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Assim funciona o cérebro da criança e do adolescente

O psicólogo Rafa Guerrero publica ‘O cérebro infantil e adolescente – chaves e segredos da neuroeducação’, que tem como objetivo explicar as funções cerebrais de uma forma pedagógica, útil e simples

Crianças brincam na sacada em Madri.
Crianças brincam na sacada em Madri.Federica Balducci
Carolina García

Existem quatro cérebros: o vermelho, o verde, o azul e o amarelo. Esta é a metáfora que o psicólogo infantil e doutor em Educação Rafa Guerrero usa no seu livro El cerebro infantil y adolescente: claves y secretos de neuroeducación (inédito no Brasil), que tem como objetivo explicar a todos os públicos – adultos ou não – as funções cerebrais destas quatro aéreas de uma forma pedagógica, útil e simples: “O cérebro funciona como um todo, está interconectado, e o objetivo que temos como pais, mães, professores e terapeutas é colar, unir essas quatro zonas. Para tornar isso bem simples, decidi diferenciá-los por cores”, diz Guerrero.

“Primeiro falo da cor vermelha, que representaria a parte mais primitiva, mais intuitiva e voltada para a sobrevivência; este cérebro não sente emoções, não pensa, não coordena, não executa, só lhe interessa estar bem alimentado, estar descansado – ele é muito básico, e todos os animais o compartilhamos”, prossegue o especialista. Depois a coisa vai se complicando. “Depois viria o cérebro verde. É um cérebro emocional, onde se codificam os vínculos, a sociabilidade, a amabilidade, o apego e conceitos muito básicos, como a memória e a aprendizagem”, prossegue Guerrero. Em resumo, o verde é a gaveta das emoções. Estes dois cérebros, anatomicamente falando, formam o subcórtex – cérebros automáticos e voltados para a sobrevivência.

A importância dos cérebros azul e amarelo

Os cérebros azul e amarelo se encontram no neocórtex, que é a parte mais externa do cérebro. Os dois terços posteriores seriam o azul, “onde armazenamos informações, nossa memória de longo prazo, todas as nossas lembranças, nossos conhecimentos, a linguagem, tudo o que fomos aprendendo, os valores que nossos pais nos deram, todo o conhecimento que adquirimos na escola… Poderíamos chamá-lo de nossa biblioteca gigante”, afirma Guerrero.

“O terço restante seria o amarelo, e é o mais importante, porque é o que se encarrega de dirigir a orquestra, coordena todos os outros cérebros. Por exemplo, é tão importante sobreviver quando um carro vai te atropelar como poder expressar uma emoção quando estou zangado porque não gosto de alguma coisa, ou poder pensar e acessar a informação quando estou fazendo uma prova – e também poder coordenar tudo isso. Ele é o CEO da empresa, está lá, no córtex frontal, e é o amarelo, o executivo”, propõe o especialista. “E é também o cérebro mais influenciável para o bem e para o mau, o mais influenciável pelos meios de comunicação, pelos pais e pelos amigos”, acrescenta. “Por exemplo, um pai, por melhor intenção que tenha, mesmo se quiser mobilizar o cérebro vermelho, só conseguirá se o puser em risco – é o caso de quem comete maus-tratos e abusos –, mas recordemos que não é um cérebro que precise ser treinado, pois é inato”, salienta o psicólogo. “O amarelo é o cérebro mais maleável, mais influenciável.”

Segundo o especialista, é preciso dedicar muito carinho e paciência ao amarelo, para que seja saudável. Devemos cuidar dele com muito cuidado, reitera, com muito olhar incondicional, e estar muito presentes, conectando-nos com nossas crianças. “Todos os cérebros estão interconectados mas, ao final o que estrutura, e o que está consciente do que estamos fazendo de muito bem ou muito mal, é o amarelo. É o que dá consciência à ação, o que se concentra, o que regula a inteligência emocional, por exemplo. Está nesta parte.”

Rafa Guerrero lança ‘O cérebro infantil e adolescente’, que tem como objetivo explicar as funções cerebrais de uma forma pedagógica, útil e simples.
Rafa Guerrero lança ‘O cérebro infantil e adolescente’, que tem como objetivo explicar as funções cerebrais de uma forma pedagógica, útil e simples. ANA ENCABO

O bom e o ruim do cérebro das crianças é que ele é muito maleável e influenciável: “Uma boa criação é conseguir que nosso filho se relacione bem, que tenha empatia, pensamento crítico, capacidade de autonomia, que seja capaz de proteger os seus e um longo etcétera”, afirma. O que seria então uma mãe ou um pai saudável? Segundo o especialista, deve ter “presença física, capacidade de conectar com seus filhos e ser empático, saber o que ele precisa e, em último lugar, responder às suas necessidades”. Resumindo: “É uma maneira muito simples de explicar, mas acho que assim se entenderá. Se eu estiver sempre presente, começamos bem. Se, em segundo lugar, eu me conecto com você e sou capaz de me colocar na sua cabeça, me colocar no seu coração, e sou capaz de sincronizar com você, estou em posição de passar à terceira fase, que é a responsiva”, acrescenta. “Desta maneira, se seu joelho doer, cuido do seu joelho. Se você tiver fome, cuido da sua fome.”

O exemplo deste processo é a gestão da frustração: “A primeira coisa que você deve saber como pai ou mãe é o que ocorre num cérebro quando ele se frustra, seja o do seu filho, o seu ou do seu cônjuge”. “Eu faria duas coisas, para dizer de forma gráfica: primeiro me conecto com você, isto é, entendo que você está bravo, depois legitimo suas emoções. A seguinte fase seria redirecionar… Por exemplo, meu filho está se divertindo num parque, mas temos que voltar para casa. Entendo que se irrite, mas explico a ele que amanhã tem escola, que ele precisa tomar banho e jantar, e depois de raciocinar terminamos voltando – é o que é preciso fazer, mas isto não significa que seu filho não continuará irritado. Obviamente, não vai sair dele: ‘Sim, papai, acho que precisamos subir porque temos que jantar e ir dormir’. Mas eu o ouvi, entendi seus sentimentos e lhe expliquei.”

Peculiaridades do cérebro adolescente

“Gosto de usar uma metáfora que serve para entender como é o cérebro adolescente”, prossegue o especialista. “Ele é como um celular ao qual chegou uma notificação de que deve ser atualizado. No momento em que você dá OK, o telefone para de funcionar. A boa notícia é que, quando recuperar o seu celular, ele estará muito melhor e mais operacional, muito mais adaptado, e você vai encontrar funções que antes não tinha”. Na comparação, é o mesmo que acontece com o adolescente, que não é uma criança, mas tampouco um adulto, e assim vive num impasse: “O tsunami emocional da adolescência é muito complexo. Normalmente os pais e mães sofrem, porque a estrutura do cérebro que mais é atualizada é a superior, é o córtex, ou seja, o cérebro azul e o amarelo, o humano. O que provoca que funcionem só as partes vermelhas e verdes do cérebro: o instinto e as emoções”.

Os pais e mães podem fazer algo na infância para não terem surpresas nesta etapa? “O bom do cérebro é que ele é acumulativo, todo investimento que fizermos em todos os níveis [social, operacional, executivo], mais tarde serão fatores de proteção, e tudo o que não fizermos nos primeiros anos de vida serão fatores de risco”, diz Guerrero.

Por que é básico que os pais e mães conheçam o desenvolvimento e as partes do cérebro? Segundo Guerrero, todo mundo deveria ter noções básicas de como funciona o cérebro: “E, cuidado, isto não implica que você tenha que se matricular numa faculdade de Medicina. Acho que dedicando duas horas da nossa vida a ter noções básicas, e poder aplicá-las no dia a dia, é suficiente”.

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