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Trump anuncia aumento das tarifas de importação do aço e alumínio e preocupa Brasil

EUA são o segundo maior parceiro comercial do país e principal destino das exportações de aço

Operário em frente a um forno da siderúrgica alemã de Salzgitter
Operário em frente a um forno da siderúrgica alemã de SalzgitterAlexander Koerner (Getty Images)
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Os Estados Unidos se entrincheiram ainda mais no âmbito do comércio internacional, com aquela que deve ser a medida protecionista mais impactante já adotada. O presidente Donald Trump anunciou nesta quinta-feira que na semana que vem imporá uma nova tarifa global de 25% para a importação de aço e de 10% para o alumínio comprado de vários países. Para isso, invocará a segurança nacional e a revitalização da indústria nacional.

O Governo brasileiro recebeu a notícia com "enorme preocupação". Caso confirmada, "a restrição comercial afetará exportações brasileiras de ambos setores", informou o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), em comunicado. Na última terça-feira (27), o ministro Marcos Jorge, responsável pela pasta, esteve reunido em Washington com Wilbur Ross, secretário de Comércio dos Estados Unidos, para reiterar que o aço brasileiro não representa ameaça à segurança nacional norte-americana e que as estruturas produtivas siderúrgicas de ambos os países são complementares.

O argumento do Governo é que cerca de 80% das exportações brasileiras de aço são de produtos semi-acabados, um importante insumo para a indústria siderúrgica norte-americana. Paralelamente, o Brasil também é o maior importador de carvão siderúrgico norte-americano (cerca de US$ 1 bilhão em 2017), que constitui insumo relevante para a produção brasileira de aço, parcialmente exportada aos Estados Unidos. "Somos o maior consumidor internacional desse produto norte-americano. Uma eventual aplicação de medida que impacte a nossa produção de aço pode refletir diretamente na nossa necessidade de consumo de carvão mineral", alertou o ministro durante o encontro.

De acordo com o MDIC, o secretário Ross se comprometeu a analisar os números apresentados pela delegação brasileira e repassá-los ao presidente Trump, que é quem vai definir as medidas a serem tomadas. E mesmo que a medida afete o Brasil, ainda haverá a possibilidade de pedido de recurso, o que poderia reverter a eventual taxação. Os EUA são o segundo maior parceiro comercial do Brasil. Em 2017, o fluxo comercial foi de mais de US$ 50 bilhões, envolvendo mais de 20 mil empresas.

Trump não parece muito preocupado com a repercussão negativa de sua medida. Em seu Twitter o presidente dos EUA divulgou uma mensagem dizendo que guerras comerciais são boas para os negócios: "Quando um país (EUA) está perdendo muitos bilhões de dólares em comércio com praticamente todos os países com os quais ele faz negócios, as guerras comerciais são boas e fáceis de vencer. Por exemplo, quando reduzimos em 100 bilhões de dólares [o comércio] com um determinado país e ele responde de volta, 'não negociamos mais'. Ganhamos grande. É fácil!"

Protecionismo

Trump convocou executivos do setor para irem à Casa Branca conhecerem as medidas a serem adotadas. O presidente, que conta com plenos poderes para modular as tarifas, tem um prazo até meados de abril para concretizar as novas alíquotas. A questão é saber contra quais países exatamente as voltará. Brasil, Canadá e Coreia do Sul são os principais exportadores para os EUA, junto com Europa, Japão, México e China.

“Nossas indústrias do aço e do alumínio se viram dizimadas por décadas de comércio injusto e más políticas com países de todo o mundo”, comentou o presidente, antes da reunião com os executivos, em sua conta nas redes sociais. “Não devemos continuar permitindo que os outros levem vantagem à custa do nosso país, das nossas companhias e dos nossos trabalhadores. Queremos um comércio livre, justo e inteligente.”

Trump assinará a ordem executiva (uma espécie de medida provisória) na semana que vem. O argumento de Washington é que os estaleiros militares e os grandes projetos de infraestrutura dependem muito do aço importado, que é mais barato. O mesmo se aplica ao setor automotivo, embora neste caso os fabricantes se oponham às tarifas, pelo efeito que pode ter sobre os empregos do setor. Trump procura, entretanto, incentivar a produção doméstica de aço especializado.

O Departamento de Comércio publicou há apenas duas semanas os resultados de um estudo, depois de consultas a vários órgãos públicos, em que concluía que essas importações prejudicam as necessidades militares dos EUA e colocam em risco a segurança nacional. Propunha três opções para passar à ação, utilizando uma legislação de 1962: impor uma tarifa global, aplicar cotas ou adotar alíquotas específicas.

Ataque à OMC

O setor siderúrgico emprega 385.000 pessoas nos EUA. Eram quase 640.000 assalariados em 2000. Durante a campanha que o elegeu, Trump concentrou a busca por votos em localidades do velho cinturão industrial que foram mais afetadas pela destruição de empregos, e acusou a China de vender aço abaixo do preço de mercado. “A Organização Mundial de Comércio foi um desastre para nosso setor industrial”, reiterou.“Precisamos dessas companhias para nossa defesa.”

As estatísticas, entretanto, mostram uma realidade muito diferente da que defende Trump. Os EUA produzem 70% do aço que consomem, e só 3% são de uso militar, segundo dados do Instituto Americano do Ferro e do Aço. O Instituto Cato relata que o setor siderúrgico dá emprego a uma proporção muito marginal em comparação às empresas que consomem aço, que superam os 6,5 milhões de trabalhadores.

A ação unilateral tem o respaldo de Robert Lighthizer, representante de Comércio Internacional do Governo federal, que como advogado defendeu os interesses da indústria siderúrgica em Washington, além do secretário Wilbur Ross, que como investidor reestruturou companhias do setor, e de Peter Navarro, assessor econômico do presidente. Gary Cohn, principal conselheiro econômico da Casa Branca, com uma visão mais globalista, e James Mattis, secretário de Defesa, foram mais precavidos.

Alan Greenspan, Ben Bernanke e outros economistas com passagens pela Casa Branca em gestões anteriores defenderam meses atrás que se evitasse impor as novas alíquotas sob a bandeira da segurança nacional, porque consideram que “o custo diplomático” não resultará em benefícios econômicos, pois as alíquotas elevarão o custo de produção e consequentemente o preço pago pelo consumidor final.

Reação de Wall Street

As ações das empresas siderúrgicas se valorizaram fortemente em antecipação ao anúncio. A AK Steel teve alta de 7% no começo da sessão em Wall Street, enquanto que sua concorrente US Steel subiu mais de 4%. A Nucor ganhou 3,5%, e a fábrica de alumínio Alcoa registrou alta de 2%. A elevação das tarifas afeta, entretanto, grandes clientes como Boeing, Caterpillar e Ford Motor. E o temor de uma guerra comercial prejudicou o índice geral de Wall Street, que caiu mais de 2%.

A União a Europeia advertiu, por sua vez, que adotaria medidas de represália diante da possível medida. Na verdade, o temor dos economistas do Conselho de Relações Exteriores, uma entidade privada, é que esse tipo de tarifação acabe detonando litígios comerciais que mais prejudicariam as empresas do que as protegeriam. O fato de o presidente evocar a segurança nacional como argumento para levantar ainda mais o muro protecionista não impede que a Organização Mundial de Comércio considere a medida ilegal.

Faz agora um ano que o Departamento de Comércio publicou um estudo deixando claro que os EUA defenderiam “agressivamente” seus interesses no âmbito comercial. Trump considera também que foram assinados no passado acordos nocivos à economia. Por isso decidiu,assim que tomou posse, que renunciaria ao tratado Transpacífico e renegociaria o Tratado de Livre Comércio da América do Norte (Nafta).

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