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Toby Ord. “A probabilidade de não sobrevivermos no próximo século é de uma em seis”

Filósofo australiano, pesquisador do Instituto do Futuro da Humanidade da Universidade de Oxford, estuda os riscos existenciais para a nossa espécie

Toby Ord em uma imagem de arquivo de 2019.
Toby Ord em uma imagem de arquivo de 2019.David Fisher

O filósofo Toby Ord (Austrália, 1979) teme a extinção precipitada da humanidade. Acredita que a destruição da nossa civilização e do nosso potencial poderia acontecer neste século se não a evitarmos. Ele é um dos pesquisadores que trabalham no Instituto do Futuro da Humanidade (IFH), um centro de pesquisas da Universidade de Oxford fundado para dar respostas às grandes questões sobre o futuro da nossa espécie, que está em uma encruzilhada desde a detonação da primeira bomba atômica no deserto do Novo México, segundo Ord. Em seu último livro, The Precipice (O Precipício, 2020), explora essas grandes questões. O filósofo respondeu às perguntas por videoconferência.

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Pergunta. Você poderia descrever em que consiste o seu trabalho no Instituto do Futuro da Humanidade?

Resposta. Estudo tudo o que considero crucial para o futuro da nossa espécie. Muito do meu trabalho se centra no Risco Existencial, tentando entender as ameaças que nos espreitam. Também publiquei um estudo sobre a cosmologia do universo em grande escala, tentando descobrir o quão longe podemos ver desde a Terra —46 bilhões de anos-luz— e até onde os seres humanos poderiam chegar a ter um impacto. Descobrimos que a maior parte do universo não poderia ser afetada por nossas ações. Mesmo assim, existe uma esfera de cerca de 17 bilhões de anos-luz de raio que é suscetível de ser afetada pelas ações humanas. Penso nos riscos, bem como na extensão do nosso futuro em termos de tempo e capacidade de influência.

P. Menciona nossa capacidade de influência no universo. Qual acredita que seria o significado da possível extinção da raça humana em termos de relevância cósmica?

R. Tudo depende da particularidade da nossa espécie. Se existem civilizações como a nossa, nosso desaparecimento talvez não tenha muito significado em nível cósmico. Carl Sagan falou sobre isso, disse que talvez sejamos a forma que o universo tem de se entender e se conhecer, então se a Terra fosse o único planeta onde existe vida inteligente, é provável que sua expansão por uma galáxia majoritariamente estéril seja o nosso destino. Isso poderia dotar a nossa espécie do dever de proteger e expandir a vida, mas acima de tudo significaria que a Terra é o único lugar no universo onde existem conceitos como a ética e agentes morais (nós). Se assim for, somente por meio dos seres humanos um universo mais justo pode ser concebido e nossa extinção implicaria no desaparecimento dessa força positiva. É possível que o nosso planeta seja um dos lugares mais estranhos e frágeis do universo.

P. Em seu livro você descreve um novo período na nossa história e o chamou de Precipício. Por quê?

R. Estamos em um ponto em que caminhamos por uma trilha estreita à beira de um precipício e não sabemos se sairemos vivos —nem quais são as possibilidades de cair— mas sabemos que este é o período mais perigoso a que nos expusemos. Esta etapa da nossa história começou em 1945, com a criação das armas nucleares: nosso potencial de autodestruição ultrapassou em muito o de qualquer uma das ameaças naturais que já tínhamos enfrentado.

P. Portanto, este é o momento mais importante da nossa história.

R. Se sobrevivermos à nossa passagem pelo Precipício, as gerações futuras verão este período como o mais importante para nossa espécie, o momento em que o futuro estava em jogo. Posso estar equivocado e talvez nos encontremos diante de um precipício maior no futuro. Uma das razões pelas quais penso que é o mais importante é porque você só pode se expor a esse tipo de risco um número limitado de vezes.

P. Existem dois tipos de riscos existenciais: os naturais e os antropogênicos. Quais o preocupam mais?

R. A humanidade sempre foi vulnerável a algum tipo de risco ou catástrofe, como o asteroide que acabou com os dinossauros. Aconteceu há 65 milhões de anos, o que indica que não acontece com muita frequência; além disso, todos os asteroides que encontramos não estão em rota de colisão com a Terra. A possibilidade de nos extinguirmos em um século qualquer é de uma em 1.000; se não fosse assim, não teríamos sobrevivido todo esse tempo. Mesmo assim, existem novos riscos de origem humana —estou especialmente preocupado com as pandemias criadas em laboratórios, a guerra biológica e a inteligência artificial— que são os mais urgentes, pois convivemos com eles há cerca de 75 anos e não temos referências que nos permitam entender como podem se desenvolver.

P. A única forma de evitar os riscos seria nos tornarmos uma espécie interplanetária?

R. Carl Sagan falou sobre isso também. É uma coincidência que o momento em que a humanidade enfrenta essas ameaças aconteça justamente quando podemos viajar para outros planetas. Elon Musk sugeriu que é isso que motiva a SpaceX. Acredito que sem dúvida seria útil para lidar com o Risco Existencial e se evitariam alguns como os supervulcões e os asteroides, mas existem outros riscos, como a ameaça dos totalitarismos e das pandemias, que também podem ocorrer em outros planetas. Se nos tornarmos uma espécie interplanetária, metade dos riscos pode desaparecer e poderíamos dobrar as chances de sobreviver, mas a chave não está em chegar a outros planetas, mas em enfrentar os riscos e tomar medidas adequadas aqui e agora.

P. Colocamos tanta ênfase na detecção de todos os asteroides nas proximidades da Terra porque existe um precedente.

R. Sim, temos sorte de poder vê-los. Se a Terra tivesse recebido o impacto de um asteroide de mais de 10 quilômetros de diâmetro nos últimos 100 ou 1.000 anos, não estaríamos aqui para observá-lo, o que é bastante tranquilizador.

P. Estamos no final de uma pandemia mundial, você acredita que a humanidade sobreviverá nos próximos 100 anos?

R. Sim, acredito. Em meu livro explico que a probabilidade de a espécie humana não sobreviver nos próximos 100 anos é de uma em seis; o lado positivo é que a probabilidade de sobreviver é muito maior: cinco em seis. O choque no caso de não fazê-lo seria enorme.

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