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Estudo do MIT não encontra evidência estatística de fraude nas eleições da Bolívia

OEA critica fortemente os questionamentos sobre sua avaliação do processo eleitoral boliviano: “ignora as principais conclusões do relatório de auditoria”

Antonia Laborde
Um dos protestos na Bolívia depois das eleições presidenciais.
Um dos protestos na Bolívia depois das eleições presidenciais.J. Mamani (Getty)
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Um estudo dos especialistas em integridade eleitoral Jack Williams e John Curiel, do MIT Election Data and Science Lab, concluiu que “não há nenhuma evidência estatística de fraude” nas eleições presidenciais de outubro passado na Bolívia, que apontavam o ex-presidente Evo Morales como vencedor. Por causa da pressão dos militares, o líder boliviano abandonou o cargo. Os estudiosos classificaram as conclusões do relatório divulgado pela Organização dos Estados Americanos (OEA) em novembro como “profundamente falhos”, de acordo com um artigo publicado nesta quinta-feira no The Washington Post, e lembram que a Bolívia está se preparando para novas eleições em 3 de maio “após o golpe de Estado apoiado pelo Exército” em 10 de novembro.

A OEA, por sua vez, criticou fortemente o relatório do MIT. Segundo a organização, O artigo de Williams e Curiel “ignora as principais conclusões do relatório de auditoria da OEA”. “Não é honesto, baseado em fatos ou exaustivo. Acima de tudo, não é científico”, acrescenta a declaração da OEA. As descobertas da entidade regional falavam em “manipulação intencional” nas eleições que deram a Morales a vencer. A instituição diz que os acadêmicos ignoram as conclusões de seu relatório relacionadas a mudanças na ata e a falsificação de assinaturas e o fato de que, durante a contagem das votações, o fluxo de dados foi redirecionado para dois servidores ocultos e não controlados pelo pessoal do Supremo Tribunal Eleitoral, o “que tornou possível a manipulação de dados e a suplantação de atas”, observa a carta dirigida aos editores de The Monkey Cage, uma seção do jornal The Washington Post, que publicaram uma análise de Williams e Curiel na quinta-feira.

O documento da entidade regional, que apontava atas queimadas, redirecionamento de votos a servidores ocultos e nomes duplicados, afirmava que, quando a contagem foi retomada após a suspensão do Sistema de Transmissão de Resultados Preliminares (TREP), os dados mostravam uma tendência "altamente improvável” a favor do candidato do Movimento ao Socialismo (MAS). No entanto, a investigação dos especialistas do MIT diz que não parece haver uma diferença “estatisticamente significativa” na margem entre os resultados de antes e depois da interrupção na transmissão.

“Em vez disso, é muito provável que Morales tenha superado a margem de 10 pontos percentuais no primeiro turno”, disseram eles no Post. Segundo a Constituição boliviana, um candidato vence as eleições presidenciais quando obtém a maioria absoluta ou 40% dos votos, desde que com uma vantagem de pelo menos 10 pontos percentuais sobre o segundo candidato. Se não for o caso, é realizado um segundo turno.

A contagem preliminar dos votos parou com cerca de 84% dos votos apurados, quando Morales tinha uma vantagem de 7,87 pontos percentuais, segundo o estudo. Quando a contagem foi retomada, a votação de Morales excedia o segundo candidato mais votado, o ex-presidente Carlos Mesa, em mais de 10 pontos. O relatório da auditoria encomendado pela OEA ―com o consentimento da Bolívia― considerou que “uma irregularidade nessa escala é um fator determinante no resultado” em favor de Morales. Além disso, afirmava que essas “manipulações” e “irregularidades” impediam conhecer com certeza a diferença entre Morales e Mesa. “O que é possível dizer é que houve uma série de operações dolosas destinadas a alterar a vontade expressa nas urnas”, concluía.

“Houve uma descontinuidade entre os votos contados antes e depois da recontagem não oficial? É claro, as descontinuidades podem ser evidências de manipulação”, disseram Williams e Curiel, mas, com base somente na “evidência das estatísticas” eles não encontraram as “anomalias” que a OEA registra na tendência dos eleitores. No estudo, encomendado pelo Centro de Pesquisa Econômica e Política (CEPR), eles constataram uma correlação de 0,946 entre a diferença de Morales entre os resultados de antes e depois da suspensão da contagem dos votos. Essa correlação desacredita o relatório da OEA, que assinalava que os últimos 5% dos votos apresentavam uma tendência diferente dos 95% anteriores. "A análise estatística realizada revelava que a vitória no primeiro turno de Evo Morales era estatisticamente improvável".

Quando se revelou o resultado com 95% das atas apuradas, a OEA fez uma declaração em que expressava sua preocupação com “a mudança de tendência”. Depois que todos os votos foram contados, o resultado deu a Morales uma vantagem de 10,6% sobre o Mesa. Os protestos nas ruas, a sombra das irregularidades e as pressões das Forças Armadas forçaram o presidente boliviano a deixar o cargo. O líder boliviano divulgou nesta quinta-feira o artigo do Post afirmando que a OEA, seu presidente, Luis Almagro, e a comissão responsável pela auditoria dos resultados das eleições “devem muitas explicações ao povo boliviano e ao mundo inteiro”. Almagro havia dito que “o único golpe de Estado na Bolívia” aconteceu quando Morales “cometeu fraude eleitoral”.

O relatório de auditoria da OEA afirma que a “análise estatística” dos resultados é apenas um dos fatores que eles consideraram em suas constatações. O documento da agência dá conta de que os resultados preliminares e o cálculo final foram “viciados”; identificou um padrão de manipulações e falsificações dos registros eleitorais; uma cadeia de segurança deficiente; e atas não confiáveis. “É um desafio à razão que alguém pegue uma dessas provas, supostamente a questione, ignore todas as outras e declare com orgulho que "não há motivo para suspeitar de fraude”, diz a entidade regional.

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