Após erupção em La Palma, língua de lava já alcança entre 5 e 10 hectares do mar
Em seu caminho para o oceano, magma atingiu mais de 700 edificações, 267 hectares e 21 quilômetros de estradas na ilha
A lava do vulcão de La Palma chegou finalmente ao mar na noite desta terça-feira (29) e está criando um imenso delta de sedimentos que já conquistam terreno no oceano. Em seu avanço, a lava ganhou entre cinco e 10 hectares no mar na tarde do dia seguinte, na quarta-feira, segundo cálculos do EL PAÍS. A última atualização oficial da adminstração de La Palma, feita por meio de drones às 12h, indicava um crescimento de 4,8 hectares. No entanto, o fluxo contínuo de lava permitia prever: essa extensão aumentaria. No final da manhã, a imensa massa quente havia alcançado meio quilômetro de largura e tinha mudado a cor da água ao redor, conforme explicou à agência Efe Eugenio Fraile, do Instituto Espanhol de Oceanografia (IEO), a bordo do navio Ramón Margalef. A extensão de lava está se expandindo aos poucos e, durante a manhã de quarta-feira, atingiu cerca de 50 metros de altura, formando uma espécie de pirâmide.
O tortuoso e caprichoso caminho de 11 dias que o magma percorreu em direção à costa oeste da ilha deixou uma conta que terá de ser enfrentada nos próximos meses: na área de 476 hectares que cobre, atingiu 744 edificações, das quais 656 foram destruídas, e devastou uma área de 267,5 hectares de cultivo. Além disso, os quilômetros de estradas atingidos chegam a 23,1, dos quais 21,5 estão destruídos, segundo a última contagem do sistema de satélites europeu Copernicus.
A principal preocupação é a ligação com algumas localidades do sul de La Palma, como Puerto Naos ou La Bombilla. Atualmente, 185 pessoas estão alojadas em um hotel no município de Fuencaliente, no sul da ilha. “Embora pareça que a corrente está canalizada”, alertou o diretor técnico do Plano de Emergências Vulcânicas das Canárias (Pevolca), Rubén González, “a erupção não está estabilizada”, razão pela qual recomendou o uso de máscaras do tipo FFP2 em toda a área do vulcão.
O presidente do Governo das Canárias, Ángel Víctor Torres, explicou em entrevista à rádio Cope que há “enormes estragos em estradas e casas, mas essa lava já tem trânsito para o mar” e espera que essa via permita que os deslizamentos de terra deixem de aumentar, de modo a impedir a destruição de edifícios. Segundo cálculos do portal Idealista, o valor das casas e terrenos destruídos chega a 206 milhões de euros (cerca de 1,3 bilhão de reais).
Por outro lado, a erupção do novo vulcão de La Palma “não afetou a qualidade do ar, que é perfeitamente respirável”, como enfatizaram autoridades. O órgão destaca que os dispositivos de medição da presença de gases realizam medições periódicas e não registraram valores considerados nocivos à saúde. Mesmo assim, o órgão pede aos moradores de Tazacorte que permaneçam dentro de suas casas, neste caso devido à nuvem de gases tóxicos que emana do contato da lava com o oceano. Nesse sentido, a diretora do Instituto Geográfico Nacional (IGN) nas Canárias, María José Blanco, enviou uma mensagem de tranquilidade nesta quarta-feira em uma entrevista coletiva ao afirmar que os gases tóxicos que emanam da queda de lava no mar afetam apenas a zona de contato, uma vez que o vento os dissipa rapidamente. Por outro lado, Blanco alertou para uma maior incidência de dióxido de enxofre no ar da ilha, embora sempre dentro de parâmetros aceitáveis.
A nuvem de cinzas e dióxido de enxofre emitidos pelo vulcão se deslocará ao longo do dia, segundo Blanco, em direção ao noroeste do vulcão, o que facilitaria a retomada completa das operações no aeroporto da ilha. Essa mudança na direção do vento pode fazer com que a nuvem alcance a ilha de El Hierro.
Aceleração
Depois de alguns dias de desaceleração, as correntes de lava se reativaram no domingo, dia em que aumentou a velocidade do rio incandescente em seu avanço em direção ao mar, uma semana depois do início da erupção. E o fez de forma diferente: até agora a erupção tinha um caráter estromboliano [explosividade média intermitente], com um fluxo de lava não tão rápido e fortes explosões. De um dos flancos do cone, surgiu, no início da semana, um centro emissor de onde jorrou uma lava muito mais fluida, sem explosões, de caráter mais havaiano, o que acelerou a chegada da corrente ao mar. Seu último passo antes de fazer desaparecer a praia de los Guirres foi cair de uma falésia de aproximadamente 110 metros de altura.
“Meu trabalho está seriamente em perigo”, disse nesta terça-feira no bairro confinado de San Borondón Juan Carlos González, um agricultor de 55 anos que possui 25% de uma fazenda no município de Tazacorte. “Se a lava não o levou, o que não sei, as colheitas e os subsídios estão perdidos”, disse com uma cerveja Dorada na mão. O diretor técnico do Pevolca, Rubén Fernández González, anunciou a esse respeito que os regantes de El Remo, Puerto Naos e Las Hoyas poderão atender suas fazendas nesta quinta-feira “se as condições o permitirem”.
O presidente do Governo espanhol (primeiro-ministro), Pedro Sánchez, informou nesta quarta-feira que voltará às Ilhas Canárias (já as visitou na semana passada), sem mencionar datas, e acrescentou que as duas administrações estão trabalhando para aprovar mais ajuda aos moradores da ilha. O Executivo detalhou que adquirirá as 107 casas destinadas às vítimas da erupção do vulcão de La Palma “antes do final do ano”. Além disso, a ministra dos Transportes, Mobilidade e Agenda Urbana, Raquel Sánchez, disse que pretende viajar nos próximos dias a La Palma para “ver pessoalmente como tudo está sendo feito” e avaliar melhor os grandes danos nas estradas.
Assistência psicológica
Uma centena de psicólogos trabalha atualmente na assistência à população afetada pela erupção vulcânica na ilha de La Palma. São cerca de 60 profissionais voluntários que oferecem apoio psicológico através do número de telefone gratuito disponibilizado às vítimas pelo Colégio Oficial de Psicologia de Santa Cruz de Tenerife, e cerca de 30 acompanham e atendem na ilha as pessoas evacuadas, em sua maioria pertencentes ao Grupo de Intervenção Psicológica em Emergências e Catástrofes (Gipec). “Em casos de emergência”, disse no domingo uma das coordenadoras desse grupo de voluntários, Nayra Rodríguez, “há pessoas que reagem com muita tristeza, outras que sofrem um bloqueio emocional, ou que podem até negar as circunstâncias e preferir viver em um filme e fingir que a coisa não tem a ver com elas”. O que mais encontrou, explica, são situações de choque e crises de ansiedade.
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