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Pedra de Toque
Coluna
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Na corda bamba

Desejo ardentemente que Keiko Fujimori vença a eleição presidencial no Peru para salvar o país da incompetência, da censura e da pobreza que o comunismo de seu rival traria

Mario Vargas Llosa
Elecciones Peru
FERNANDO VICENTE

Se colocamos um mapa da América do Sul sob nossos olhos, é evidente que nos últimos anos as forças de esquerda obtiveram triunfos consideráveis. No gigante brasileiro, além das barbaridades cometidas pelo próprio Jair Bolsonaro e as atribuídas a ele pela imprensa estrangeira, que o odeia, os juízes soltaram Luiz Inácio Lula da Silva e o Partido dos Trabalhadores está bem encaminhado à próxima eleição. Se os estrangeiros pudessem votar, Lula, seu menino dos olhos, ganharia fácil. Os brasileiros são mais cautelosos: lembram, sobretudo, que várias condenações pesam sobre ele, por se aproveitar do poder e por corrupção. A candidatura do juiz Sergio Moro à presidência da República —o homem que mandou à prisão o maior número de empresários, funcionários e delinquentes da história do Brasil na operação Lava Jato—, foi esvaziando e agora parece paralisada, talvez abolida.

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Na Argentina, o dueto Alberto Fernández/Cristina Kirchner está cada dia pior e a ruptura está no ar; mas os dois são menos insensatos do que se pensa e provavelmente manterão uma convivência aparente para conservar o poder. Não é de grande ajuda para eles, a julgar pela situação catastrófica da nação. O Chile não está muito melhor e tudo nesse país, que parecia ter feito sua lição de casa e crescido até se distanciar do restante da América Latina e atingir níveis europeus, agora é um absoluto caos. O Partido Comunista, que havia encolhido até ser quase marginal, é agora o maior partido político do país, conduzido por jovens aguerridos de ambos os sexos que sonham com uma nação uniforme, de economia estatizada, que arruinaria uma sociedade que, parecia, iria ser a primeira na América Latina a acabar com o subdesenvolvimento. Mas quem agora se lembra disso? O Partido Comunista e os revolucionários e anarquistas da Frente Ampla, e seus jovens furiosos, parecem ter conquistado o futuro imediato e, cúmulo dos males, a direita – a ultradireita que é, além disso, ultracatólica – parece confinada ao bairro rico de Las Condes. Como farão as 150 pessoas escolhidas – talvez sejam mais – para redigir a nova Constituição? Arrancando os cabelos, sem dúvida. O país que acreditávamos na vanguarda passou à retaguarda da América Latina entre as devastações das que basta um número para medir a catástrofe: em menos de meia hora os rebeldes queimaram e destruíram oito estações do metrô mais moderno e caro da América Latina.

Na Bolívia, as forças de Evo Morales voltaram ao poder e este tem agora um candidato a quem divulga e chama de “irmão” e “cholito” em todos os seus discursos. Mas não é boliviano, e sim peruano: Pedro Castillo, que disputa o segundo turno com Keiko Fujimori nas eleições peruanas que serão decididas neste domingo. A Colômbia, como se vê nos jornais, queima por todos os lados e o presidente Iván Duque é atacado até mesmo por seu próprio partido e seu mentor, o ex-presidente Álvaro Uribe, o acusa de ser fraco e não recorrer mais ao Exército para pacificar os manifestantes violentos que, guiados pela mão venezuelana, querem roubar seu poder. O solitário Equador, com outro solitário, o Uruguai, país onde os eleitores foram mais sensatos do que o restante dos sul-americanos, são as escassas exceções democráticas em um subcontinente que parece empenhado em ressuscitar o marxismo-leninismo que os europeus e asiáticos se encarregaram de enterrar.

O caso do Peru, país que tem fronteiras com cinco países sul-americanos, e é um alvo favorito no imediato para o eixo cubano, venezuelano, boliviano e nicaraguense, terá sua conclusão neste domingo, entre o candidato dessa quadriga, Pedro Castillo, e Keiko Fujimori, os dois finalistas do primeiro turno eleitoral. Esta última reduziu a distância que tinha com o vencedor, de mais de seis pontos, e ele caiu ligeiramente até os dois chegarem, segundo as últimas pesquisas, a um empate técnico. O vencedor, não importa quem, terá muitos problemas com um Parlamento muito dividido, em que será difícil, para qualquer Governo, obter a maioria indispensável necessária para aprovar as leis.

Mas, ao contrário de outras, esta eleição no Peru significará não uma mudança de pessoas no poder, como até agora, e sim uma mudança de sistema. Se Pedro Castillo ganhar a eleição, o marxismo-leninismo-mariateguismo (assim o definem suas hostes) chegará ao poder ungido e sacramentado com os votos dos peruanos, e, como disseram com clareza os dirigentes do partido Peru Livre que lançou esse candidato, o de Vladimir Cerrón, não pensam em deixar o poder, como todos os regimes comunistas que existiram no passado no planeta e dos que são exemplos sobreviventes Cuba, Venezuela e a Nicarágua do comandante Daniel Ortega e sua esposa Rosario Murillo. Os peruanos querem isso? Um país devastado pela censura, pela incompetência econômica, sem empresas privadas e investimentos estrangeiros, empobrecido por burocratas prevaricadores e servis, e uma polícia que sufoca diariamente conspirações fantásticas criando uma ditadura mais feroz e sanguinária do que todas as conhecidas pelo país ao longo de sua história?

Muitos peruanos acreditamos que não e decidimos votar em Keiko Fujimori. Ela pediu desculpas publicamente por seus erros do passado e ampliou consideravelmente sua equipe de governo, incorporando antifujimoristas convictos e confessos, e se comprometendo a respeitar a liberdade de expressão, o poder judicial e entregar o comando após os cinco anos de mandato como estabelece a Constituição. Não é certo que essas promessas a farão vencer a eleição. Mas, se a perder, a certeza, isso sim, é que com Pedro Castillo no poder não voltarão a ocorrer eleições limpas no Peru, e as supostas “consultas” eleitorais serão idênticas a essas farsas coletivas de Cuba, Venezuela e Nicarágua, a cada determinado número de anos, em que se pede à população que confirme com seus votos os candidatos escolhidos pelo poder.

Minha impressão é que boa parte da esquerda peruana se resigna a uma ditadura como a que se avizinha no país se o pequeno partido de Vladimir Cerrón (que se formou em medicina em Cuba, onde morou por 10 anos), o ex-governador de Junín que não pôde ser candidato presidencial de seu partido por ter cometido crimes punidos pelos juízes, vencer o segundo turno. A aparição de Pedro Castillo, professor de Chota, uma região de Cajamarca, foi uma surpresa aos moradores de Lima, que de repente descobriram que as províncias existiam, com reivindicações enormes contra a capital —que representa mais ou menos um terço da população, mas que concentra a maior parte do poder econômico e político do país— e um ressentimento que a péssima gestão da pandemia agravou pois matou até agora um em cada duzentos peruanos (180.000 pessoas), principalmente nas províncias e aldeias da serra, se reflete como em um espelho nessas eleições. Mas ceder ao mais imediato, como as enormes distâncias que separam os ricos dos pobres no país e que esta pandemia tornou mais visíveis e dramáticas, é se lançar em um suicídio político que fecharia para sempre —ou por muito tempo— a possibilidade do país de recuperar sua velha história, quando foi, no passado pré-hispânico, cabeça de um império que alimentava todo mundo, e nos trezentos anos coloniais quando o vice-reinado peruano era o mais próspero da América. Tudo isso para se transformar em um agente a serviço de Cuba e Venezuela, países que, mesmo que morram de fome e transformados em prisões, sabem principalmente reprimir e controlar uma sociedade em bancarrota. Por isso, fiz campanha por Keiko Fujimori e desejo ardentemente que vença esta eleição.

Direitos mundiais de imprensa em todos os idiomas reservados a Ediciones EL PAÍS, SL, 2021.

© Mario Vargas Llosa, 2021.

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