Colômbia pedirá de volta tesouro indígena levado à Espanha em 1893
Coleção de 122 peças de ouro havia sido um presente do presidente à rainha, algo que foi considerado ilegal pela Justiça colombiana
A Colômbia deverá recuperar o tesouro Quimbaya entregue à Coroa espanhola em 1893. A Corte Constitucional do país estudou durante mais de um ano a ação que tinha essa pretensão e na quinta-feira decidiu a favor do denunciante. Com cinco votos contra um, os magistrados do tribunal constitucional reiteraram que o patrimônio cultural não pode ser alienado e por isso as 122 peças de ouro, que permanecem no Museu da América em Madri, devem ser recuperadas e devolvidas à Colômbia.
A decisão da Corte é o desenlace de um processo que começou em 2006, quando o advogado Felipe Rincón levou o assunto à Justiça. O argumento principal para fazê-lo era que o presidente da Colômbia Carlos Holguín presenteou de forma ilegal as peças à rainha María Cristina de Habsburgo-Lorena. Em 2009, um juiz lhe deu razão, mas em 2011 um tribunal revogou a decisão ao considerar que não existia suporte suficiente para declarar que a entrega foi irregular. Agora o Constitucional volta a ficar a favor do demandante e a Colômbia deverá acatar a ordem do máximo tribunal, apesar do Governo, através da Chancelaria, afirmar que a coleção não foi declarada como um bem do patrimônio cultural do país, de modo que, no seu entendimento, não foi entregue de maneira ilegítima.
Patti Londoño Jaramillo, vice-chanceler da Colômbia, afirmou em janeiro do ano passado em uma audiência pública que a entrega das peças foi regulamentada pela lei. “É preciso mencionar que o ato unilateral do chefe de Estado da Colômbia em 1893 constituiu uma manifestação da vontade da República da Colômbia, dentro do marco regulamentar interno vigente, por ser o chefe de Estado o representante natural e legítimo frente aos demais Estados. Foi assim um ato legítimo”, disse a funcionária. Cristina Pardo, do escritório jurídico da Presidência da República, a apoiou e reiterou que a entrega do tesouro cumpriu com o marco legal da época. Mas a outra versão que diz que foi um processo irregular teve mais peso.
A coleção, segundo o advogado Rincón, foi comprada pelo Governo de um guaquero – um caçador de tesouros em sepulturas indígenas – para ser exibido em Madri em 1892. Era esperado que fosse devolvida ao final das comemorações do quarto centenário do descobrimento da América, mas o então presidente Holguín decidiu doá-las em 1893 ao reino da Espanha como agradecimento por um laudo arbitral emitido pela Rainha em uma disputa de limites fronteiriços entre a Colômbia e a Venezuela.
A Procuradoria e a Defensoria do Povo foram favoráveis ao advogado que defendia a devolução do tesouro. Afirmaram que ele é parte da identidade cultural da Colômbia e que, portanto, deve ser recuperado. O espanhol Fernando Vicario, diretor da área de cultura da Organização dos Estados Ibero-americanos, foi outra das vozes ouvidas durante o processo. Nas audiências na Corte afirmou que conseguir com que a coleção Quimbaya retorne ao país pode ser um passo para “consolidar um espaço cultural ibero-americano em um mundo em que os símbolos devem ter mais força do que os assuntos burocráticos e legislativos”.
Após 124 anos, a Colômbia deverá reconhecer que a entrega não foi legítima e iniciar o pedido de devolução das peças através do tratado da Unesco de repatriação de bens culturais. Não o fazer seria, segundo a Corte, uma violação à Constituição, que em três artigos estabelece que não se pode alienar o patrimônio nacional.
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