Israel desbloqueia a passagem das primeiras vacinas enviadas a Gaza após dois dias retidas
Autoridade Palestina acusou Israel de reter 2.000 doses da Sputnik V em um posto de controle. Um porta-voz militar afirmou que a permissão estava subordinada a uma “decisão política”
As primeiras 2.000 doses de vacinas contra a covid-19, que permitirão imunizar mil pessoas, chegaram à Faixa de Gaza nesta quarta-feira depois que Israel bloqueou sua entrega da Cisjordânia por dois dias. Majdi Dhair, diretor do Ministério da Saúde do enclave palestino, garantiu a um grupo de jornalistas que a entrega foi autorizada após pressões internacionais sobre Israel, principalmente da Organização Mundial da Saúde (OMS), segundo informações da Efe.
O ministério Saúde palestino informou inicialmente que havia recebido apenas 1.000 doses, das 2.000 que a Autoridade Nacional Palestina (ANP) pretendia enviar, e posteriormente Munir Borsh, diretor de Farmácia da pasta, esclareceu que havia chegado o lote completo.
A Autoridade Palestina acusou Israel de reter desde segunda-feira 2.000 doses da vacina Sputnik V, de fabricação russa, destinadas à imunização da população que corre maior risco no enclave costeiro. O sinal verde à chegada das vacinas foi dado na quarta-feira. Um porta-voz do órgão militar que gere a ocupação dos territórios palestinos afirmou na terça-feira que o material sanitário havia sido bloqueado por “uma decisão política” do Conselho de Segurança Nacional, que depende do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu.
No começo da pandemia foram os respiradores e o material de proteção, agora foram as vacinas que se transformaram em objeto de pressão de Israel sobre as milícias palestinas da Faixa de Gaza, contra as quais lutou em três guerras entre 2008 e 2014. A precariedade do sistema sanitário de Gaza é visível após ter ficado semiarrasado nos sucessivos conflitos armados e deteriorado pelo bloqueio imposto por Israel com o apoio do Egito. Os dois milhões de habitantes do enclave, confinados há 13 anos em apenas 375 quilômetros quadrados, precisaram enfrentar as consequências da pandemia com limitada ajuda exterior.
A ministra da Saúde palestina, a médica Mai al Kaila, afirmou que as doses que foram retidas são para os trabalhadores da saúde que atuam nas unidades de cuidados intensivos para pacientes com covid-19 de Gaza e em serviços de emergência. O território palestino registrou mais de 53.000 casos e 538 mortos pelo novo coronavírus desde o começo da pandemia. Um responsável do Ministério da Saúde em Gaza, no entanto, disse à agência Reuters que “as primeiras doses serão para pacientes com transplantes de órgãos e problemas renais”, afirmou. E que não há vacinas suficientes para os profissionais de saúde.
Hazem Qasem, porta-voz do Hamas, denunciou na terça-feira que “o bloqueio das vacinas é um crime que viola o direito humanitário internacional”. ONGs israelenses ― como a Gisha e os Médicos pelos Direitos Humanos, citadas pela Efe ― responsabilizaram Israel de impor um castigo coletivo à população civil de Gaza que viola a Convenção de Genebra sobre direito humanitário de guerra.
Reféns como desculpa para bloqueio
Vários deputados do Kneset (Parlamento israelense) aprovaram o bloqueio do envio das vacinas para impedir que fossem desviadas para imunizar os chefes políticos e militares do Hamas, que governa de fato a Faixa de Gaza desde 2007. Também exigiram que as vacinas continuem retidas enquanto o movimento islamita não libertar dois israelenses presos no enclave e devolver os restos dos militares mortos no conflito de 2014.
O presidente da Comissão das Relações Exteriores e Segurança da Câmara, Zvi Hauser, pediu na terça-feira ao Governo que explicasse as razões para permitir a entrega das doses da Sputnik V “enquanto há reféns israelenses sequestrados”. O deputado da coalizão árabe Lista Conjunta Ahmed Tibi expressou sua indignação por um debate em que se tentava justificar o bloqueio das vacinas. “Seus filhos sentirão vergonha de vocês”, disse aos parlamentares.
Dois civis israelenses, que, supostamente, têm problemas mentais, foram capturados após cruzar acidentalmente há cinco anos o muro divisório com Gaza. São eles Avera Mengistu, judeu de origem etíope, e o beduíno Hisham al Sayed. Os familiares dos soldados Hadar Goldin e Oron Shaul, que teriam sido mortos em combate durante a chamada operação Limite Protetor, lideram uma ativa campanha com o objetivo de recuperar seus cadáveres e sepultá-los de acordo com a tradição do judaísmo.
As exigências do Hamas na troca do elevado número de prisioneiros palestinos pelos dois civis israelenses e os restos dos dois militares bloquearam no ano passado um princípio de acordo que também significava ajuda sanitária. O líder islamita no enclave, Yahya Sinwar, foi um dos 1.027 presos libertados por Israel em troca da soltura do soldado Gilad Shalit, cativo em Gaza entre 2006 e 2011.
Israel é o líder global em vacinações per capita. Já imunizou com as duas doses da farmacêutica Pfizer aproximadamente 30% de seus 9,2 milhões de habitantes e acredita superar o umbral de proteção de 50% de sua população no final de março. Diante das crescentes pressões internacionais para que assumisse a responsabilidade moral, amparada pelo direito humanitário de guerra, de incluir na campanha de inoculações os 2,5 milhões de habitantes da Cisjordânia e dos dois milhões de Gaza ― que vivem sob ocupação e bloqueio desde 1967 ―, o Governo israelense alegou que a partir dos Acordos de Oslo (1993), a Autoridade Palestina é responsável por seu próprio sistema de saúde. Por fim, cedeu à Saúde palestina 5.000 doses da vacina do laboratório Moderna, das quais só entregou até agora 2.000, e permitiu a passagem das doses da Sputnik V enviadas pelo Governo de Moscou à Faixa de Gaza.
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