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Herman Benjamin, o ministro tenaz que expôs as entranhas da Justiça

Ministro do TSE tornou-se a cara do julgamento da chapa Dilma-Temer, conseguindo inclusive gerar certo consenso a favor de sua figura

O ministro Herman Benjamin, nesta quinta-feira.
O ministro Herman Benjamin, nesta quinta-feira. EVARISTO SA (AFP)
Felipe Betim

O drama político House of Brasil ganhou mais um personagem capaz de prender seus espectadores diante da televisão. Seu nome é Antônio Herman de Vasconcelos e Benjamin, ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e novo integrante do núcleo jurídico da trama, alçado nos últimos três dias a herói ao se tornar a cara do julgamento da chapa Dilma-Temer – no qual foi relator e votou pela cassação dos vencedores das eleições de 2014. Em tempos de protagonismo do Judiciário, algo parecido aconteceu com Joaquim Barbosa durante o julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF) e com o juiz Sérgio Moro durante a Operação Lava Jato. Mas ao contrário desses e outros personagens, que acabaram – involuntariamente ou não – polarizando boa parte sociedade brasileira, Herman Benjamin tem gerado até agora certo consenso positivo. Tornou-se um exemplo de como expor seus argumentos com determinação.

Benjamin começou a aparecer de forma discreta no noticiário nos últimos meses, mas foi nesta semana que, com sua retórica fluída cheia de frases cortantes e de efeito, ganhou de vez os holofotes. Com vigor e de forma exaustiva e detalhista, defendeu cada uma de suas posições e impôs seu roteiro ao julgamento. Perspicaz e dedicado, confrontou diretamente o ministro Gilmar Mendes, o hábil membro do STF conhecido pela verve afiada e pelo despudor com que muda de posição. Benjamin fez esse contraponto a Mendes se apropriando muitas vezes dos mesmos raciocínios e argumentos utilizados pelo ministro do Supremo para dar prosseguimento à ação movida pelo PSDB. "Não há divergência entre nós, como vou demonstrar", insistia Benjamin ao magistrado nesta quinta. A diferença é que, quando Mendes, um crítico do PT, se mostrou aberto a fazer atualizações na ação devido às revelações trazidas pela Lava Jato, quem ocupava o Planalto era Dilma Rousseff. Agora, ele atuou ostensivamente para salvar o presidente e amigo Michel Temer.

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Outro exemplo de seu afiado discurso apareceu quando os ministros Admar Gonzaga Neto e Tarcísio Vieira advertiram que não se manifestariam sobre doações irregulares da Odebrecht à campanha. Benjamin prontamente desejou "boa sorte" e acrescentou: "Para analisar caixa 1, não precisamos de TSE". Gonzaga então advertiu que Benjamin estava fazendo "discurso para plateia" e querendo "constranger seus colegas". O relator então respondeu: "Se se constrangerem será pelos seus atos".

Benjamin nasceu há 59 anos em Catolé do Rocha, uma pequena cidade do interior da Paraíba. Foi o segundo de seus cidadãos a tornar-se ilustre conhecido do país, depois do cantor Chico César. Ele deixou a cidade muito cedo, ao se mudar para a capital João Pessoa para fazer o ginásio. Seu pai era um médico que queria que o filho Herman seguisse pelo mesmo caminho, mas sua opção finalmente foi pelo direito. Mudou-se então para o Rio de Janeiro e formou-se em 1980 na UFRJ. Dois anos depois passou no concurso para o Ministério Público de São Paulo, onde ficou durante 24 anos – inicialmente em pequenas cidades e, depois, na capital – até ser nomeado, em 2006, para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Passou a ocupar uma cadeira no TSE em outubro de 2015 para um mandato que vai até o fim de setembro deste ano. A partir de outubro, voltará a exercer integralmente sua função no STJ. Fala-se que Benjamin é assumidamente homossexual, mas ao jornal Estado de S. Paulo se limitou a explicar que é um "solteirão convicto", uma "vantagem" que lhe dá "mais tempo para trabalhar". Também confidenciou que tenta voltar ao menos uma vez por ano a Catolé do Rocha para visitar sua mãe, hoje com 83 anos.

Benjamin também chegou a cursar um mestrado no College of Law da University of Illinois (EUA) e a dar aulas em universidades estrangeiras. Em sua passagem pelo MP, onde em 1994 ascendeu a procurador de Justiça, especializou-se em questões ambientais e de direito do consumidor. Entre 1996 e 2000, exerceu como coordenador ambiental do MP, nomeado pelo então chefe da instituição Luiz Antônio Marrey. "Ele foi alguém que revolucionou essa área. Tinha compromisso fortíssimo com a defesa da Mata Atlântica e com a qualidade das águas", conta Marrey, para quem o atual ministro do TSE nunca foi alguém que se contentava com os "tapetes vermelhos" da Justiça. "Pelo contrário. Ele sempre foi uma pessoa prática e aberta. Esteve em boa parte das unidades de conservação e com grande entusiasmo motivou promotores ambientais, estudiosos e advogados. Tornou-se um nome nacional na defesa do meio ambiente, sendo capaz de sensibilizar autoridades, como ministros do Supremo, em determinadas questões".

Marrey define Benjamin, a quem diz conhecer há mais de 30 anos, como alguém "extremamente afável no trato, sempre muito simpático e atualizado com relação a muitos assuntos". "Sua nomeação para o STJ não alterou em absolutamente nada a pessoa que ele é", destaca. Ainda sobre a época em que trabalharam lado a lado, não economiza adjetivos e elogios para definir sua atuação profissional. "Ele é uma pessoa tenaz, determinada naquilo que faz. Exige um padrão de qualidade e pratica um padrão de qualidade muito grande. É extremamente sério", explica Marrey. Ele garante que a admiração por Benjamin no Ministério Público estadual "ainda é enorme". "Ele é estudioso. Sabe todos os detalhes e estuda todos os problemas para estar apto a falar sobre todos os assuntos que precisa falar. Essa tenacidade, essa disciplina e esse conhecimento do detalhe dos problemas que ele está apreciando formam parte de sua personalidade e atuação profissional. Ele agora está reproduzindo num nível mais elevado o mesmo profissionalismo, preparo e dedicação de outras épocas e tarefas".

Toda essa disciplina foi sua principal marca durante o andamento do processo no TSE. Conta-se que acompanhou pessoalmente todos os depoimentos durante a fase de instrução. Imprimiu um estilo centralizador e perfeccionista até na revisão do português, o que explica a demora a liberar decisões para publicação do acórdão. Se em geral prefere ficar fora dos holofotes, também sabe, como gostam de dizer seus colegas do TSE, "jogar para a plateia". Nesta quinta, em determinado momento do julgamento, se dirigiu diretamente ao telespectador: "É muito importante que os brasileiros escutem isso com atenção". Também apelou ao senso comum ao falar em "propina poupança" ou "propina gordura" para descrever o dinheiro acumulado em anos de desvios da Petrobras.

Para os que acompanham com lupa o drama político brasileiro, a marca do julgamento no TSE foi a obstinação do relator, exposta em uma frase que, a essa altura, já virou todo um símbolo de sua atuação: "Poderia parar por aqui, mas não vou". Igual de simbólico foi o momento em que Gilmar Mandes advertiu que o tribunal cassara mais mandatos que a ditadura. Benjamin então respondeu: "A ditadura cassava quem defendia a democracia. O TSE hoje cassa quem ataca a democracia". Nesta quinta, em um debate sobre medo com o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, também advertiu: "Infelizmente, o que não há neste país é medo. Porque se houvesse medo, isso não teria acontecido". Já quando um Gilmar Mendes mais dócil elogiava a imersão de Benjamin no caso e dizia que seu trabalho ajudaria o Brasil a tocar as reformas que tanto precisa, o relator mais uma vez rebateu: "O que a gente faz aqui é educativo. Mas o que mais educativo tem é a aplicação da lei. Com todas as suas consequências". Finalmente, após emitir seu voto a favor da cassação da chapa Dilma-Temer, concluiu sua longa e exaustiva atuação no julgamento com uma frase que possivelmente entrará na história: "Eu, como juiz, recuso o papel de coveiro da prova viva. Posso até participar do velório, mas não carrego o caixão".

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