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Cai deputado ou balança o Governo no imbróglio da compra da Covaxin

Acusações mútuas no caso Covaxin são gravíssimas e as consequências ainda são imprevisíveis. Escândalo já rendeu processos, pedidos de prisão e de impeachment

Homenagem às vítimas de covid na praia de Copacabana, , no Rio. EFE/Antonio Lacerda
Homenagem às vítimas de covid na praia de Copacabana, , no Rio. EFE/Antonio LacerdaAntonio Lacerda (EFE)
Carla Jiménez
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Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
CPI mira suspeita de crime na compra da vacina Covaxin enquanto confronta mentiras de Osmar Terra
Brazil's Health Minister Marcelo Queiroga adjusts his protective face mask for COVID-19, during his testimony before the Senate for an investigation of the government's management of the COVID-19 pandemic, in Brasilia, Brazil, Tuesday, June 8, 2021. (AP Photo/Eraldo Peres)
Investigação de Queiroga, Pazuello, Ernesto Araújo e mais 11 testa poder da CPI da Pandemia
Bangalore (India), 14/06/2021.- A health official displays a vial of the 'COVAXIN' vaccine against Covid-19 during a vaccination drive, in Bangalore, India, 14 June 2021. The Karnataka State government has eased coronavirus restrictions and imposed semi lockdown and the night curfew will be in effect from 7pm to 5am in all other districts and weekend curfew will be imposed in Bangalore city. EFE/EPA/JAGADEESH NV
Caso Covaxin empareda Governo Bolsonaro e tem Dia D na CPI da Pandemia nesta sexta. Entenda

O contrato de compra da vacina Covaxin plantou suspeitas de corrupção no Governo Bolsonaro e já colhe um escândalo. A guerra aberta com o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), irmão do servidor Luis Ricardo Miranda, que aponta irregularidades no contrato entre a Precisa Medicamentos e a Bharat Biotech, já rendeu ameaça de processo, um pedido de prisão por coação e fermentou mais um super pedido de impeachment do presidente, que deve ser apresentado nos próximos dias. Até Deus foi convocado para advogar na peleja política que afronta as boas práticas e a narrativa ilibada de Jair Bolsonaro. “O senhor não vai só se entender com Deus, vai se entender com a gente também”, avisou o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, anunciando que a Polícia Federal vai abrir investigação contra o parlamentar e seu irmão por “denunciação caluniosa”. Alegou falsificação de documento para desmentir o deputado, num esforço de contrainformação que não se sustentou.

Luis Miranda reagiu e protocolou um pedido de prisão do ministro por coação na CPI da Pandemia. O deputado tem um currículo que demonstra vaidade suficiente para suportar e inflamar essa queda de braço com o Governo que apoiou até esta semana. Foi na onda Bolsonaro que ele se elegeu em 2018 quando ainda morava nos Estados Unidos. Seguiu a cartilha do bolsonarismo, com críticas à imprensa na defesa de operações policiais duvidosas, como a de Jacarezinho, no Rio. Seguiu o embalo de criticar inclusive a CPI da Pandemia, que nesta sexta será palco para suas denúncias contra o Governo.

O deputado, de 41 anos, já se envolveu em episódios rocambolescos, como vítima e vilão. Em 2019, filmou, em acordo com a polícia, um estelionatário uruguaio que o extorquia para que youtubers parassem de falar mal dele e de seus negócios. O estelionatário foi preso. Mas os vídeos que o atacavam ressaltavam suspeitas de golpes por vender, quando estava nos Estados Unidos, oportunidades de negócio. Também chegou a ser acusado de fraude e corrupção pela campanha eleitoral de 2018 ―inocentado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal no último dia 11.

Agora, este personagem errático promete entregar à CPI, ao lado do irmão Luis Ricardo, provas de tudo que denuncia. “Sexta-feira o Brasil saberá a verdade e os documentos falam por si só... se ficarmos calados, já será suficiente para todos os brasileiros se revoltarem e ainda entender quem está atrasando o Brasil!!”, afirmou o deputado em seu Twitter, onde peitou o presidente. “Diga a verdade PR @jairbolsonaro, e que de fato estivemos com o Senhor dia 20/03 e denunciamos uma irregularidade na aquisição da Covaxin e que o Senhor deu o devido tratamento ao caso, conforme informou que o DG da PF receberia os documentos ainda no dia 20/03.”

Seu depoimento no Senado deve esclarecer, também, o preço negociado pela Covaxin como o laboratório indiano. Troca de telegramas diplomáticos, revelados pelo jornal O Estado de S. Paulo, sugere que o valor de compra negociado entre Brasil e Índia era abaixo de 2 dólares por dose para o Brasil, muito mais barato do que os 15 dólares do contrato anunciado pelo Ministério da Saúde em fevereiro deste ano.

Para os integrantes da CPI, vai ser a oportunidade de colar as peças que pretendiam num quebra-cabeça sobre a gestão da pandemia. O presidente, por sua vez, mantém a rotina sob uma estampa de indiferença ao escândalo com a Covaxin em suas aparições públicas. Nesta quinta, ele esteve no Rio Grande do Norte, onde repetiu suas habituais grosserias. Em um evento, pediu a uma criança para que ela abaixasse a máscara, e fez o mesmo com outra criança. Já nesta sexta-feira, Bolsonaro afirmou que vai determinar que a Polícia Federal investigue as alegações feitas pelo deputado. “Lógico que abrirei inquérito”, afirmou, “olha a vida pregressa dele [o deputado Luis Miranda]”, completou o mandatário, em entrevista coletiva.

Enquanto coleciona cenas repulsivas, sua fama decresce. As suspeitas sobre as compras da vacina indiana chegam na sequência da mórbida marca dos mais de meio milhão de mortos pela covid-19 no Brasil, e de mais um protesto massivo nas ruas contra o presidente. Brasileiros que perderam afetos começam a calcular o que teria sido se a compra de vacinas tivesse sido eficiente. “Ao menos 120.000 mortes teriam sido evitadas”, projetou a diretora da Anistia Internacional, Jurema Werneck, em depoimento na CPI nesta quinta.

Os mais de 500.000 mortos no Brasil, o país onde hoje mais se morre pela covid-19 no mundo, puxaram uma cobrança mais forte de posição de partidos, políticos e famosos em relação ao presidente. Uma pesquisa do Ipec, feita entre os dias 17 e 21 de junho, mostra uma rejeição de 50% ao Governo, contra 39% em fevereiro. A pesquisa, feita com 2.200 pessoas em 141 cidades, aponta uma aprovação de 23%.

Neste momento de baixa, seus opositores prometem apresentar na próxima semana um super pedido de impeachment com apoio de partidos de diferentes matizes, que englobe os demais pedidos que estão parados na mesa do presidente da Câmara, Arthur Lira. As informações relativas às denúncias da Covaxin devem turbinar o pedido, cobrando o artigo 268 do Código Penal, que prevê a infração de introdução ou propagação de doença contagiosa, crime agravado se o agente propagador for um servidor público.

Os pedidos não sensibilizam Lira, mas os protestos nas ruas, que devem voltar em julho, já escolheram o presidente da Câmara como alvo. A CPI chega agora a um ponto nevrálgico em que se confirmadas as denúncias do deputado Luis Miranda e seu irmão, Luis Ricardo, o Governo perde um fio da sua narrativa. Se conseguir viram o jogo, porém, Miranda se verá em maus lençóis e o presidente continuará arrastando seu bonde até a campanha de 2022. Ou a Covaxin derruba um deputado ou um Governo.

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