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Terrorista da Nova Zelândia transmitiu atentado ao vivo pelo Facebook

Rede social diz ter apagado o vídeo "pouco depois" de que ele começar a ser exibido

Captura de vídeo com o rosto de um dos terroristas de Christchurch e da arma que usou nesta sexta-feira no atentado contra duas mesquitas
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Um dos autores do atentado contra duas mesquitas da Nova Zelândia transmitiu ao vivo parte do ataque pelo Facebook, conforme admitiu a rede social através de uma porta-voz. “A Polícia nos alertou sobre um vídeo no Facebook pouco depois de ele começar a ser transmitido. Apagamos rapidamente tanto o vídeo como a conta do Facebook e do Instagram do atirador”, diz um comunicado da rede social na Nova Zelândia. “Também estamos retirando qualquer apoio ou louvor a este crime, ao atirador ou aos atiradores assim que os encontramos”, acrescenta.

Pelo menos 49 pessoas morreram nesta sexta-feira em dois ataques terroristas contra mesquitas da cidade de Christchurch, na Ilha do Sul da Nova Zelândia. Três pessoas – que guardavam explosivos em seus carros – foram detidas. A primeira-ministra Jacinda Adern afirmou que “isto só pode ser descrito como um ataque terrorista”.

O vídeo de 17 minutos inclui imagens explícitas de um dos tiroteios. Parece ter sido gravado por uma câmara tipo GoPro, que um dos atiradores levaria consigo durante o ataque. Depois de publicado no Facebook, circulou por outras contas da mesma rede social e também pelo YouTube, Twitter, Instagram e Reddit, um dos principais fóruns da Internet. Embora estas plataformas tenham repetidamente apagado o vídeo, outros usuários continuaram a publicá-lo.

Segundo o The New York Times, alguém que se apresentava como um dos autores do ataque (embora sua identidade não tenha sido confirmada) publicou antes do atentado o link para um manifesto supremacista branco que estava publicado no fórum 8chan. Outros tuítes mostravam cartuchos de rifles nos quais ele havia escrito os nomes de ultradireitistas que cometeram outros massacres armados e assassinatos, entre eles José Estébanez, um ex-militar espanhol que em 2007 assassinou o jovem Carlos Palomino no metrô de Madri. Também constam as datas de batalhas em que o Império Turco sofreu derrotas nas mãos dos europeus.

Uma das imagens de cartuchos com referências a outros assassinos e assassinatos, compartilhada por um dos terroristas no Twitter. No cartucho superior aparece o nome do Josué Estébanez, ex-militar espanhol de ultradireita condenado pelo assassinato de um jovem em 2007
Uma das imagens de cartuchos com referências a outros assassinos e assassinatos, compartilhada por um dos terroristas no Twitter. No cartucho superior aparece o nome do Josué Estébanez, ex-militar espanhol de ultradireita condenado pelo assassinato de um jovem em 2007Reuters

Nos cartuchos também se podem ler os nomes de personagens históricos que na Idade Média lutaram contra tropas muçulmanas. Entre eles há vários que participaram das Cruzadas: Gastão IV de Bearne, mandatário do Reino de Aragão no século XI, e Boemundo de Antioquia. Também está escrito “Pelayu”, que poderia fazer referência a Dom Pelayo, símbolo da luta dos cristãos contra os muçulmanos na Península Ibérica durante a Idade Média. Outros dos nomes que aparecem é o de Carlos Martel, um senhor franco que guerreou contra os muçulmanos no século VIII. Um grupo terrorista francês de extrema direita que cometeu vários atentados contra muçulmanos entre 1973 e 1987 se chamava Carlos Martel. O conde Miguel Szilágyi de Horogszeg (em húngaro: Szilágyi Mihály) foi comandante dos exércitos húngaros e regente do país no século XV. Morreu nas mãos dos turcos após ser capturado em 1460.

Nestes carrregadores podem ser lidos, entre outros, os nomes de Carlos Martel, Bohemundo I de Antioquía, Gastón IV de Bearn, "Pelayu" (em referência a Dom Pelayo)
Nestes carrregadores podem ser lidos, entre outros, os nomes de Carlos Martel, Bohemundo I de Antioquía, Gastón IV de Bearn, "Pelayu" (em referência a Dom Pelayo)Twitter

O fórum 8chan, nascido de uma cisão do 4chan, é conhecido por suas posições extremas: em agosto de 2015 o Google o eliminou temporariamente de suas buscas por conteúdos suspeitos de pedofilia. O link original do manifesto já foi retirado desse fórum, mas continua circulando nas redes sociais, tanto pelo link como com capturas de tela do texto. O manifesto anunciava o ataque e prometia exibi-lo ao vivo, junto com um link para o vídeo.

No manifesto de 74 páginas, o terrorista se declarava abertamente fascista: “Por uma vez, a pessoa que será chamada de fascista é um fascista de verdade”. Segundo a France Presse, também citava a chamada “tese da substituição”, uma teoria da conspiração da extrema direita que aponta o perigo de desaparecimento dos “povos europeus” por causa da imigração. Do mesmo modo, o terrorista manifestava sua admiração por movimentos extremistas norte-americanos.

O manifesto também citava as "14 palavras", um slogan supremacista em inglês que já usado por outros racistas e ultradireitistas: "We must secure the existence of our people and a future for white children" (“devemos garantir a existência do nosso povo e um futuro para as crianças brancas”). O número 14 também aparecia nas armas.

Em seu texto, o terrorista conta que nasceu na Austrália, está radicado na Nova Zelândia e tem antepassados escoceses, irlandeses e ingleses. Faz referência aos “invasores”, aos quais quer mostrar que “nossa terra nunca será sua terra”. Os primeiros europeus chegaram à Nova Zelândia no século XVI, e a ilha foi colônia desde 1840, depois da guerra entre britânicos e maoris, e até 1907. A Austrália foi colônia entre 1788 e 1901. No momento dos primeiros assentamentos europeus, havia 350.000 habitantes aborígenes no país.

Não é a primeira vez que uma morte é exibida ao vivo no Facebook: em 2017, Prentis Robinson foi assassinado enquanto transmitia um vídeo ao vivo de Wingate (Carolina do Norte, Estados Unidos). Robinson usava o Facebook Live para denunciar os problemas de seu bairro. O Facebook retira vídeos violentos, sejam ou não ao vivo, mas não há controle prévio sobre sua publicação, por isso só toma medidas depois de receber denúncias de outros usuários (ou da polícia, como no caso do atentado da Nova Zelândia).

PewDiePie, “enojado” por ser citado pelo terrorista

No vídeo e segundo o The New York Times, o terrorista aconselhou seus seguidores a "assinarem os vídeos de PewDiePie", atualmente o youtuber com mais seguidores do mundo (89 milhões). Em um tuíte, o youtuber se declarou "enojado pelo fato de que esta pessoa tenha pronunciado meu nome" e expressou sua solidariedade às vítimas.

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