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Onda de calor ‘Lúcifer’ inflama a Itália, com temperatura recorde de 48,8 graus na Sicília

Em Siracusa, sudeste da ilha italiana, os termômetros superaram os 48 graus registrados em Atenas em 1977, ponto máximo do calor até agora

Turistas se refrescam em Roma, nesta quarta-feira.
Turistas se refrescam em Roma, nesta quarta-feira.ALBERTO PIZZOLI (AFP)

A onda de calor Lúcifer está transformando a Itália, e em particular o sul do país, num inferno com temperaturas que superam constantemente os 40 graus e costumam girar em torno dos 45. Embora o episódio atinja com especial severidade as regiões de Sicília, Calábria e Apúlia, no extremo sul, no norte os termômetros também dispararam, e várias cidades estão com alerta máximo nos últimos dias.

Em Siracusa, cidade costeira do extremo oriental da Sicília, o mercúrio alcançou nesta quarta os 48,8 graus, segundo as medições do Serviço Informativo de Agrometeorologia (SIAS) do governo regional. Essa temperatura extrema ainda precisa ser validada nos próximos dias pela Organização Meteorológica Mundial, mas, se vier a confirmação, seria um novo recorde de calor na Europa, já que a maior marca registrada oficialmente até o momento, de 48 graus, ocorreu em Atenas em 1977. Em 1999 foram alcançados os 48,5 graus numa estação não oficial de Catenanuova, também na Sicília, mas não houve confirmação.

Em vídeo, imagens dos incêndios na Itália, onde a região sul é a mais afetada. Vídeo: REUTERS / EFE / FRANCESCO RUTA
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Relatório da ONU sobre o clima responsabiliza a humanidade por aumento de fenômenos extremos

Embora sejam temperaturas excepcionalmente altas, os valores exatos dependem dos métodos de medição utilizados e de sua precisão. Por exemplo, os termômetros eletrônicos de algumas farmácias sicilianas, expostos ao Sol, chegaram a marcar 51 graus. Os medidores do Exército registraram temperaturas que rondam os 45 graus como máximo em diversos pontos da ilha, em particular em zonas do interior. Na Sardenha foram atingidos picos de 43,1 graus, na Calábria (a ponta da “bota” no mapa do país) ficaram em torno dos 42; e na Campânia, com capital em Nápoles, e em Lazio, onde se encontra Roma, chegou-se aos 40 graus.

Nesta quinta-feira, no total houve 10 cidades do país inteiro – há dois dias, eram somente quatro – em alerta vermelho (o máximo nível) por altas temperaturas, como Palermo, Bari, Bolonha e Roma, onde o asfalto se derrete com a passagem dos pedestres.

Para esta sexta, o Ministério da Saúde adicionou outras cinco localidades à lista, entre elas Florença e Bolzano, no norte, já na beira dos Alpes. Espera-se que os termômetros continuem altos durante o fim de semana. O alerta vermelho é utilizado no boletim da onda de calor do Ministério para marcar os centros urbanos onde existe alto risco para toda a população, e não apenas para os setores mais vulneráveis, como os doentes e idosos – situação em que é utilizado o alerta laranja.

Mediterrâneo em chamas

A situação, com valores tórridos acima dos 40 graus, repete-se em grande parte do Mediterrâneo oriental, onde países como Grécia, Macedônia do Norte, Albânia, Argélia e Turquia enfrentam as piores ondas de calor dos últimos anos e são atingidos por incêndios.

Incêndio em Giarratana (Sicília), na quarta-feira passada.
ANTONIO PARRINELLO (Reuters)

As altas temperaturas chegam três dias depois do contundente relatório científico do IPCC, o painel de especialistas em mudança climática da ONU, que adverte que a ação do ser humano já provocou alterações sem precedentes no sistema climático. Segundo o cientista italiano Antonello Pasini, especializado em climatologia do Conselho Nacional de Pesquisas, isto está relacionado com os fenômenos meteorológicos extremos. Aqueles ocorridos “no Mediterrâneo e na Itália se devem, em grande medida, ao aquecimento global antropogênico e à emissão de gases do efeito estufa na atmosfera. Esse aquecimento global gerou importantes mudanças em nossas latitudes, especialmente na circulação do ar. A circulação equatorial-tropical se expandiu em direção ao norte, de modo que os anticiclones africanos, que costumavam permanecer sobre o deserto do Saara, podem agora entrar no Mediterrâneo”, afirma. E completa: “Até há algumas décadas, os verões mediterrâneos eram dominados pelo famoso anticiclone dos Açores que, chegando do Atlântico e entrando no Mediterrâneo, agia como um colchão de ar estável que nos protegia das perturbações procedentes do norte da Europa e do feroz calor africano. Agora, com esta ampliação da circulação equatorial-tropical, os anticiclones africanos têm caminho livre para entrar, provocando fortes ondas de calor.”

Essa temperatura extrema e contínua agravou os numerosos incêndios que se estendem pela Itália meridional, sobretudo na Sicília, onde foi preciso evacuar os habitantes de algumas zonas. Na Calábria, onde três pessoas morreram por causa do fogo, o Exército foi mobilizado para lutar contra as chamas. Em todo o país, havia na quarta-feira mais de 30 focos ativos, contando também os da Sardenha, Basilicata, Campânia, Lazio e Apúlia.

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Embora muitos dos fogos sejam provocados, a associação agrícola Coldiretti estima que a mudança climática tenha contribuído para que houvesse o triplo do número de incêndios em comparação com a média do período 2008-2020. A associação lembra que os destroços imediatos devem ser somados aos de longo prazo, considerando que serão necessários cerca de 15 anos para recuperar todo o ecossistema florestal e todas as atividades humanas tradicionais, da coleta de madeira até a de trufas e pequenos frutos, passando pela de cogumelos e o ecoturismo.

Neste verão marcado pelos acontecimentos extremos e pelas temperaturas abrasivas, a onda de calor também repercute nos preços das frutas, que caíram 4,9% em comparação com o mesmo período do ano passado. Os animais também estão sofrendo nas fazendas, e as vacas produzem até 10% menos leite que nos períodos de menos calor. Em muitos lugares, as chamas queimaram pastagens e forragens usadas para alimentação do gado, além de destruir frutas, verduras, vinhedos e oliveiras.

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