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Governo vai encerrar Mais Médicos, que será substituído por plano de carreira federal

Informação foi confirmada ao EL PAÍS por Mayra Pinheiro, que coordena o programa. Vagas já preenchidas serão mantidas pelo tempo de contrato,que é de três anos, mas não haverá novos editais

Uma médica durante um atendimento do programa 'Mais Médicos'.
Uma médica durante um atendimento do programa 'Mais Médicos'.Agência Brasil
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O Governo federal decidiu encerrar o Programa Mais Médicos e substituí-lo por um novo projeto, ainda em planejamento e que será apresentado "em breve" pela gestão de Jair Bolsonaro, de acordo com informações dadas ao EL PAÍS por Mayra Pinheiro, secretária de gestão no trabalho e educação em saúde do Ministério da Saúde, cargo responsável pelo Mais Médicos. Segundo ela, a ideia é que o último ciclo de vagas abertas se encerre nesta semana. E, a partir disso, não sejam feitos novos editais. Os médicos que atuam pelo programa poderão continuar em seus postos de trabalho até o final de seus contratos, que tem duração de três anos.

Notabilizado pela participação de médicos cubanos, que chegaram ao Brasil por meio de uma parceria com o Governo da ilha intermediada pela Organização Pan Americana da Saúde (OPAS), o Mais Médicos foi criado em 2013 pelo Governo Dilma Rousseff (PT). O objetivo era levar médicos para áreas mais distantes e vulneráveis do país, que sempre tiveram dificuldades de reter profissionais. Recebeu críticas, entretanto, pelo modelo de parceria que trouxe os cubanos, já que a ilha mantinha grande parte dos salários dos profissionais que atuavam em áreas brasileiras. Em dezembro, após críticas da gestão Bolsonaro e o anúncio de que a validação dos diplomas passaria a ser exigida por seu Governo, Cuba encerrou a parceria e retirou seus profissionais, o que gerou uma crise na estrutura de atendimento, especialmente nos pequenos municípios.

Com a saída dos cubanos, foram abertas cerca de 8.500 vagas. O Governo de Michel Temer, seguido posteriormente pela gestão Bolsonaro, realizou chamadas para preencher as vagas. Até o momento, 1.462 vagas ainda permanecem sem profissionais, mas a expectativa da pasta da Saúde é que elas sejam preenchidas nesta semana, quando os cerca de 3.700 médicos brasileiros formados no exterior que se inscreveram no edital poderão escolher os municípios onde atuarão. A ideia do Governo Bolsonaro, então, é substituir o Mais Médicos por um novo programa que deverá incluir um plano de carreira que torne as regiões de difícil provimento mais atrativas aos profissionais, mas ainda não dá detalhes sobre como seria esse programa. Este era o pedido feito pelas entidades médicas.

"Todas as vagas do atual edital foram completadas por brasileiros inscritos. E esse deverá ser o último edital do programa, que será substituído pela carreira federal em áreas de difícil provimento e que está em elaboração", afirmou Mayra Pinheiro ao EL PAÍS, sem dar mais detalhes sobre o novo programa. Ela também confirmou a médicos intercambistas, em mensagens vistas pela reportagem, a informação de que não haverá novos editais e que o programa será encerrado. "No seu lugar haverá um programa de provimento para a atenção primária e carreira federal para áreas de difícil provimento", explicou Pinheiro. Com a ocupação total das vagas deixadas pelos cubanos pelos médicos brasileiros nesta semana, como previsto por ela, os profissionais estrangeiros inscritos, que deveriam escolher os municípios nos dias 18 e 19 deste mês, não devem participar do programa. Entre eles, estão cerca de 2.000 médicos cubanos que decidiram permanecer no Brasil após o presidente Bolsonaro acenar que eles teriam asilo e poderiam ser reincorporados ao programa. Com o encerramento do Mais Médicos, o Governo estuda ajuda humanitária por meio do Ministério da Justiça para essas pessoas.

Logo no início da gestão, Mayra Pinheiro chegou a criar grupos no Telegram e no Whatsapp e distribuir formulários para identificar os médicos cubanos que decidiram ficar no Brasil e ver maneiras de reincorporá-los ao programa. Em entrevista ao EL PAÍS em dezembro passado, chegou a afirmar que o Governo estudava a possibilidade de um Revalida (prova de validação do diploma obtido no exterior) especial para a atenção básica —algo que deveria ser discutido com o Conselho Federal de Medicina. Agora, questionada se não há mais chances de reincorporar os médicos cubanos, ela disse apenas que "Cuba cancelou o contrato, não o Brasil".

Os médicos cubanos não podem exercer a profissão no Brasil porque não realizaram o Revalida. Alguns profissionais cubanos que foram desligados do Mais Médicos passaram a trabalhar em serviços gerais, inclusive como vigias de postos de saúde, enquanto esperavam se concretizar os acenos do governo para reincorporá-los ao programa, a única forma de exercer a medicina sem a validação. A prova, realizada pelo Inep, é feita em duas fases e não tem data certa para acontecer. A edição de 2017 deve ter os resultados divulgados neste mês, ou seja, mais de um ano depois. Só depois o Governo anunciará as datas das próximas convocatórias.

“Existe uma preocupação do Governo em relação aos médicos [cubanos] que solicitaram asilo no país. Isso não muda nossa posição [sobre a exigência de revalidação do diploma]. Um Revalida apenas para a atenção básica está fora de cogitação pro Conselho Federal de Medicina(CFM), seja para médicos brasileiros formados no exterior ou para estrangeiros. Os médicos têm que cumprir as etapas obrigatórias do Revalida. Não existe isso de fazer um exame especial”, disse ao EL PAÍS em 23 de janeiro o primeiro secretário do Conselho Federal de Medicina, Hermann Von Tniesehause.

O Governo Bolsonaro tem sinalizado uma relação muito mais próxima com distintas entidades médicas, que já pediam o encerramento do programa após a conclusão deste ciclo e a criação de um novo, que exija o Revalida aos profissionais. Desde o período de transição governamental, tanto o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, quanto Mayra Pinheiro têm se reunido com representantes destas entidades para discutir novas políticas e já anunciaram que os encontros devem ser frequentes nos próximos anos. “Há muito tempo o Conselho Federal de Medicina não tem uma relação de proximidade com o Governo Federal. A nova gestão abriu essa oportunidade para as entidades médicas”, afirma Von Tniesehause. Ele conta que o Governo tem compartilhado propostas e ouvido a classe médica, mas que isso não muda a vigilância e autonomia da entidade para avaliar as políticas nacionais de saúde.

Von Tniesehause informa que está na pauta do Ministério da Saúde a criação de uma secretaria voltada para a atenção básica e a criação de um novo programa no qual a estratégia para fixar médicos nas cidades vulneráveis seria um plano de carreira ainda indefinido. A sugestão do CFM é de que esse plano de Estado inclua apenas médicos com diplomas revalidados e que o profissional inicie em um local mais vulnerável e possa progredir em salário e cargo, migrando para municípios maiores ao longo da carreira. “O Ministério da Saúde ainda não deu uma palavra final sobre isso, mas há um aceno de que isso pode acontecer”, informou Von Tniesehause. Sobre esse tema, Mayra Pinheiro diz apenas que a implantação da carreira federal em áreas de difícil provimento está em elaboração pelo Ministério da Saúde.

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