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Coluna
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As lágrimas de Gisele Bündchen no Rock in Rio

Modelo famosa aumenta a pressão pela preservação da floresta amazônica, enquanto projetos de redução de áreas protegidas viram moeda de troca para estabilidade de Temer

Gisele Bündchen se emociona na abertura do Rock in Rio
Gisele Bündchen se emociona na abertura do Rock in RioA.Gomes (AFP)
Carla Jiménez

Gisele Bündchen é sempre um deslumbre quando aparece, e na noite desta sexta-feira não foi diferente. Ela abriu o festival Rock in Rio que levou milhares de jovens à Cidade do Rock, porque se tornou um ícone na defesa do meio ambiente. Estava ali para lançar o projeto mundial Believe Earth/Amazônia Live, abraçado pela organização do show de rock, que visa jogar luz sobre questões ambientais, como a proteção da floresta amazônica. Nada mais justo que chamar Gisele, que não se furta ao papel de mandar recados até para o presidente da República quando há projetos que ameaçam a imensa mata que toma o Norte do Brasil.  “Sonho com o dia em que encontraremos o equilíbrio entre o ter e o ser... o desfrutar e o preservar. Sonho com o dia em que viveremos em harmonia, em total harmonia, com a mãe terra... Cada um tem um impacto nesse mundo, só temos de decidir qual impacto queremos ter”, discursou Gisele, emocionada.

A modelo não é uma ambientalista de ocasião. Já havia protagonizado uma cena comovente num vídeo em que sobrevoava a Amazônia. Ao avistar trechos desmatados, ela não segura as lágrimas. Nas redes, tornou-se uma aliada poderosa para as ONGs. Marca posição sempre que há projetos em pauta que sejam lesivos à floresta. Foi assim quando saiu a notícia do decreto, por ora suspenso, de extinção da Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca), no Amapá e Pará, ou a diminuição da floresta Jamanxim, também no Estado paraense.

“Vergonha! Estão leiloando nossa Amazônia! Não podemos destruir nossas áreas protegidas em prol de interesses privados”, escreveu a modelo em seu Twitter, logo após o Governo Temer ter assinado, no mês passado, o decreto extinguindo a Renca que, apesar do nome, contempla reservas ambientais e indígenas. Em 12 de junho, ela chegou a marcar diretamente o twitter oficial do presidente Michel Temer para reclamar da redução da floresta Jamanxim, que perderia 600.000 hectares por meio de uma Medida Provisória, proposta do Governo. “@MichelTemer, veto as propostas que ameaçariam 600k de hectares de área protegida na Amazônia brasileira”, reclamou ela. Foram quatro tuítes no total, dois em português e dois em inglês, para protestar. Na verdade, eram 437.000 hectares menos.

https://twitter.com/giseleofficial/status/900722737748090883

A moça tem poder e influência. São 4,6 milhões de seguidores no mundo todo que acompanham seus passos. É péssimo ficar mal com uma moça linda, rica, bem sucedida e ainda preocupada com o bem estar da humanidade. Ainda mais para um presidente tão impopular. E assim, no caso de Jamanxim, Temer acabou voltando atrás rapidamente. Tentou até transformar a ‘cutucada’ de Gisele em um fato favorável. Marcou Gisele de volta no Twitter para anunciar o seu veto à proposta inicial.

Temer, porém, fez o anúncio do veto a Jamanxim em público, mas por trás enviou um novo projeto de lei para o Congresso aumentando ainda mais a proposta de redução do verde. Foram as emendas sugeridas pela bancada ruralista. Desta vez, Jamanxim poderia perder 1 milhão de hectares, pelo cálculo de ambientalistas. E lá foi Gisele. “Estamos de olho”, avisou ela, quando do veto de Jamanxim, partilhando uma notícia de que o ataque à região podia voltar sob forma de um novo projeto de lei, como efetivamente voltou.

Gisele é incansável. Basta percorrer seu microblog para ver quantas mensagens sobre a Amazônia ela partilha. Estão lá notícias das ONGs como Greenpeace, WWF, e vídeos partilhados pelo senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP), ou Alessandro Molon (REDE-RJ), que integram a pequena bancada preocupada com a Amazônia.

A modelo internacional tenta amplificar a voz dessa minoria, como o fez no Rock in Rio. Enquanto  falava no palco da Cidade do Rock, a plateia começou a gritar “Fora Temer”. O mote, que ecoou durante o impeachment da ex-presidenta Dilma no ano passado, voltou agora com o cerco que vem se fechando ao redor da floresta. “Fora, Temer, a Amazônia fica”, repetem os índios Wajãpi, que vivem dentro de uma reserva demarcada em 1996. Parte dela está dentro da Renca.

Mas para o presidente, tirar o pé da Amazônia pode sim lhe custar a saída do Governo antes da hora. Sua base de deputados no Congresso, que brecou uma das denúncias enviadas pela Procuradoria Geral da República, está cobrando a fatura da camaradagem pós delação da JBS. Virou refém de demandas de ocasião de ruralistas, e da bancada patrocinada por mineradoras. “Presidente refém não tem agenda, passa a atender a demandas... Hoje o Congresso se tornou, mais que nunca, um varejão sem rumo e o presidente, com a caneta, vai sancionando o que lhe pedem”, escreveu o sociólogo Sergio Abranches, no artigo “Um presidente refém do varejão sem rumo”. Imagine agora, diante da nova denúncia que chegou ao presidente pela PGR na semana que passou. É muito provável que os representantes do setor privado no Congresso se sintam mais à vontade para ceifar pedaços da floresta.

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Por ora, a defesa da Amazônia está nas mãos de ONGs, ambientalistas, de uma bancada muito pequena no Congresso e dos artistas que emprestam sua imagem para proteger a natureza.  Na semana que passou, Suzana Vieira, Alessandra Negrini, Victor Fasano, entre outros, estiveram com o presidente do Congresso, Rodrigo Maia, para entregar uma petição online assinada por 1,5 milhão de pessoas pela revogação definitiva do decreto que extingue a Renca.

Apesar da empatia, tudo é muito frágil para segurar o rolo compressor que cerca a mata virgem, e apequena ainda mais o país. Não só os deputados ruralistas ou patrocinados por empresas de minério se sentem mais fortes. Foras da lei que atuam em áreas protegidas também se regozijam. Um novo capítulo sangrento pode ter sido escrito no Vale do Javari, no oeste do Estado do Amazonas, a raiz desta realidade. A suspeita de que índios isolados foram mortos por garimpeiros, como foi noticiado há alguns dias, é só mais um lance vergonhoso desse cruel e medíocre imbróglio – a notícia também foi partilhada por Gisele no seu twitter. Não é difícil compreender, assim, por que a uber model chora ao falar do assunto.

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