Abusos, drogas e supremacismo branco: o grande problema de Tom Hanks se chama Chet e é seu filho
Chester Hanks há uma década é notícia por seus problemas com as drogas, acusações de abuso e, agora, também por divulgar seu novo disco de rap com uma campanha que alude à iconografia de extrema direita. O pai de família da América ideal acabou tendo um filho que se parece muito com a realidade dos EUA
Tom Hanks é, aos 64 anos, muito mais que um astro do cinema. Sua projeção como figura pública transcende a sua condição de ator: Hanks é um ícone atemporal, intergeracional, uma espécie de pai de família da América com as têmporas grisalhas. “Não importa o que acontecer, estou orgulhoso de vocês”, disse aos espectadores do Saturday Night Live, com tom quase institucional, poucos dias antes de Trump ser eleito presidente, em 2016. O astro cumpre com mestria seu papel de oráculo social imune a polêmicas e alérgico à excentricidade, espelho do norte-americano médio, com seu gosto pelos papéis de homens exemplares, heróis de bondade unidimensional e princípios indiscutíveis: de Walt Disney (Ao encontro de Mr. Banks) a Fred Rogers (Um amigo extraordinário), passando pelo jornalista Ben Bradlee (The Post) e o Capitão Phillips do filme homônimo.
Independentemente do sobrenome e da profissão, Chester Hanks tem poucas coisas em comum com seu pai. Aos 30 anos, o terceiro dos quatro filhos do ator não seguiu o irrepreensível exemplo de seus irmãos Colin (um ator respeitado), Elizabeth (escritora) e o caçula Truman (que vai trilhando seu caminho no cinema como operador de câmera). Apesar das aparições em séries recentes como Your Honor e Empire, Chester, conhecido como Chet Haze na cena rapper, aparece mais em veículos sensacionalistas como o TMZ do que nas páginas da Variety, um meio de referência para a indústria. E nos últimos meses o seu longo prontuário de polêmicas cresceu vertiginosamente.
A revista People revelou que a última ex-namorada de Chester Hanks, Kiana Parker, abriu uma ação judicial contra ele acusando-o de maltrato físico e verbal, além de solicitar uma ordem de afastamento, que foi aceita. Segundo a moça, a recente deterioração no relacionamento afetivo deles evoluiu para um padrão de violência machista. “Ameaçou-a com uma pistola em diferentes ocasiões, atirou objetos contra ela e proferiu diversos insultos racistas”, afirma a denúncia apresentada. Esta surge poucas semanas depois de o ator acusar formalmente Parker de agressão e roubo, vazando na internet um vídeo de Hanks com o rosto ensanguentado por causa, segundo ele, de um corte a faca feito por ela.
Enquanto as acusações se acumulavam, Hanks aproveitava a atenção da mídia para divulgar as primeiras imagens de seu novo trabalho como rapper, White Boy Summer (“verão do menino branco”). Ostentando um corpo tonificado e tatuado, Hanks aparece cercado de garotas rebolando de biquíni, enquanto ele despeja uma bebida alcoólica sobre suas nádegas. Mas a maior polêmica gerada por seu lançamento foi o merchandising que o acompanha, com camisetas, moletons ou shorts com mensagens escritas em tipografia gótica, a mesma habitualmente adotada pelos grupos do supremacismo branco e similar à que aparece na capa do livro Minha luta, de Adolf Hitler.
“Este merchandising parece agressivamente racista”, apontou um usuário do Twitter num comentário que já acumula mais de 160.000 curtidas. O artista defendeu-se alegando que em breve lançará uma coleção com o slogan Black Queen Summer (“verão da rainha negra”). Também manifestou diversas vezes seu apoio ao movimento Black Lives Matter e a Joe Biden, de cuja cerimônia de posse Tom Hanks participou. “Depois de ter Donald Trump incentivando os supremacistas por quatro anos, não sei se é o momento de homenagear o verão do homem branco”, escrevia, cética, a colunista Arwa Mahdawi no The Guardian, mostrando-se aturdida depois que Hanks pediu a seus fãs homens que “evoluam de Pikachu para Raichu”.
As suspeitas em relação à ideologia de Chet não são novas. Já em 2015 ele se recusou a parar de usar o termo nigga, um insulto que os brancos dirigiam aos negros na época da escravidão, hoje coloquial no âmbito do hip hop, mas que continua soando muito pejorativo quando pronunciado por um caucasiano. Em um episódio mais recente, em janeiro de 2020 —por acaso, a última vez em que foi visto em público com seus pais—, o músico esteve a ponto de estragar a grande noite de seu pai. Enquanto a indústria hollywoodiana celebrava a carreira de Tom Hanks entregando-lhe o prêmio Cecil B. DeMille na cerimônia do Globo de Ouro, Chet publicava um vídeo nas redes sociais em que compartilhava sua animação no tapete vermelho imitando o sotaque jamaicano, uma paródia viral que foi amplamente criticada pela imprensa e por usuários do Twitter.
O filho de Tom Hanks e Rita Wilson ganhou fama em 2014, quando se internou numa clínica de reabilitação após tornar público que é dependente de drogas e luta contra o vício desde os 16 anos. Formado em arte dramática pela universidade Northwestern, sua internação coincidiu com sua participação na adaptação cinematográfica da HQ Quarteto fantástico, da Marvel, que parecia ser seu trampolim para o estrelato. Em um comentário no Instagram, Chet culpou o contexto familiar por sua íntima relação com os estupefacientes: “Descobrir quem sou foi uma viagem, por culpa de todas as pressões com as quais precisei lutar na minha vida. Vocês sabem, por ser filho de meu pai e tudo isso”. Apenas seis meses depois, o jornal britânico Daily Mirror noticiou a ordem de busca e captura que a polícia daquele país tinha emitido contra ele por vandalizar um quarto de hotel em Londres. Em dezembro de 2016, Chet anunciou que tinha tido uma filha, chamada Michaiah, fruto de um relacionamento já encerrado. O nascimento da menina, segundo ele, representava um divisor de águas. “Ela é a razão pela qual dei a volta em toda minha vida e pela qual me mantenho sóbrio”, disse na época.
O protagonista de filmes como Forrest Gump não só evita se pronunciar na mídia sobre as inúmeras polêmicas envolvendo seu filho como também tenta mantê-lo sob controle, ao menos, no aspecto profissional. Além de conseguir para ele uma ponta em Larry Crowne, a comédia que protagonizou junto a Julia Roberts, no ano passado compartilhou set com o rapaz em Missão Greyhound, um thriller naval ambientando na II Guerra Mundial, produzido, escrito e protagonizado pelo ator, e no qual fez valer seu status para exercer um nepotismo que ele mesmo admitiu em sua entrevista ao programa Late Night, de Stephen Colbert. “Foi muito divertido trabalhar com ele porque é um ator incrivelmente bom. Um dos prazeres de ter certa influência e de ser a estrela do filme é poder pedir que certas pessoas apareçam nele”, revelou Hanks, que não conseguia dissimular seu encantamento ao falar, desta vez por questões estritamente artísticas, do seu filho na televisão. Conhecido como “o pai da América”, ele é, acima e apesar de tudo, o pai de Chester Hanks.