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MDB refuta solidão de Meirelles, mas descola sua imagem de Temer

Desgaste do Governo empurra o partido para um voo solo nas eleições presidenciais. Sigla está longe de deixar de ser protagonista no Brasil com força nos pleitos regionais

O ex-ministro Meirelles em evento da igreja Sara Nossa Terra em janeiro.
O ex-ministro Meirelles em evento da igreja Sara Nossa Terra em janeiro. UESLEI MARCELINO (REUTERS)
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Nas semanas em que se celebram as convenções partidárias no Brasil, as legendas estão acertando os últimos detalhes das alianças que vão definir a musculatura de cada candidatura ao Palácio do Planalto neste ano. O Centrão — grupo formado por DEM, PP, PR, PRB e Solidariedade — fechou filas com Geraldo Alckmin, do PSDB; Ciro Gomes (PDT) e emissários do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se digladiam pelo apoio do PSB e do PCdoB, em busca de uns segundos a mais de tempo de tevê que lhes permita construir a candidatura mais estruturada no campo da esquerda. Enquanto isso, quase que alheio às movimentações dos demais partidos, um gigante da política brasileira caminha para alçar seu primeiro voo solo em 24 anos — mesmo que o nome escolhido para a empreitada seja considerado por membros da própria sigla como fadado ao insucesso.

"Nós sabemos que o Henrique Meirelles vai ter muita dificuldade na eleição", avalia um interlocutor do presidente Michel Temer. Mas a importância da chapa presidencial que deverá ser encabeçada pelo ex-ministro da Fazenda para a cúpula do MDB, e principalmente para Temer, não pode ser medida pelo seu fraco desempenho nas últimas pesquisas de opinião (ele somou apenas 1% da preferência do eleitorado no último Ibope). A baixa probabilidade de uma vitória nas urnas é tratada como uma questão secundária. Para os assessores mais próximos de Temer, é mais importante garantir ao menos um candidato na disputa pelo Planalto que esteja disposto a defender as políticas adotadas pelo presidente emedebista, que ostenta índices recordes de rejeição. Nesta sexta, o partido divulgou uma Carta Aberta à Nação, defendendo seu papel na recuperação econômica do país, depois da recessão que durou dois anos.  “Agora, o MDB conduziu o país através da tempestade, livrando-nos do desastre econômico e social. Se neste momento temos condições de acreditar no futuro, foi porque o Brasil não descarrilhou de vez em 2015”, descreve o texto.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Romero Jucá, presidente da sigla, classifica Meirelles como um “radical de centro”, e o único que não precisa recorrer a ex-ministro da Fazenda para garantir credibilidade de Governo. “Michel não é candidato. O candidato é Meirelles. Estamos fazendo uma transição e não negamos o governo. Mas Michel será julgado pela história, não na eleição”, disse Jucá.Segundo um político que militou por décadas no MDB, a estratégia ”é não deixar que o Temer termine como o [ex-presidente José] Sarney, o cachorro que todo mundo chuta”. A preocupação encontra eco na impopularidade do presidente da República. No último Datafolha Temer apareceu reprovado por 82% dos entrevistados, enquanto que apenas 3% consideraram o emedebista “ótimo ou bom”. Com esses números, não é difícil imaginar que a campanha será recheada de ataques às bandeiras do atual mandatário.

Para Jucá, a campanha vai mostrar Meirelles não como resultado de govreno, mas sim do seu trabalho e da vida pública e privada. Vale, assim, colar a nome dele ao político de maior sucesso nas pesquisas eleitorais no momento. “Quem inventou o Meirelles na área econômica não foi o Temer. Foi o Lula”, completou.

O desgaste acumulado por Temer desde que assumiu o poder também é uma das razões pelas quais as conversas sobre possíveis acordos com outros partidos, como o PSDB de Alckmin, encontraram dificuldades, o que levou o MDB a ensaiar um jogo solitário no cenário nacional. O partido é dono de um ativo cobiçado pelos presidenciáveis, cerca de um minuto e meio do tempo de tevê, mas Temer é visto como um nome tóxico, com potencial de ser uma âncora para quem quer que se associe a ele.

Não por acaso um dos maiores desafios de Alckmin nestas eleições será justamente se esquivar dos ataques de que seu projeto seria uma continuação da administração do emedebista, já que o PSDB foi um dos maiores avalizadores do atual governo.

Racha

A tese do candidato próprio para servir de escudo para Temer, no entanto, não é consensual dentro de uma organização que atua mais como uma federação de interesses regionais do que como um partido centralizado. Liderada pelo senador Renan Calheiros (AL), uma ala do MDB, constituída principalmente por políticos do Norte e Nordeste, regiões onde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é um forte cabo eleitoral, critica a indicação de Meirelles e trabalha para revertê-la. O principal argumento é que um candidato presidencial do MDB representa um constrangimento na hora da formação de alianças estaduais.

Esses acordos regionais são a grande prioridade dos caciques locais de um partido que tem na paróquia a sua principal força. Além dos atuais cinco governadores, o MDB elegeu 1.026 prefeitos em 2016. E ao formar nos últimos pleitos as bancadas mais expressivas do Congresso Nacional, a legenda se consolidou como a peça-chave da governabilidade no Brasil. Até a convenção nacional do MDB em Brasília, em 2 de agosto, Temer e seus aliados vão trabalhar para desidratar a articulação contra Meirelles. Um dos argumentos que tem sido utilizado é que o ex-ministro da Fazenda, executivo de sucesso com passagens pelo BankBoston e pela J&F, estaria disposto a contribuir com recursos próprios para a sua campanha. Isso permitiria que o grosso do caixa do MDB fosse direcionado para os diretórios estaduais, fortalecendo os vários candidatos emedebistas a governador, deputado e senador.

“O cálculo do MDB é que o partido vai continuar sendo um ator de grande protagonismo no sistema brasileiro de presidencialismo de coalizão”, afirma o cientista político da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Pedro Floriano Ribeiro. Tudo indica que o MDB não vai abrir mão da sua vocação histórica de centrar suas fichas nos Estados. Se conseguir manter ou ampliar sua forte presença na Câmara e no Senado, a inexistência de uma aliança pré-eleitoral perde peso em razão do tamanho do partido. "Eles sabem que podem pular no Governo no dia seguinte à eleição", ironiza um parlamentar. Ganhe quem ganhe.

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