Iván Duque se entrega a uma defesa incondicional do ex-presidente Álvaro Uribe
“Fui, sou e serei um crente em sua inocência e em sua venerabilidade”, insiste o mandatário colombiano
Iván Duque confia no político que o levou ao poder na Colômbia, inclusive a despeito das decisões judiciais em contrário. O presidente do país andino insistiu nesta quinta-feira em defender sem matizes o ex-mandatário Álvaro Uribe, sob prisão domiciliar desde terça-feira passada. “Fui, sou e serei um crente em sua inocência e em sua venerabilidade”, afirmou Duque. Não só criticou a medida de prisão preventiva como também atacou as “incoerências” do sistema judicial.
A entrega de Duque à defesa incondicional do atual senador e líder do partido Centro Democrático, a plataforma que o levou à vitória eleitoral de 2018, não foi um rompante ou uma declaração impensada. O presidente colombiano cerrou fileiras com seu antecessor desde o primeiro momento, quando a Corte Suprema de Justiça decretou a prisão domiciliar de Uribe por um caso de suborno de testemunhas que o vincula a grupos paramilitares. Entretanto, dois dias depois dessa decisão, o atual mandatário apresentou uma defesa sem meios termos, criticou o que vê como falhas no funcionamento do Judiciário e defendeu essa postura argumentado que seu dever como governante consiste também em garantir os direitos dos processados.
O dirigente não vê incompatibilidade entre o respeito às instituições e sua liberdade de expressão como cidadão. Assim disse em um encontro telemático com correspondentes estrangeiros por ocasião do segundo aniversário de sua posse, que marca a metade do seu mandato.
“Eu disse que sou respeitoso das instituições, sou fiador e protetor das instituições como presidente da República. Agora, como presidente da República, também sou protetor e fiador dos direitos e particularmente acreditei e continuo acreditando, independentemente da conjuntura, que (...) as medidas de segurança [a prisão preventiva] são, no meu entender, e devem ser, medidas excepcionalíssimas”, justificou, antes de esgrimir a presunção de inocência e que “todo cidadão que tiver que responder à Justiça o possa fazer em liberdade”.
Uribe e Duque sempre mantiveram algumas diferenças, mais de fundo que de forma, e nestes dois anos o atual presidente demonstrou ter um aspecto mais conciliador que seu mentor. Essa posição lhe custou inclusive críticas do setor mais direitista do Centro Democrático. Duque não é uribista, mas necessita dessa corrente política para governar.
Elogios
Entretanto, seus elogios nunca tinham sido tão significativos. “Uma pessoa que ocupou a presidência da República em duas ocasiões, que foi defensor da legalidade, defensor do Estado de direito, que adicionalmente é senador da República, que para poder se mobilizar pelo país deve pedir a permissão da mesa diretora do Congresso, sob pena de perder seu mandato (...),me parece que esses também são argumentos muito poderosos para que possa exercer sua defesa em liberdade”, enfatizou.
Estas considerações têm a ver também, em última instância, com os acordos de paz com a guerrilha FARC alcançados em 2016 por Juan Manuel Santos, um processo que Uribe sempre rechaçou e Duque deve agora aplicar, apesar da sua oposição. Por isso o mandatário trata de apelar à opinião pública do país para tecer uma reflexão que beneficie Uribe. “Devo também convidar o país às reflexões de fundo, e a reflexões sobre o presente e o futuro do país. Então, que uma pessoa que serviu a Colômbia não possa se defender em liberdade, mas que tenhamos criminosos de lesa-humanidade condenados no Congresso e que além disso estão sub judice na Justiça transicional, e que possam, além de responder em liberdade, ter garantido jamais ir para a prisão se, entre aspas, disserem toda a verdade, parece-me que é um grande desequilíbrio”, continuou Duque em referência aos ex-integrantes da extinta guerrilha FARC, agora transformada em partido político e com o direito a 10 assentos no Congresso garantidos pelos acordos.
O presidente falou de Jesús Santrich, ex-dirigente guerrilheiro que se descolou do processo de paz e fugiu. “Acredito que seja importante que eu possa expor essas incoerências para uma reflexão pública, porque essas são reflexões que têm a ver com o presente e o futuro do país”, argumentou. “Fui, sou e serei um crente em sua inocência e em sua venerabilidade”, concluiu ao defender seu direito a falar como qualquer cidadão.
Esse direito é, por si, uma aposta arriscada, já que Uribe está vinculado a várias investigações sobre corrupção, espionagem, paramilitares e as mais de 2.000 execuções extrajudiciais de civis, segundo o Ministério Público, perpetradas por militares durante seus dois mandatos, com as vítimas sendo apresentadas como guerrilheiros mortos em combate.