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A senadora Jeanine Áñez assume a presidência da Bolívia sem quórum no Parlamento

A segunda vice-presidenta do Senado recebe apoio dos partidos da oposição enquanto dois terços da Câmara, fiéis a Evo Morales, rejeitam a sucessão. Brasil reconhece nova presidenta

Francesco Manetto
Santa Cruz de la Sierra -
Jeanine Añez
Jeanine Añez, senadora e líder da oposição, em uma coletiva depois da saída de Morales do país.MARCO BELLO
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A Bolívia tem desde a noite desta terça-feira, pelo menos no papel, um novo presidente após a renúncia de Evo Morales. É a segunda vice-presidenta do Senado, a opositora Jeanine Áñez. Sucedeu de forma provisória ao ex-presidente, mas a transição foi aprovada apenas por um terço do Parlamento, o órgão responsável pela formalização da transferência. A senadora assumiu o cargo sem quórum após uma avalanche de demissões entre os sucessores previstos pela Constituição. O Movimento ao Socialismo (MAS), o ex-partido do governo e maioria na Câmara e no Senado, não participou da votação num gesto de rejeição.

O chanceler Ernesto Araújo, já anunciou que o Brasil reconhece Áñez como presidenta interina. "Essa é a nossa percepção, de que a Constituição boliviana está sendo seguida", disse o chanceler brasileiro, destacando o compromisso da senadora de convocar eleições. "Então nossa primeira percepção é que está sendo cumprido o rito constitucional boliviano, e queremos que isso contribua para pacificação e a normalização no país", disse Araújo.

Já o ex-presidente boliviano aplaudiu a decisão de sua bancada e, do México, onde chegara algumas horas antes, atacou seus adversários. “Parabenizo nossas irmãs e irmãos da assembleia do MAS-IPSP por agirem com unidade e dignidade para rejeitar qualquer manipulação do direito racista, de golpe e de vender a pátria. Continuamos unidos na defesa da democracia, do Estado de Direito, da vida e do país ”, escreveu ele no Twitter.

Morales pediu asilo a Andrés Manuel López Obrador, deixou a Bolívia e, após sua renúncia, também renunciou o vice-presidente Álvaro García Linera, presidente do Senado, os primeiros vice-presidentes e o chefe da Câmara dos Deputados. No entanto, era lá, no ramo legislativo, onde estava a solução que deveria levar, segundo a Constituição, à convocação urgente de novas eleições. Nesse processo, os representantes do MAS que finalmente questionaram a legitimidade do voto seriam decisivos.

A Câmara discursou sobre a transição com o nome de Añez na mesa. A senadora foi eleita nas fileiras da oposição e foi responsável por tecer o consenso necessário para o desbloqueio, mas não obteve êxito, o que agora gera um cenário muito incerto e aprofunda o choque de forças. Ela jogou algumas mensagens que colidiram entre si. Por um lado, garantiu que os parlamentares do MAS haviam se comprometido a participar da sessão e estava convencida de que a votação teria o quórum. Por outro lado, lançou uma acusação genérica e denunciou uma tentativa de bloquear a sessão. "Sabemos e infelizmente eles querem boicotar as sessões já convocadas", afirmou. Durante seu discurso, ela prometeu "convocar novas eleições o mais rápido possível" com instituições independentes.

A senadora fez um chamado pela governabilidade e pediu para que o paiía deixe o bloqueio. No entanto, ela agora encontrará a perfeita resistência dos seguidores de Morales e de seus representantes políticos, que acreditam que a renúncia do líder indígena, forçada pelo comandante em chefe das Forças Armadas, é o resultado de um golpe de Estado.

"Um golpe de Estado ocorreu antes de 20 de outubro", disse a líder da bancada do MAS na Câmara, Betty Yañíquez, em declarações à mídia. "Prova disso é que atualmente temos as Forças Armadas em nossas ruas", acrescentou antes de garantir que sua bancada não pretendia impedir a transição. “Sempre trabalharemos pela viabilidade de uma saída constitucional. Em nenhum momento iremos trabalhar contra o povo. Para nós não há diferenças. Estamos predispostos a dar uma saída constitucional. Eu quero que isso seja muito claro. Solicitamos as mais amplas garantias para poder atender, porque é de conhecimento público que as barricadas continuam”, continuou.

A demissão de Morales, anunciada no domingo à noite, acelerou os eventos e a tensão que levou ao caos e episódios de violência descontrolada. As Forças Armadas foram às ruas para apoiar a polícia nos tumultos, especialmente em La Paz e no município contíguo de El Alto. A apreensão diminuiu na manhã de terça-feira, apesar de o principal centro sindical, que inicialmente apoiou a saída de Morales, ameaçar convocar uma greve. Enquanto isso, todos aguardavam a chegada do ex-presidente no México, onde ele entrou como asilado político. Antes de partir, prometeu voltar com mais força e energia e, ao conhecer os procedimentos da sucessão, iniciou seus ataques a Áñez: “O golpe mais astuto e desastroso da história foi consumado. Uma senadora de direita golpista se declara presidenta do Senado e depois presidenta interina da Bolívia sem um quórum legislativo, cercada por um grupo de cúmplices e apoiada pelas Forças Armadas e polciais que reprimem o povo.”

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