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Trump dá trégua de três meses em restrições à Huawei

Estados Unidos acusam a fabricante chinesa de representar uma ameaça à segurança nacional. Em entrevista, fundador da empresa diz que Washington “subestima” sua força

Macarena Vidal Liy
Ren Zhengfei, no Fórum de Davos de 2015
Ren Zhengfei, no Fórum de Davos de 2015FABRICE COFFRINI (AFP)

Um ramo de oliveira. Motivado pela preocupação dos usuários e pelos efeitos econômicos e logísticos adversos para as companhias norte-americanas, o presidente Donald Trump anunciou uma trégua à Huawei, adiando para 19 de agosto a proibição da venda de suprimentos norte-americanos para o gigante chinês do setor eletrônico. A Huawei – que no ano passado investiu 11 bilhões de dólares na compra de componentes de empresas dos EUA – minimizou o gesto, considerando-o irrelevante. Em entrevista à imprensa chinesa, o fundador da companhia, Ren Zhengfei, afirmou que Washington “subestima” sua empresa.

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Na semana passada, o Governo norte-americano acusou a Huawei de representar uma ameaça à segurança nacional, por causa das suas conexões com o Governo chinês, e por isso a incluiu numa lista que impede as empresas dos EUA de fazerem negócios com ela, a menos que contem com uma licença especial. Por isso, empresas como o Google deixarão de fornecer software e componentes à Huawei, e consequentemente seus celulares e tablets deixarão de ter acesso a alguns serviços do Android e aos populares aplicativos Gmail e Google Maps. Isso não é algo muito grave dentro da China, onde os aplicativos já são bloqueados pela censura, mas pode dissuadir os usuários no resto do mundo.

O adiamento do veto, segundo nota assinada pelo secretário de Comércio Wilbur Ross, “dá tempo ao setor para se organizar de maneira diferente, e ao Departamento (de Comércio) a possibilidade de determinar as medidas de longo prazo apropriadas para as empresas de telecomunicações, estrangeiras e norte-americanas, que atualmente utilizam os aparelhos da Huawei para alguns serviços essenciais”.

Para Ren, o impacto é assimilável. Sua companhia, a segunda em vendas de celulares no mundo todo, atrás apenas da sul-coreana Samsung, já contava com um plano B caso a cadeia de suprimento norte-americana fosse interrompida. “Não vamos, repentina e levianamente, excluir os chips norte-americanos. Devemos crescer juntos. Mas se ocorrerem dificuldades no fornecimento, temos planos de contingência. Em época de paz [antes da atual guerra comercial entre EUA e China], supríamos metade [do mercado mundial] com chips norte-americanos, metade com chips da Huawei. Não será possível nos isolar do resto do mundo.”

Na entrevista, da qual o estatal Diário da Juventude publica uma transcrição, o executivo afirma que “o Governo norte-americano subestima nossa força. A infraestrutura 5G da Huawei certamente não será afetada”.

A liderança dessa tecnologia – o futuro padrão de comunicação sem fio que promete revolucionar nosso uso dos aparelhos – é uma das grandes razões de fundo para a súbita e drástica rivalidade entre a China e os Estados Unidos, que ameaça se transformar numa nova guerra fria. E Pequim, como gabou-se Ren, leva vantagem nessa corrida.

“No que diz respeito à tecnologia 5G, outros não poderão alcançar a Huawei durante pelo menos dois ou três anos”, observou o ex-militar. “Estamos à frente, embora na comparação entre países ainda estejamos muito longe dos Estados Unidos”, reconheceu.

Ren também admitiu que, como sua empresa busca a supremacia tecnológica, é “inevitável” um choque com os EUA. Porém, expressou sua gratidão às empresas desse país. “Afinal, temos que colaborar para contribuir com a melhora da humanidade. Continua valendo a pena aprender com a profundidade e amplitude da tecnologia norte-americana.”

As restrições impostas pelos Estados Unidos afetaram imediatamente as empresas tecnológicas que fazem negócios com a Huawei, em especial as fabricantes de semicondutores. O temor é que esse confronto possa prejudicar a cadeia global de componentes para telecomunicações.

A Apple é a empresa que melhor reflete o dano colateral deste fogo cruzado. Começou a semana com uma queda de aproximadamente 3,5%, devido ao temor quanto ao impacto de um boicote aos seus produtos. A queda se aproxima de 15% desde a primeira mensagem em que o presidente Donald Trump ameaçava intensificar a guerra tarifária com a China. Mais atingidas ainda estão sendo as empresas tecnológicas especializadas em semicondutores. A Skyworks arrasta uma perda de 21,5% no último mês. O mesmo ocorre com a Xilinx, com 17%, e a Micron. No caso da Nvidia, as ações caíram cerca de 15% neste período, mas já perderam metade do seu valor desde o ponto máximo no último ano. Uma tendência similar atinge a Intel, que se depreciou 13% no mês e 26% desde o último pico.

Na China, a nova medida contra a joia da coroa tecnológica reavivou a chama do nacionalismo, quando parecia que os dois países se aproximavam de um acordo que reverteria a drástica deterioração das relações comerciais entre as duas maiores economias do planeta. O tabloide Global Times, ligado ao Partido Comunista da China, publica nesta terça-feira que “o corte dos suprimentos norte-americanos terá certo impacto na Huawei, mas certamente será limitado. O alcance será definido não só pelos preparativos que a empresa já vinha adotando e por sua resposta à crise, mas também pelo apoio da sociedade chinesa à Huawei para superar suas dificuldades”.

O Governo chinês ainda avalia as medidas de resposta. Uma delas poderia ser restringir as exportações de terras raras, materiais imprescindíveis para a fabricação de produtos de alta tecnologia, incluídos os veículos elétricos. Esses materiais ficaram de fora da sobretaxa imposta há 10 dias por Washington às importações da China num valor de 200 bilhões de dólares, ao que Pequim respondeu elevando de 10% para 25% a alíquota sobre produtos norte-americanos num valor de 60 bilhões de dólares.

Essa possibilidade ganhou força depois que o presidente chinês, Xi Jinping, inspecionou nesta segunda-feira uma usina de extração e processamento de terras raras, numa visita noticiada pela agência estatal de notícias Xinhua. A China responde por 90% da produção global desses materiais.

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