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Cartões postais contra o medo, a aposta de Paris para sediar os Jogos de 2024

Capital francesa quer bater Los Angeles enquanto cresce o debate público sobre o modelo do evento

Simulação com arena do vôlei de praia ao lado da Torre Eiffel, parte da candidatura de Paris para os Jogos.
Simulação com arena do vôlei de praia ao lado da Torre Eiffel, parte da candidatura de Paris para os Jogos.

A disputa de vôlei de praia acontece aos pés da Torre Eiffel enquanto nadadores do triatlo dão braçadas no rio Sena e cavaleiros saltam elegantes obstáculos nos jardins de Versalhes. É oferecendo seus cartões postais como moldura das competições, especialmente para as transmissões da TV, que Paris pretende vencer o temor por ser potencial alvo de atentados terroristas para se tornar a sede dos Jogos Olímpicos em 2024. Num termômetro da crise do modelo do megaevento, restam apenas duas cidades na corrida. Depois da desistência de Budapeste no mês passado e de Roma, no ano passado, a capital francesa só precisa bater uma concorrente, Los Angeles, para ser anunciada como vencedora em setembro.

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Nomes do comitê organizador ou da prefeitura de Paris nem tentam usar a estratégia de contornar o assunto "ameaça terrorista” quando falam da candidatura da cidade às Olimpíadas. O país está em estado de emergência e com militares nas ruas desde o ataque ao Charlie Hebdo, em 2015. Os incidentes recentes tampouco ajudam. Num dos aeroportos que atendem a capital, um homem tentou roubar a arma de um agente em 18 de março e foi morto e, nas galerias comerciais do Louvre, em fevereiro, um suposto extremista tentou fazer um ataque com uma faca e foi baleado, voltando a elevar a tensão a apenas poucas semanas das eleições presidenciais. A resposta treinada pelos defensores de Paris 2024 é repetir que a segurança é a prioridade número 1 dos organizadores e que, a despeito de reacender o tema, os episódios de 2017 mostram que a capacidade de resposta francesa a ataques melhorou. “O homem não passou nem do primeiro portão no Louvre. Isso mostra que nosso dispositivo de segurança está funcionando”, diz Jean-François Martins, encarregado-adjunto da prefeitura de Paris para Turismo e Esporte. “Nós estamos conscientes do risco, mas, olha, nós fizemos a Eurocopa sem problemas. E, por outro lado, não há risco zero em lugar nenhum. Nos EUA também tem atiradores”, lança Noemie Claret, responsável pela marca da candidatura.

A campanha por sediar os Jogos ganha o impulso com o orgulho ferido de Paris após os atentados. Não é uma iniciativa isolada para promover a imagem da cidade. Como Nova York fez depois do 11 de Setembro, a capital francesa teve que, pela primeira vez em décadas, gastar dinheiro para se promover e conter a queda, ainda pequena, no turismo. Em 2016, um milhão e meio de turistas deixaram de visitar a cidade em comparação com o ano anterior, com queda de 6% na ocupação da extensa rede hoteleira.

A disponibilidade gigantesca de hospedagem, aliada à rede de transporte público da cidade, são outros trunfos nos quais Claret e seus colegas apostam para conseguir os votos dos delegados do COI (Comitê Olímpico Internacional) para Paris. A ideia central é a de que a força mítica da cidade e sua vida de rua será capaz de oferecer, cem anos depois de abrigar os Jogos pela última vez, uma boa alternativa ao peso de Hollywood e ao apelo com público mais jovem inerentes a Los Angeles, que sediou a competição em 1984.

“Temos uma candidatura compacta. Tudo se dará num raio de 10 km na cidade”, diz Claret, e acrescenta que já está “quase tudo pronto” na cidade para a competição - à exceção da vila dos atletas e da piscina olímpica. Há ânsia em frisar que “só" 1,5 bilhão de euros dos cofres públicos serão usados em um orçamento de 6,2 bilhões _contra 14,4 bilhões de euros do caixa total para Tóquio 2020 e estimados 11 bilhões de euros no Rio, mais de 40% de dinheiro público. A ênfase é especialmente importante porque ainda reverbera na imprensa o legado de elefantes brancos em Atenas após os Jogos de 2008, sem falar na degradação acelerada dos equipamentos da Rio 2016 e das dívidas do próprio COI no Brasil.

É parte também do esforço de se antecipar às críticas mais gerais ao modelo de megaeventos como as Olimpíadas, vistos como gastadores de dinheiro público, com alto custo ecológico e suscetibilidade à corrupção. Não por acaso petições contrárias de cidadãos e campanhas na Internet foram centrais para que Budapeste e Hamburgo desistissem de concorrer, por exemplo. Mesmo em Londres, em se reporta que as arenas olímpicas foram integradas ao uso da cidade, o lucro de patrocinadores privados em detrimento da cidade não deixou de ser questionado.

Se a tarefa de convencer uma opinião pública doméstica normalmente arisca sobre Paris 2024 já não parecia fácil, a campanha enfrenta ainda um outro inconveniente: a Justiça francesa lançou uma pesada cortina de dúvida sobre a lisura do processo do COI para a escolha da sede olímpica. No começo de março, o jornal Le Monde publicou que o Ministério Público Financeiro da França começou a investigar uma suspeita de lavagem de dinheiro envolvendo um alto dirigente do atletismo global e acabou topando em um suposto esquema que rendeu votos ao Rio para sediar os Jogos do ano passado. “Nós temos que convencer os franceses de que podemos ganhar sem corrupção”, diz Claret.

A repórter viajou à França à convite do Ministério de Relações Exteriores Francês.

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