Acusação mútua de corrupção domina debate entre presidenciáveis no Peru, mas não convence indecisos
Pedro Castillo continua com vantagem de 10 pontos sobre Keiko Fujimori. 40% dos peruanos não sabe em quem vai votar no segundo turno
Os dois candidatos peruanos à presidência participaram neste sábado de um debate improvisado em Chota, pequena cidade de 45.000 habitantes numa das regiões mais pobres do Peru, a mais de 900 quilômetros de Lima, a capital. Os políticos haviam se desafiado 24 horas antes, de modo que o evento não pôde ser organizado pela autoridade eleitoral e acabou sendo moderado por alguns jornalistas locais. O professor rural Pedro Castillo, líder nas pesquisas, recebeu em seu território Keiko Fujimori, que apareceu vestida com a camiseta da seleção de futebol. Ambos se acusaram de casos de corrupção e discordaram sobre questões centrais, mas o debate dificilmente servirá para mudar as intenções de voto dos peruanos. Acima de tudo, o encontro teve um caráter simbólico por sua localização.
Segundo pesquisa divulgada na noite da quinta-feira pela empresa Datum Internacional, a conservadora Keiko conta com 34% das intenções de voto. Já seu oponente, o esquerdista radical, tem 44%. Esses 10 pontos de diferença poderiam parecer intransponíveis a essa altura da disputa, mas 40% dos entrevistados continuam indecisos sobre quem votarão no segundo turno, que acontece em 6 de junho. Isso ajuda a entender por que Keiko decidiu se arriscar num “cara a cara” no terreno de Castillo. Afinal, ela está em segundo lugar e precisa reverter a situação.
A província de Chota é o berço das rondas de vigilância de Cajamarca, uma organização camponesa de autogestão criada em meados dos anos setenta para se defender dos ladrões de gado. Chota também figura na história nacional como uma das localidades que declararam sua independência dos espanhóis em janeiro de 1821, antes de Lima.
Durante os anos da violência do grupo terrorista Sendero Luminoso (1980-2000), as rondas garantiam que os subversivos não entrassem em Cajamarca. Castillo, além de ter nascido no povoado de Puña, em Chota, é professor rural nessa província e foi dirigente rondero durante a juventude.
Fujimori e Castillo debateram na praça de Armas de Chota sobre cinco temas: gestão da pandemia, educação, recuperação econômica, luta contra a criminalidade e corrupção. Conforme o acordo dos representantes da fujimorista Força Popular e do esquerdista Peru Livre, a polícia permitiu que apenas cerca de 400 pessoas entrassem na praça, além dos jornalistas.
Castillo, que (assim como Fujimori) se opõe ao aborto e ao casamento igualitário, lançou os golpes mais duros contra sua adversária devido à sua condição de imputada pelos crimes de lavagem de dinheiro, organização criminosa e obstrução da Justiça. Em março, o Ministério Público pediu 30 anos de prisão para a filha mais velha do autocrata Alberto Fujimori por ter recebido contribuições milionárias ―supostamente da construtora brasileira Odebrecht e do principal grupo financeiro peruano―, que ela não declarou às autoridades eleitorais em suas campanhas à presidência em 2011 e 2016.
Fujimori, que recebeu apoio da direita, inclusive de críticos históricos de sua família, censurou Castillo quando propôs melhorar as condições de trabalho dos professores, “mas não para os que pedem licença sindical e deixam os alunos abandonados”, questionou. Seu rival respondeu: “Alguns pedem licença de trabalho para serem candidatos, outros pedem licença judicial”. A conservadora enfrenta o processo na Justiça com liberdade vigiada, viajando a atividades proselitistas com autorização de um juiz.
A líder da Força Popular questionou Castillo porque o presidente de seu grupo político, Vladimir Cerrón, foi condenado a quatro anos de prisão em suspenso por corrupção quando foi governador da região de Junín. Mas Castillo contra-atacou: “Em nosso Governo, nenhum corrupto passará porque eles são como a galinha: ‘Você queima o bico, mas ela continua comendo os ovos’. Recuperaremos os 6 bilhões de dólares [32,6 bilhões de reais] da corrupção”, afirmou, em referência ao valor do desfalque durante o regime do pai da candidata, nos anos noventa.