Brasil abandona maciçamente Bolsonaro em seu negacionismo da vacina

Segundo uma pesquisa atual da revista ‘Nature’, o Brasil aparece com um esmagador índice 83,4% a favor da vacina, seja qual for. E 75%, de acordo com o Datafolha de junho, apoiam os valores da democracia

Bolsonaro conversa com apoiadores em julho de 2020.Eraldo Peres (AP)

Visto do exterior pode parecer que o Brasil se converteu ao bolsonarismo-raiz, o de sua política extrema de negacionismo e se deixou arrastar a uma aventura fatal. Os números, entretanto, que às vezes são mais eloquentes do que as palavras, indicam que os brasileiros começam a repudiar o “mito” de extrema direita Jair Bolsonaro. Segundo uma pesquisa atual da revista científica Nature, realizada em todo o mundo, o Brasil aparece com um índice esmagador 83,4% ...

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Visto do exterior pode parecer que o Brasil se converteu ao bolsonarismo-raiz, o de sua política extrema de negacionismo e se deixou arrastar a uma aventura fatal. Os números, entretanto, que às vezes são mais eloquentes do que as palavras, indicam que os brasileiros começam a repudiar o “mito” de extrema direita Jair Bolsonaro. Segundo uma pesquisa atual da revista científica Nature, realizada em todo o mundo, o Brasil aparece com um índice esmagador 83,4% a favor da vacina, seja qual for, sem distinção de países onde for produzida. E 75%, de acordo com o Datafolha de junho, apoiam os valores da democracia, enquanto somente 10% aparecem saudosos da ditadura militar.

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Esses números são importantes pois demostram, contra todas as fake news das redes impulsionadas pelos gabinetes do ódio do bolsonarismo, que o Brasil não se entregou à política louca e negacionista, saudosa da tortura e da ditadura de seu chefe de Estado.

Junto ao não a Bolsonaro e a sua política negacionista sobre a vacina, as notícias que começam a aparecer nas pesquisas sobre as eleições municipais revelam uma derrota do bolsonarismo. Nenhum dos candidatos bolsonaristas e que se apoiaram em Bolsonaro nas grandes capitais do país —como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador e Recife― aparece com possibilidades de ganhar as eleições.

É verdade que as eleições municipais são diferentes das presidenciais porque se centram em questões locais, mas neste momento podem ter um valor extra. É, de fato, a primeira vez que ocorrem eleições após a vitória de Bolsonaro em 2018. Uma derrota dos candidatos ligados a ele e à extrema direita seria um sinal de que o bolsonarismo começa a desmoronar e de que as pessoas começam a repudiá-lo. Seria um mau augúrio para as presidenciais.

Existe o Brasil que colocou no poder um capitão expulso do Exército porque lhe prometia renovar os vícios da velha política e acabar com a violência e a corrupção. Mas isso é passado. O Governo de extrema direita demonstrou que seu presidente continua nutrindo suas alucinações de violência e de negação da realidade de braços dados com Trump. E as mesmas pessoas que votaram nele começam a se cansar.

Tudo começou com aquele “e daí?” com que respondeu a um jornalista quando os números de vítimas da pandemia começaram a crescer. Foi como um soco em tantos que haviam lhe dado o voto. Foi aí que muitos brasileiros passaram a entender que a nova política anunciada pelo regime de extrema direita iniciava a revelação de sua verdadeira identidade e abandonaram o novo “mito”.

É verdade que o Brasil estava cansado dos políticos tradicionais, tantos deles envolvidos com a corrupção mesmo durante a pandemia, e que apostaram nas urnas por uma renovação que está se revelando a cada dia como farsa e traição do melhor que tem este país, que é o repúdio pela guerra.

A queda dos que estão abandonando o líder de extrema direita teve início na verdade com a postura criminosa mostrada por Bolsonaro desde o começo de uma pandemia que já causou 155.000 vítimas, outras tantas tragédias familiares e dor acumulada.

Muitos analistas políticos acreditaram neste momento que a pandemia poderia derrotar o mito bolsonarista.

Foi uma ofensa grave aos brasileiros, preocupados com a pandemia como em todo o mundo, quando Bolsonaro primeiro negou a gravidade da crise e depois ofereceu como cura produtos sem o aval da ciência médica. E, principalmente, quando começou a dar a entender que os que morriam eram somente idosos e com doenças graves, como se eles não fossem pessoas com a mesma dignidade que os outros —enquanto os “atletas” como ele sairiam imunes da tragédia. Para ele, naquele momento os que importavam que continuassem vivendo eram os da força de trabalho. Sua preocupação maior não foi a de salvar vidas, e sim a de assegurar a economia, cujo desmonte colocaria em crise suas pretensões de ser reeleito em 2022. Um sarcasmo que lembra os tempos trágicos do nazismo, quando só a raça ariana pura e os fortes importavam. Todo o resto poderia ser sacrificado.

Muitos brasileiros parecem ter se cansado de uma política destrutiva baseada no medo e na negação da evidência. E começam a estar preocupados com essa política de morte que não bate com seu amor pela vida.

Esse não maciço que os brasileiros deram à despreocupação, quando não à negação, da tragédia do coronavírus por parte de Bolsonaro e de suas hostes mais fanáticas é sinal de que o país começa a abandonar um tipo de política que hoje cresce no mundo de desprezo pela realidade e busca da negatividade em uma corrida de morte e de autoritarismo racial que parecia ter desaparecido com a aposta do Ocidente pelos valores da democracia e da liberdade.

O Brasil, com esse início de abandono da aventura bolsonarista, significa um momento de esperança. Aparece como uma vacina moral contra o vírus de uma política de desprezo dos valores da democracia e da liberdade que o estavam envenenando.

Com seus desatinos cotidianos, com sua negação da realidade e sua política contra a riqueza cultural do país, Bolsonaro não parece ser brasileiro. Quem sabe se a próxima aposta nas urnas para eleger um novo presidente não ofereça ao mundo uma surpresa que recoloque o Brasil no lugar que merece e o enxerte na caravana dos milhões de pessoas que continuam apostando pelos valores, que respeitam a vida de todos e não se divertem com esses jogos de morte e de negação da realidade.

O não que parece ser cada dia maior à política suicida de Bolsonaro é uma janela aberta à esperança de que a maioria da sociedade começa a perceber o perigo que significa não só a pandemia como o vírus político, com o qual Bolsonaro está infectando os brasileiros.

A nota mais triste é que os ainda mais fiéis ao bolsonarismo são a massa das igrejas evangélicas politizadas em franca traição ao espírito cristão que predica os valores da paz e da liberdade e a defesa dos mais fracos e esquecidos pelo poder. Elas parecem ter esquecido o ensino do Evangelho que afirma: “Não podeis estar ao serviço de Deus e do dinheiro” (Mt. 6,24).

O bolsonarismo, que tem como lema “Deus acima de tudo”, parece hoje uma caricatura do melhor que tem o cristianismo, que é o amor universal, a defesa da vida e a condenação de todos os racismos.

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