_
_
_
_
_

Le Pen a Macron: “A França será governada por uma mulher. Eu ou Merkel”

Debate entre candidatos à presidência da França expõe visões e estilos diametralmente opostos

Marc Bassets

Raramente vimos uma batalha dialética de tal intensidade em um debate eleitoral. Os argumentos, contundentes de um e do outro da mesa. As acusações, ad hominem e ofensivas em muitas ocasiões. O ritmo, endemoniado, um veloz pingue-pongue dialético que expôs a milhões de telespectadores duas visões e estilos diametralmente opostos. O centrista Emmanuel Macron saiu na noite de quarta-feira do último debate televisivo consolidado como favorito para o segundo turno das eleições presidenciais francesas do próximo domingo contra Marine Le Pen, a candidata do velho partido de extrema direita Frente Nacional (FN).

Apoiadores do candidato social-liberal do movimento Em Marcha!, em um bar de Paris.
Apoiadores do candidato social-liberal do movimento Em Marcha!, em um bar de Paris.EFE
Mais informações
Militantes de Mélenchon pedem voto em branco ou nulo
Le Pen diminui distância de Macron a uma semana das eleições
‘Muro’ contra a vitória de Marine Le Pen na França mostra fissuras

Foi um combate anormal, assimétrico. Esgrima contra a luta livre, folha contra o martelo, os argumentos e a emoção.

Macron, candidato da nova formação Em Marcha!, exibiu um grande domínio técnico dos temas, um controle dos matizes que contrastava com o estilo 'casca grossa' da adversária, o que a colocou em dificuldades quando o debate entrava nos detalhes. “Você está falando bobagem”, repetiu várias vezes. Ou “mente o tempo todo”. Macron, favorito absoluto de acordo com todas as pesquisas, lembrou desde o início que Le Pen é a herdeira da extrema direita: seu pai, Jean-Marie, fundou a Frente Nacional. E contrastou sua visão apocalíptica e derrotista com o otimismo e o “espírito de conquista” – a França que ganha, que não teme a globalização – que ele encarna nesta campanha.

Le Pen procurou desde a primeira resposta o corpo a corpo com argumentos mais gerais, uma ou duas ideias que martelava fosse qual fosse o assunto em questão. Primeiro, a ideia de que Macron é responsável pela herança do impopular presidente François Hollande, de quem foi assessor no Palácio do Eliseu e depois ministro da Economia. E, segundo, que Macron, que trabalhou como banqueiro antes de entrar na política e defende um europeísmo sem complexos, está a serviço não dos interesses dos cidadãos franceses ou da nação, mas de poderes supranacionais, como a Comissão Europeia ou os grandes grupos financeiros. É, segundo a candidata da FN, o homem do sistema.

Em dado momento, Macron alfinetou: "Seu projeto é mortal" na sua proposta de deixar a Europa e o euro. A que Le Pen respondeu: "A França será governada por uma mulher. Seja ou Madame Merkel "(...)" Você representar a França submissa ".

O debate foi um acontecimento televisivo e político excepcional. Pela primeira vez desde que Valéry Giscard d’Estaing e François Mitterrand debateram diante das câmeras em 1974, os dois candidatos não pertenciam a nenhum dos dois grandes partidos, eliminados no primeiro turno do último 23 de abril. Quando em 2002, Jean-Marie Le Pen chegou ao segundo turno, seu rival da época, Jacques Chirac, se recusou a debater com ele.

Quinze anos depois, muito mudou. A unidade daquela época, contra Le Pen pai, rachou. Macron não podia se dar ao luxo de não debater. Com uma vantagem de 20 pontos, o debate, organizado pelas redes TF1 e France 2, significava uma plataforma para mostrar que ele, novato nas campanhas, jovem aos 39 anos para a política presidencial, tem base para ocupar o cargo. Para Le Pen, de 46 anos, representava a última oportunidade de virar o jogo. Vai ser difícil que consiga.

Aposentadoria e terrorismo

A economia foi o centro na primeira parte. Le Pen tentou colocar o debate no contexto da luta entre a “globalização selvagem”, o “ultraliberalismo” e a ideologia do dinheiro contra a soberania dos franceses e os direitos dos trabalhadores. Defendeu a aposentadoria aos 60 anos. E atacou Macron, a quem associou às reformas de Hollande por pedir constantemente sacrifícios aos franceses. “Não aceito esta culpabilização dos franceses”, afirmou. Era a versão mais esquerdista de uma candidata que vem da extrema direita, mas que procura uma mensagem transversal que atraia – ou pelo menos desmobilize – os eleitores do radical de esquerda Jean-Luc Mélenchon.

Ao abordar o terrorismo, questão predileta de Le Pen, a tensão aumentou. A candidata acusou Macron de “complacência com o terrorismo islâmico”. Macron não permitiu que se apoderasse desta questão. Alertou que as medidas de Le Pen alimentam o Estado Islâmico e levam o país à “guerra civil”.

De fundo, uma colisão de visões antagônicas sobre o lugar da França no mundo e a identidade do país. Nada ficou de fora nas duas horas e vinte minutos de debate. Nem mesmo a política da memória, o impacto da história no presente. Para Macron, é necessário assumir os episódios mais traumáticos, como os crimes na guerra da Argélia ou o regime colaboracionista de Vichy durante a Segunda Guerra Mundial. Le Pen, cujo partido nasceu para se opor ao gaullismo, apelou ao general De Gaulle, fundador da V República, para defender que a França não teve nada a ver com os crimes de Vichy. Macron, que também reivindica o general, respondeu: “Deixe o General De Gaulle tranquilo”.

A batalha pelo euro marca a reta final

A mensagem que finalmente pode decidir a eleição presidencial em favor do europeísta Macron é a economia. Os franceses recusam de maneira esmagadora a saída do euro, motivo pelo qual Le Pen tratou de suavizar sua mensagem, afirmando que o abandono da moeda única já não é uma prioridade.

Macron aproveitou durante o debate a confusão criada neste tema. “Saímos ou não do euro?”, perguntou-lhe. “Temos que recuperar nossa moeda nacional”, replicou Le Pen. Mas simultaneamente assegurou que negociará para que “o euro seja transformado em uma moeda comum”. Então, insistiu Macron, "as empresas, pagarão em euros ou não? Porque uma grande empresa não pode pagar uma coisa em euros e a seus assalariados em francos. O que diz não tem nenhum sentido”, concluiu.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_