O adeus a Sérgio Sant’Anna, grande contista brasileiro, mais uma vítima da covid-19

Um dos principais nomes da literatura brasileira contemporânea, o escritor carioca morreu aos 78 anos, em decorrência do coronavírus, depois de passar uma semana internado

O escritor brasileiro Sérgio Sant'Anna.Reprodução/Redes sociais
São Paulo -

Um dos principais contistas brasileiros, Sérgio Sant’Anna morreu neste domingo aos 78 anos, vítima do novo coronavírus, segundo divulgado pela irmã do autor, a também escritora Sonia Sant’Anna. O escritor estava internado Quinta D’Or, em São Cristovão, Zona Norte do Rio de Janeiro, havia uma semana.

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Nascido no Rio de Janeiro em 1941, Sant’Anna, considerado por muitos dos seus pares como o pós-modernista mais importante da literatura brasileira, completara 50 anos de carreira em outubro do ano passado. O escritor foi vencedor de diversos prêmios, incluindo o Jabuti por O concerto de João Gilberto no Rio de Janeiro (1986), pela novela Amazona (1986) e o romance Um crime delicado (1997), que foi adaptado para o cinema por Beto Brant em 2005.

Sant’Anna escreveu mais de 20 livros. Com os contos deu voz a uma geração, tornando-se um dos contistas mais respeitados do Brasil. Publicou primeiro deles, O sobrevivente (1969), foi publicado de forma independente, com dinheiro emprestado do pai —que ele nunca pagou de volta—, e teve sucesso imediato.

Antes de lançar seu primeiro conto, o escritor, que tinha uma bolsa de pós-graduação em ciências políticas em Paris, participou das passeatas de Maio de 1968 e da Primavera de Praga. Depois, passou oito meses em um programa de formação de autores nos Estados Unidos, e publicou mais três livros nos anos 1970: a coletânea de contos Notas de Manfredo Rangel, repórter (1973) e os romances Confissões de Ralfo (1975) —considerada sua obra prima, em que um escritor decide compor uma autobiografia imaginária com episódios inverossímeis— e Simulacros (1977).

Sua obra, tipicamente carioca (apesar de ele ter uma “experiência mineira", por ter vivido 12 anos em Belo Horizonte), é reconhecida por voltar-se para os conflitos íntimos dos seus vários personagens, colocando-os em confronto com a sociedade e mantendo a coerência com um universo popular. Pode-se dizer que sua obra era profundamente experimental, mas na qual não faltava humor. E a idade avançada não impediu-lhe de continuar produzindo. Seu último livro publicado em vida, Anjo Noturno, foi lançado em 2017 e venceu o prêmio da APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte). Na obra, ao longo de nove narrativas, Sant’Anna desfia sua prosa transgressora ao se debruçar sobre a nostalgia, a morte, o desejo carnal, o amor e a solidão.

A literatura de Sant’Anna foi prestigiada também no cinema. O conto que dá título à coletânea A senhorita Simpson (1989) virou o longa Bossa nova, de Bruno Barreto. Já a peça Um romance de geração deu origem a um filme dirigido por David França Mendes em 2008.

O escritor nunca abandonou os contos, mesmo quando o gênero começou a ser desvalorizado no Brasil, ao longo dos anos. “A fidelidade é porque comecei (minha carreira) no conto. Fui adquirindo o formato. Sempre penso em função de um término. Não tenho vontade de espichar. É minha vocação”, disse em entrevista a O Globo, em 2016.

Viu no futebol um recorte para falar sobre o Brasil. Suas obras literárias que discorriam sobre o esporte também cultivaram fãs pelo país, entre eles o escritor e colunista do EL PAÍS Xico Sá. "Tricolor das Laranjeiras, Sérgio Sant’Anna escreveu a melhor ficção brasileira no universo do futebol. Leia os contos O Último minuto e Na boca do túnel, além da obra-prima Páginas sem glória” Lá se foi o artista do conto brasileiro, como em um voo na madrugada, vítima de coronavírus”, escreveu, em seu Twitter.

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