Republicanos e democratas travam combate angustiante nos EUA enquanto a economia trepida
Pacote de ajuda de dois trilhões de dólares é negociado contra o relógio em meio ao avanço da pandemia do novo coronavírus
O plano de resgate econômico dos EUA diante da crise mundial do coronavírus, um pacote sem precedentes que pode chegar a dois trilhões de dólares (10,28 trilhões de reais), continua a ser negociado contra o relógio no Congresso, em um cenário de crescente desmoronamento nos mercados financeiros e na chamada economia real. Republicanos e democratas discordam de vários pontos do programa para conter os estragos da parada econômica autoimposta, já com um em cada três cidadãos dos EUA sob a ordem de ficar em casa. Por volta das duas da tarde (hora local), uma segunda votação de procedimento fracassou por causa da rejeição democrata.
A pandemia está avançando nos Estados Unidos a um ritmo que parece tão imparável como nos outros países mais afetados, China, Itália e Espanha. Com mais de 35.000 infectados, o dobro do fim de semana, e quase 500 mortos, as ordens de confinamento, mais ou menos severas, já foram impostas em uma dezena de Estados, os mais populosos. A cessação da atividade econômica associada à do consumo, da vida, em suma, é tão abrupta, tão incomparável com as recessões anteriores, que o país entrou em pânico pelo desastre econômico que se aproxima.
O líder da minoria democrata no Senado, Chuck Schumer, disse que continuaria as negociações e esperava chegar a um acordo durante esta segunda-feira, deixando claro que a votação dos procedimentos prestes a ocorrer estava fadada ao fracasso, como fracassou a de domingo à noite. O plano requer o apoio de 60 dos 100 senadores, e o resultado ficou em 47-47 por causa da rejeição democrata. Schumer admitiu que o projeto republicano já havia incorporado algumas melhorias propostas pela oposição, mas ainda não oferecia garantias suficientes para a proteção dos empregados das empresas resgatadas. “Os trabalhadores primeiro”, enfatizou, é a filosofia do modelo de resgate que os democratas defendem.
O programa inclui o envio maciço de cheques para um grande número de residências, 1.200 dólares (6.170 reais) por adulto e 500 (2.570 reais) por menor de idade, e ainda 350 bilhões de dólares em garantias para as pequenas e médias empresas para ajudá-las a minimizar demissões. Além da expansão da cobertura de saúde, um dos elementos que mais preocupa os republicanos é a quantia de 500 bilhões de dólares em empréstimos para empresas e Estados, já que deixa sua distribuição em mãos do Departamento do Tesouro, de forma arbitrária e com pouca transparência. Nas palavras da senadora Elizabeth Warren, ex-candidata à presidência e muito crítica dos excessos de Wall Street, essa medida se tornaria, de fato, um “fundo ilegal” para as empresas.
O líder da maioria republicana, Mitch McConnell, se expressou com dureza contra a oposição por seu receio em relação ao programa e a acusou de tentar avançar em suas políticas progressistas usando-o como veículo. “Vocês estão brincando comigo?”, alfinetou durante seu discurso antes da votação. “Os democratas não vão nos permitir injetar recursos em hospitais ou pequenas empresas, a menos que consigam tirar o pó do seu Green New Deal.”
Esta crise brutal mundial desencadeada pelo vírus chegou em um momento de grande polarização política nos Estados Unidos, a bem menos de um ano das eleições presidenciais. O Congresso que esta segunda-feira discute o maior programa de ajuda econômica da história moderna é o mesmo em que há apenas um mês e meio, estava sendo julgado ―e absolvido― o presidente Trump, no terceiro impeachment da história do país. De tudo o que encarnava a vida normal, por mais turbulenta que fosse, parece que se passou uma eternidade.
O acordo entre democratas, que controlam a Câmara dos Representantes, e republicanos, majoritários no Senado, é dado como certo no final, mas esta é uma corrida contra o relógio, no campo da saúde e no financeiro. Nesta segunda-feira, antes da abertura dos mercados, o Federal Reserve anunciou que compraria ativos de forma ilimitada e pelo tempo necessário até que os mercados se estabilizassem. Ou seja, um balcão livre de crédito para que a economia não entre em colapso, mas Wall Street parece imperturbável diante de semelhante anúncio. Com a atividade interrompida, as ações das empresas queimam nas mãos dos investidores e os papéis caem na Bolsa. O bloqueio do plano de resgate e salvamento e o aumento das restrições de movimento pesaram mais no ânimo dos que compram e vendem nas Bolsas.
Ansiedade
A ansiedade causada por essa paralisação era óbvia na mensagem que Donald Trump escreveu em sua conta no Twitter no domingo, por volta da meia-noite. “Não podemos permitir que a cura seja pior que o problema, no final do período de 15 dias, tomaremos uma decisão sobre aonde devemos ir”, escreveu o presidente dos EUA. Uma simples repassada nas últimas previsões dos gabinetes de análise da economia ajuda a entender o medo: o Morgan Stanley vê semelhanças com a Grande Depressão de 80 anos atrás e calculou que no segundo trimestre a economia pode cair 30%, o Goldman Sachs estima em 24% e o JP Morgan chega a parecer otimista ao prever uma contração de 14%.
Enquanto isso, as dificuldades continuam. Um senador do Kentucky, Rand Paul, testou positivo para o coronavírus, e outros que tiveram em contato com Paul, Mitt Romney e Mike Lee, ambos de Utah, estão em quarentena por precaução.
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