Acordo Mercosul-UE encara corrida de ‘33 obstáculos’ e pressão de ambientalistas
Segundo chanceler Ernesto Araújo, processo de aprovação será lento pois depende de 33 parlamentos. França pede que Brasil reforce proteção à Amazônia, e chanceler cobra europeus por energias renováveis
O celebrado acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, recém-firmado na sexta-feira (28), ainda deve encarar alguns obstáculos antes de sair efetivamente do papel. Apesar de mais de 20 anos de negociações entre os dois blocos, o governo francês afirmou, nesta terça-feira, que o país não está pronto para ratificar o pacto. "Vamos observar com atenção e, com base nestes detalhes, vamos decidir", declarou o porta-voz do governo francês, Sibeth Ndiaye, em uma entrevista ao canal de notícias francês BFM. No Brasil, as declarações do porta-voz francês foram minimizadas pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, que afirmou que esse tipo de manifestação é dirigida ao público interno.
"O acordo nem está pronto para ser votado. O processo de ratificação certamente dependerá do parlamento francês. Mas, neste momento, nenhum país está pronto para ratificar, diante da questão constitucional", afirmou o chanceler em coletiva de imprensa no Palácio do Itamaraty. Segundo Araújo, a Comissão Europeia mantém consultas permanentes aos estados-membros, deixando sempre os países a par do que está sendo negociado. "Nada que está no acordo, a meu ver, é uma surpresa", completou.
A resistência da França, entretanto, não é novidade. O país é um dos mais reticentes ao acordo pois teme os efeitos sobre o setor agrícola, que pode seria afetado pela grande entrada de produtos sul-americanos no mercado.
Para entrar em vigor, o pacto entre o Mercosul e a UE ainda precisa tanto de avaliação jurídica quanto do aval do Parlamento europeu e dos legislativos de cada país-membro dos blocos.“É um processo que tende a ser lento. São 33 parlamentos. Mas pelo interesse que tem para todos os países, inclusive para a França, esperamos que seja acelerado”, disse Araújo.
Há um grupo, entretanto, resistente ao acordo, tanto na França como em outros países europeus. São os ambientalistas que estão de olho na preservação do meio ambiente brasileiro. Pouco após as declarações do porta-voz Ndiaye, o ministro do meio ambiente francês, François de Rugy, afirmou que o tratado só será ratificado se o Brasil assumir seus compromissos, especialmente os referentes à luta contra o desmatamento na Amazônia. Na semana passada, o presidente Emmanuel Macron também já tinha ameaçado o fim de qualquer acordo comercial com o Brasil caso Jair Bolsonaro decidisse sair do acordo climático de Paris. Porém, segundo Araújo, não há nenhum motivo de preocupação sobre os franceses. "Tenho certeza que todas essas preocupações que a França possa ter já estão contempladas em diversos pontos do acordo”, completou. Ainda segundo o chanceler, há “total compromisso” do Governo brasileiro contra o desmatamento. “Toda a nossa política é de preservação e utilização sustentável dos recursos naturais”.
O ministro exigiu ainda que os mesmos compromissos ambientais sejam também aplicados por todos os outros países que agora fazem parte do pacto. "Também esperamos ver implementados, inclusive, os compromissos deles, que são os países desenvolvidos, como desembolsos de recursos para financiamento de energias renováveis", disse.
O desmatamento da Amazônia em junho deste ano foi de 769 quilômetros quadrados entre 1 e 28 de junho, segundo sistema Terra Brasilis, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). É o segundo maior desmatamento desde junho de 2016, quando a prática alcançou 951 quilômetros quadrados.
Novos acordos neste ano
Em conversa com a imprensa, Araújo afirmou que o acordo histórico do Mercosul com a UE abre caminho para outras parcerias comerciais. Segundo o ministro, a intenção do Governo brasileiro é celebrar outras dois acordos ainda neste ano. O chanceler não especificou quais seriam eles, mas disse que as negociação estão mais avançadas com a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA) - grupo de quatro países que não fazem parte da UE: Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein - Canadá, Singapura e Coreia do Sul.“Não serão acordos nos mesmos moldes da UE. Cada acordo tem que seguir um modelo diferente. Cada parceiro tem características diferentes“, disse.
Com a vigência do acordo Mercosul-UE, 92% das exportações do bloco sul-americano para o europeu serão isentas de tarifas em um período de dez anos. Já a UE terá zeradas tarifas sobre 91% dos produtos que exporta para o Mercosul. O pacto é um marco histórico no relacionamento entre os dois blocos, que representam, juntos, cerca de 25% do PIB mundial e um mercado de 780 milhões de pessoas. Além do tema das tarifário, o acordo trata de assuntos de natureza regulatória, como serviços, compras governamentais, facilitação de comércio, barreiras técnicas, medidas sanitárias e fitossanitárias e propriedade intelectual.
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