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STF manda soltar José Dirceu e expõe queda de braço entre Corte e Lava Jato

Segunda turma acata pedido da defesa do petista e pede que Moro determine pena alternativa

Gil Alessi

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta terça-feira, acatar o pedido de habeas corpus do ex-ministro José Dirceu, e determinou, por três votos a dois, a libertação do petista. Ele já havia sido condenado em primeira instância pelo juiz Sérgio Moro em processos nos quais soma mais de 32 anos de prisão e estava detido em prisão preventiva desde agosto de 2015 por sua participação no esquema de corrupção investigado pela Operação Lava Jato. A decisão da Corte se soma a outras tomadas nos últimos dias no sentido de derrubar as prisões preventivas determinadas por Moro e pelo juiz Marcelo Bretas, que julga ações da Lava Jato na primeira instância no Rio. Na última semana o STF soltou três presos da Lava Jato: o empresário Eike Batista, o ex-assessor do PP João Cláudio Genu e o pecuarista José Carlos Bumlai, que é próximo do ex-presidente Lula.

O ex-ministro José Dirceu.
O ex-ministro José Dirceu.Fotos Públicas

Agora Sérgio Moro terá que definir uma forma alternativa para o cumprimento de pena de Dirceu - que pode ser o uso de tornozeleira eletrônica, por exemplo - até que a condenação seja mantida ou revogada em instâncias superiores.

As reiteradas decisões pró-habeas corpus tomadas pelo Supremo podem dar fôlego aos pedidos de liberdade feitos por outros presos pela Lava Jato, como o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, os ex-deputados Eduardo Cunha (PMDB) e André Vargas (PT), e o ex-diretor da Petrobras Renato Duque. O caso de Cunha é considerado crucial, tendo em vista o impacto que uma delação do ex-parlamentar pode provocar em Brasília. Cunha já teve pedidos de habeas corpus negados no STF e no Superior Tribunal de Justiça. Caso continue preso, cresce a pressão para que ele colabore com a Justiça com informações que podem atingir do presidente Michel Temer a parlamentares do baixo clero.

Com a nova decisão, tomada pela segunda turma do STF, fica evidente que a interpretação de parte dos ministros se choca com as decisões de Moro com relação às prisões preventivas. Os críticos deste expediente afirmam que ele está sendo usado para coagir investigados e condenados a firmarem acordos de delação premiada - argumento rebatido pela força-tarefa. Na semana passada Gilmar Mendes, que votou favoravelmente à libertação dos detidos, afirmou que “Curitiba passou dos limites e concedemos os habeas corpus”. Ele já havia criticado o que chamou de “alongadas prisões” determinadas por Moro. Pela legislação brasileira, o início do cumprimento de pena é permitido apenas após a confirmação da sentença na segunda instância, o que não ocorreu nos casos mencionados. O advogado de Dirceu, Roberto Podval, criticou durante a sessão o longo tempo de prisão preventiva aplicado a seu cliente. De acordo com ele, o petista não tem mais como interferir na produção de provas - o que justificaria sua detenção.

O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, afirmou durante a sessão que a reiteração criminosa de Dirceu justificaria a manutenção da prisão. “O tempo de prisão não pode ser analisado apenas numericamente (...) é preciso ter em conta a periculosidade do caso", disse. Ele votou pela manutenção da prisão preventiva, e foi acompanhado por Celso de Mello, que afirmou ser necessária uma "atuação rigorosa" do Judiciário. Dias Toffoli, que já havia votado pela libertação nos outros casos semana passada, manteve seu entendimento anterior de que a restrição da liberdade deve ser "o último mecanismo a que um juiz deve recorrer" e que existem outras medidas alternativas para o petista, como o uso de tornozeleira eletrônica. Segundo o magistrado, caberia a Moro determinar qual seria essa alternativa. Ricardo Lewandowski acompanhou o voto de Toffoli e citou o ordenamento jurídico brasileiro que impede a prisão após condenação em primeira instância.

O voto de minerva coube a Mendes: o ministro optou por acatar o habeas corpus de Dirceu. O ministro disse ainda que durante o julgamento do Mensalão não foi decretada nenhuma prisão preventiva, e o caso também era "complexo". Para o ministro, "por vezes a Justiça precisa proteger o cidadão de seus próprios instintos". Mendes também aproveitou para criticar a força-tarefa da Lava Jato, a quem ele se referiu como "jovens" que não tem "vivência institucional".

A ofensiva da Lava Jato contra Dirceu

A reação da força-tarefa da Lava Jato foi dura. Em texto em sua página do Facebook, o procurador que lidera a força-tarefa da operação, Deltan Dallagnol, classificou a soltura de Dirceu de "incoerente", elencou casos em que a mesma turma do STF votou para manter prisões preventivas: “Nossas esperanças foram frustradas. Fica um receio”, disse ele.

Horas antes de ter seu habeas corpus julgado,  a Lava Jato havia tentado uma última cartada para tentar robustecer os argumentos para manter o ex-ministro do PT preso: Dirceu foi alvo de nova denúncia da operação nesta terça-feira. O petista foi acusado pelo Ministério Público Federal de receber 2,4 milhões de reais em propinas das empreiteiras UTC e Engevix. O dinheiro, obtido a partir de contratos com a Petrobras, teria sido usado, segundo a denúncia, para custear assessoria de imprensa e imagem de Dirceu. Os pagamentos teriam ocorrido entre abril e 2011 e outubro de 2014, durante e após o julgamento do Mensalão, ação na qual ele também foi condenado. O procurador Júlio Noronha afirma que “é chocante que o ex-ministro-chefe da Casa Civil tenha usado dinheiro da corrupção na Petrobras para contornar os efeitos negativos da descoberta de seus crimes [no Mensalão]. É o crime sendo usado para reduzir os prejuízos do crime descoberto”.

Naquele momento, Deltan Dallagnol evitou polemizar com o STF: "Nós não queremos passar a impressão equivocada, muitas vezes, de que nós poderíamos estar buscando burlar a apreciação de um decreto de prisão examinado por parte de um tribunal superior". O advogado de Dirceu considerou que a apresentação de denúncia pelo MPF nesta terça não é “ética”. Já Gilmar Mendes, que já se envolveu em outras trocas de farpas públicas com a Lava Jato, enviou o recado antes do julgamento e em seu voto: "Não cabe a procurador da República nem a ninguém pressionar o Supremo Tribunal Federal, seja pela forma que quiser. É preciso respeitar as linhas básicas do estado democrático de direito. Quando nós quebramos isso, estamos semeando o embrião, a semente do viés autoritário."

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