Depoimentos da Odebrecht, um divisor de águas para a Justiça eleitoral
TSE tem a oportunidade de definir um padrão sobre abuso de poder econômico nas eleições Cassação de chapa presidencial a partir de denúncias de delação pode ser um passo muito drástico
Os ilícitos denunciados pelos executivos da Odebrecht devem ser levados em consideração no processo que pode cassar a chapa Dilma Rousseff-Michel Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE)? A resposta a essa pergunta começará a ser respondida na retomada do julgamento nesta quinta-feira e pode valer mais do que o mandato do atual presidente da República. “Esse julgamento é tão histórico e importante que ele é um fixador de parâmetros. Ele vai fixar critérios para tudo que vier depois”, diz Silvana Batini, professora da FGV Direito Rio e procuradora regional da República.
“A Constituição não define o que é abuso. Só diz que a gente tem que proteger as eleições do abuso do poder econômico. Então, a construção do que é abuso é feita caso a caso", diz a professora. "Nesse caso, a gente tem alguns exemplos clássicos: aquele volume imenso de caixa dois, pagamento de marqueteiro fora do país, compra de apoio político de outros partidos, compra de tempo na televisão de outros partidos, desvio de dinheiro estatal através de caixa um e caixa dois. São exemplos muito práticos e pesados e seria a oportunidade da Justiça Eleitoral de dizer: isso é abuso”, completa.
Segundo Batini, a cassação da chapa Dilma-Temer sinalizaria um norte para as próximas eleições, e também para os juízes eleitorais que estão começando a julgar os abusos cometidos no pleito do ano passado. O tom dos debates da sessão desta quarta-feira levou a crer, contudo, que a maioria dos ministros do TSE deve votar para absolver o presidente. E o caminho para fazer isso pode passar por desconsiderar os depoimentos de Marcelo Odebrecht e João Santana concedidos ao relator do processo, o ministro Herman Benjamin.
Para o advogado Silvio Salata, que preside a comissão especial de direito eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil-SP, é impossível as questões relacionadas à Odebrecht serem consideradas no processo. Para ele, os depoimentos deveriam ser considerados provas ilícitas, "porque ainda não foram submetidos ao crivo do contraditório e da ampla defesa". Ele se refere ao fato de que essas convocações do TSE foram feitas a partir de delações que, à época, ainda não tinham sido comprovadas. "Se [os delatores] não apresentarem prova, perdem a delação. Isso que ele [Herman Benjamin] trouxe para o processo é uma coisa absolutamente ilícita", critica o advogado, acrescentando que houve uma contaminação da prova no processo eleitoral, "em razão da ilicitude lá atrás, porque aquilo ainda não era uma prova legal".
Embate
Em sua manifestação nesta quarta-feira, Herman Benjamin destacou que foi o presidente do TSE, Gilmar Mendes, quem defendeu, em 2015, que as informações da Operação Lava Jato deveriam ser consideradas no processo do TSE. "Não nego o que fiz ontem", rebateu Mendes. Ele destacou, contudo, que apesar de garantir o prosseguimento da ação, seu voto nunca considerou a cassação de chapa, mas apenas o aprimoramento do processo eleitoral.
A verdade é que as possibilidades do julgamento que começou nesta semana são múltiplas. Para alguns, a chapa é indivisível, e Dilma tem o destino atrelado a Temer, com ampla jurisprudência do tribunal neste sentido. Para outros, não seria necessário dividir a chapa para preservar o mandato do peemedebista — já que a petista perdeu o mandato, bastaria não encontrar prova de que o presidente praticou abuso.
Para Silvana Batini, apesar de reforçar a denúncia, os depoimentos dos delatores da Odebrecht não são necessários para comprovar a tese do abuso de poder econômico. "A sustentação do procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino, não toca na Odebrecht. Ele se referiu várias vezes a provas periciais, às gráficas, à insustentabilidade daquelas empresas que receberam dinheiro e declararam que prestaram serviços sem prestar. Existe um contexto probatório extra Odebrecht que sustenta a tese do abuso", defende a professora da FGV.
Por outro lado, destaca Silvio Salata, "para cassar o cargo do mandato eletivo consagrado pela soberania popular, que é a cláusula pétrea da escolha dos representantes do povo, teria de haver uma prova segura, idônea e muito contundente". Ele não enxerga essa prova. Mais do que o resultado do processo, portanto, é a forma como o TSE vai embasar sua decisão que deve definir qual será o impacto do maior julgamento de sua história de 85 anos para os rumos da Justiça Eleitoral brasileira.
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