Ruas carregam Marielle como símbolo e cobram avanços na investigação
Atos em aniversário de mortes se tornam mais pressão em investigação. “Ver pessoas que abandonaram rotinas para estar aqui é ter noção de que a coisa é muito maior”, diz filha
“Ver pessoas que abandonaram suas rotinas para estar aqui nessa homenagem é ter noção de que a coisa é muito maior”, dizia Luyara Franco, filha da vereadora Marielle Franco (PSOL), executada há exatamente um ano com o motorista Anderson Gomes. Luyara estava ao lado de sua tia, Anielle Franco, e de vários amigos, ativistas, artistas e coletivos num palco montado na Cinelândia, centro do Rio. Tirava fotos, recebia abraços e sorrisos. “Esse carinho acalenta um pouco, sim. É saber o que minha mãe representa como mulher negra, mãe solteira, homossexual, periférica e defensora dos direitos humanos”. Momentos antes, sua tia discursava do palco iluminado em frente ao Teatro Municipal e a Câmara de Vereadores: “Estamos aqui de coração partido, com muita dor. Mas sei que Marielle é isso aqui, está presente. Ao invés de ficar espalhando ódio e coisas fictícias, temos que espalhar amor. Marielle era afeto. E Marielle tem uma família, e a gente precisa respeitar a dor dessa família”.
Faz um ano que mais de 50.000 pessoas estiveram espontaneamente na Cinelândia para se despedir de Marielle e Anderson e literalmente gritar por Justiça. Nesta quinta-feira, uma multidão menor que aquela, mas ainda assim grande, compareceu no mesmo lugar para celebrar a vida da vereadora e clamar por mais uma vez justiça. Porque foi necessário quase um ano para que a Polícia Civil apontasse os dois primeiros suspeitos, os PMs Ronnie Lessa e Elcio de Queiroz, presos na terça-feira. Não basta. Mas agora teme-se que a investigação seja encerrada sem que se apontem os possíveis mandantes. Familiares e amigos pedem para saber quem mandou matar Marielle e por quê.
O ato da Cinelândia foi o último de vários que ocorreram ao longo desta quinta no Rio. Diversos pontos da cidade amanheceram enfeitados com faixas, flores e cartazes com homenagens a Marielle e Anderson. Foi assim no Largo do Machado e na Lapa, mas também na rua, no local exato, onde os dois foram executados, no Estácio (região central do Rio). Houve também atos em São Paulo, na avenida Paulista, e no bairro do Jardim Ângela, na zona sul de São Paulo, e em um punhado de cidades pelo Brasil e no mundo. Em Buenos Aires, as Mães da Praça de Maio, as históricas ativistas da luta contra a repressão da ditadura argentina, se juntaram à homenagem. Nos EUA, uma série de conferências também lembrou a vereadora. No centro de estudos brasileiros na prestigiosa Universidade Princeton, Angela Davis, ícone do movimento negro mundial, fez o discurso principal.
Missa na Candelária
O dia de homenagens começou cedo. No Rio, por volta de 8h da manhã, uma enorme faixa, escrito Marielle Gigante, foi estendida no Palácio Pedro Ernesto, sede Câmara de Veradores do Rio, na Cinelândia. Girassóis também foram espalhados pela escadaria junto com várias mensagens, como"Justiça por Anderson e Marielle", "Marielle vive, Marielle presente", "A democracia não será interrompida" ou ainda "Quem mandou matar Marielle?". Por volta de 9h, um ato silencioso que contou com a presença de parlamentares do PSOL tomou também as escadarias do Palácio Tiradentes, sede da Assembleia Legislativa do Rio (ALERJ). 365 girassóis foram espalhados, representando os 365 dias sem a vereadora e o motorista. Marielle recebeu um girassol quando começou sua jornada rumo à Câmara dos Veradores, em 2016, e a flor se tornou um símbolo de sua campanha eleitoral. Organizadores do ato também explicaram que o girassol "é uma flor que não morre, vira semente".
Mas a principal cerimônia da parte da manhã foi uma missa na emblemática Igreja da Candelária, no centro do Rio, também lotada de familiares, amigos e pessoas que tiveram alguma ligação com Marielle e Anderson. O deputado federal Marcelo Freixo, mentor político de Marielle, deixou seu recado: “A gente não vai sair da rua enquanto a gente não souber quem mandou matar Marielle. Essa é a pergunta decisiva”.
A mensagem seria repetida por muitos ao longo do dia. "Queremos saber quem mandou matar Marielle, para que a justiça seja realmente feita. Aliás, o mundo inteiro quer saber, porque as bandeiras que ela levantava se tornaram universais", disse, na av. Paulista, a pedagoga Cristina Terribas, de 57 anos. Ao lado dela, a relações públicas Andreia Batista, 47, lembra a escritora Carolina de Jesus, que nasceu há 105 anos, no mesmo dia da morte de Marielle Franco, para ressaltar a importância de sua memória para as mulheres negras. "A Marielle deixou um legado que pouca gente conheceu enquanto viva, infelizmente, mas que se expandiu para o mundo depois que ela morreu. Estamos juntas, com a força de Marielle e Carolina de Jesus, para não deixar que suas lutas sejam esquecidas."
Veja como contamos em tempo real os atos por um ano da morte de Marielle:
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