Tentativa de invasão marítima agrava tensão da Venezuela com os EUA e a oposição

Trump nega envolvimento com a operação e a detenção de dois ex-militares com passaporte norte-americano e experiência nas guerras do Iraque e Afeganistão

Agentes de segurança patrulham a costa de Macuto, em La Guaira (Venezuela), no domingo.Rayner Peña (EFE)

Primeiro foi uma operação com homens armados em La Guaira, o porto que serve a Caracas. O Governo venezuelano informou no domingo sobre a tentativa de “invasão marítima” de uma unidade militar que, segundo a versão oficial, pretendia provocar uma revolta e derrubar o presidente Nicolás Maduro com o suposto apoio dos Estados Unidos e da Colômbia. Pelo menos oito pessoas morreram no confronto com as forças de segurança venezuelanas e no dia seguinte o aparato chavista acabou por desbaratar o plano, capturando pelo menos 11 pessoas, sendo dois cidadãos norte-americanos. Os ingredientes deste novo caso aprofundaram, mais uma vez, a tensão entre Washington e o chavismo.

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As autoridades disseram que se tratava de “mercenários terroristas”. Entretanto, nas horas posteriores detiveram um grupo de militares, incluindo o capitão Adolfo Baduel, filho do general Raúl Baduel —que foi amigo do falecido presidente Hugo Chávez e hoje se encontra na prisão por conspiração—. A suposta vinculação com a incursão armada, batizada de Operação Gedeón, também resultou na prisão de Luke Denman e Aaron Barry. Segundo Maduro, são dois ex-militares com passaporte norte-americano e experiência nas guerras do Iraque e Afeganistão.

O chanceler venezuelano, Jorge Arreaza, falou em “atentado”, enquanto o ministro da Comunicação, Jorge Rodríguez, apresentou como prova nesta terça-feira um áudio em que busca vincular o líder oposicionista Juan Guaidó com a operação e o acusa de ter avalizado um contrato com a empresa de segurança norte-americana Silvercorp. Essas acusações já haviam sido antecipadas há um mês por Clíver Alcalá, ex-general chavista dissidente e radicado na Colômbia, antes de se entregar à DEA (agência antidrogas dos EUA), que o envolve em uma investigação internacional contra o narcotráfico.

“Este novo atentado se soma à escalada de ações agressivas e provocações organizadas pelos Estados Unidos [...]. A República Bolivariana da Venezuela responsabiliza os Governos de Donald Trump e Iván Duque pelas imprevisíveis e perigosas consequências desta onda de provocações e agressões mercenárias”, afirmou a Chancelaria em nota. Trump, entretanto, disse na segunda-feira que sua Administração, a principal protetora da oposição ao regime, não tem nada a ver com essa operação, apesar da suposta confissão dos ex-soldados detidos. O Departamento de Estado vê no incidente “mais uma campanha de desinformação”.

A operação dos órgãos de segurança ocorreu no povoado costeiro de Chuao, Estado de Aragua (norte da Venezuela) e, pouco antes das capturas, o major Juvenal Sequea Torres, da Guarda Nacional, declarou ao canal digital Venezuelanos por la Información (VPI) que as unidades detidas em La Guaira e Chuao eram parte de um contingente de “militares patriotas” em missão e membros de um suposto entorno muito mais amplo de oficiais que querem destituir Maduro.

Nas fileiras opositoras, espalham-se as dúvidas sobre a veracidade da informação oferecida pelo Governo e teme-se que as autoridades aproveitem a situação, que se soma à emergência sanitária pelo coronavírus, para redobrar a repressão. Entretanto, pelo menos dois dos oficiais implicados no complô foram vistos em vídeos que circularam amplamente desde domingo nos grupos de WhatsApp e nas redes sociais anunciando uma rebelião contra a “usurpação política” e a “ditadura”.

Um desses militares, Juvenal Sequea Torres, participou do fracassado protesto de 30 de abril do ano passado, que não conseguiu debilitar o regime e acabou com a libertação do dirigente opositor Leopoldo López, que depois precisou pedir asilo na residência da Embaixada da Espanha em Caracas. A Operação Gedeón é pelo menos a sexta tentativa de derrubar o Governo chavista desde a sua controvertida reeleição, em 30 de maio de 2018, cuja legitimidade não foi reconhecida por grande parte da comunidade internacional e pela oposição. Todos esses movimentos golpistas foram desbaratados com surpreendente facilidade pelo cada vez mais eficaz aparelho de contrainteligência bolivariano. Há três semanas, vários capitães da Guarda Nacional foram detidos em seus postos de comando, acusados de conspiração.

No domingo, Diosdado Cabello, o número dois do regime, e os governadores chavistas dos Estados litorâneos tinham divulgado um alerta “à inteligência social do partido” e aos “patriotas cooperantes” presentes nos povoados do país para que colaborassem com as autoridades caso detectassem alguma circunstância suspeita. A rede de informantes organizada pelo chavismo foi efusivamente felicitada depois de revelada a captura dos líderes da operação.

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