principais avenidas da região com barreiras feitas de restos de lixo e de entulho, nas quais atearam fogo. Um ônibus coletivo também foi incendiado e, segundo informações da Polícia Militar, um supermercado e um caminhão que passava pela região foram saqueados. Imagens captadas por um helicóptero da TV Globo que sobrevoou a área mostrou adolescentes com carrinhos de supermercado repletos de mercadoria. Na quinta-feira, cinco ônibus já haviam sido incendiados nas periferias da zona leste e sul, também em protesto contra as enchentes.

São Paulo costuma ser refém das chuvas nesta época do ano. Além dos alagamentos em diversos pontos, há queda de energia, semáforos deixam de funcionar e árvores caem por diversas partes bloqueando mais ruas, o que transforma a temporada de chuvas em um verdadeiro caos para os paulistanos na maior parte de seus seis meses de duração (novembro a abril).

A zona leste, uma das áreas mais pobres de São Paulo, distante 34 quilômetros do centro da cidade, é, frequentemente, uma das mais atingidas pelas enchentes neste período. Ela é recortada por três rios (Tamanduateí, Aricanduva e Tietê) e por diversos córregos, que ficam estão repletos de lixo e de pedaços de móveis descartados pela população e são limpos de forma irregular pelo poder público.

Além disso, ela está entre as regiões mais povoadas da cidade. Por isso, é repleta de construções em concreto e tem poucas áreas permeáveis, como parques ou praças. Como consequência, há a formação de uma ilha de calor que causa chuvas mais intensas quando encontram massas de ar frio. E, como é mais impermeável, a água tem mais dificuldade para escoar e fica empoçada. A falta de limpeza dos bueiros também contribui para as enchentes.

Mulher circula por rua alagada em São Paulo, após as fortes chuvas desta sexta-feira.
Mulher circula por rua alagada em São Paulo, após as fortes chuvas desta sexta-feira.Miguel Schincariol (AFP)

Entre o final de 2009 e o início de 2010, treze bairros inteiros do extremo leste da cidade ficaram completamente embaixo d’água por mais de dois meses seguidos. A água invadiu as residências e, em alguns pontos, chegou a atingir a cintura das pessoas. Alguns moradores tiveram que deixar suas casas. Outros se recusaram a sair, com medo de saques, e permaneceram dentro das residências inundadas. Móveis e eletrodomésticos foram perdidos e os casos de leptospirose aumentaram 30%, com 23 mortes. A doença, comum quando há enchentes, é adquirida quando uma pessoa entra em contato com uma bactéria presente na urina de ratos, geralmente arrastada do esgoto pelas águas durante as inundações.

Os protestos desta sexta-feira aconteceram na avenida Marechal Tito, a cerca de quatro quilômetros do Jardim Pantanal, principal símbolo das enchentes da temporada de chuvas de 2010. No entorno da avenida, diversas ruas estavam completamente alagadas depois do temporal que atingiu a cidade durante a tarde.

Os dados oficiais do Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE), órgão da prefeitura que monitora as tempestades, relatam 23 pontos de alagamento na cidade após o temporal. Dez deles estavam na zona leste. O número, entretanto, deve ser maior, já que o sistema de monitoramento de enchentes de São Paulo é falho: baseia-se nos relatos dos agentes da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), que circulam pelas ruas controlando o trânsito. Como eles se concentram, na maior parte do tempo, em vias principais, as ruas pequenas e as áreas da periferia não costumam entrar na conta.

Este verão, por enquanto, está dentro da média histórica de precipitação, segundo o CGE. Até agora, choveu em janeiro 161.2 milímetros, 60% da média esperada para o mês (266.2 mm). Para efeito de comparação, em janeiro de 2010, quando a zona leste ficou inundada por mais de dois meses, choveu 464.9 mm. A prefeitura diz que tem realizado obras na região para facilitar o escoamento da água, e afirma que as enchentes foram provocadas porque a zona leste teve, nesta sexta, as maiores chuvas desde o início do verão.

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