O sonho da Chapecoense começa outra vez
Campeão da Sul-Americana estreia na Copa Libertadores embalado pelo espírito de superação de seus sobreviventes
Ainda não vai ser dessa vez que a Chapecoense poderá contar com os reforços do zagueiro Neto e do lateral-esquerdo Alan Ruschel, dois dos três jogadores sobreviventes à queda do avião da LaMia que dizimou praticamente toda a delegação do clube há pouco mais de três meses, na Colômbia. Porém, os progressos na recuperação da dupla dão forças ao novo time da Chape, que, nesta terça-feira, fará a primeira exibição de sua história em uma Copa Libertadores da América.
O confronto com o Zulia, da Venezuela, também estreante no torneio, arrasta uma onda de otimismo bastante distinta da ansiedade que pairava sobre a cidade de Chapecó dois meses atrás, quando o clube alviverde sequer tinha uma equipe formada para disputar o Campeonato Catarinense. As boas notícias não param de chegar.
Primeiro sobrevivente resgatado em meio aos destroços nas montanhas colombianas, Alan Ruschel já treina com bola e acompanhou a delegação que participou de um amistoso contra o Sport Boys, do Peru, no último sábado. Ele corria o risco de ficar paraplégico devido a uma lesão na coluna cervical, mas, após uma bem-sucedida cirurgia, seus movimentos das pernas foram preservados. De acordo com as projeções da comissão técnica, ele deve ter condições físicas de voltar a disputar jogos oficiais a partir de maio. O defensor Neto, por sua vez, ainda não tem previsão para retornar aos gramados. Seu quadro inspira mais cuidados, já que, além de uma fratura quinta vértebra lombar, ele ainda teve os ligamentos do joelho direito comprometidos. Entretanto, como vem surpreendendo os médicos em sua evolução, ele pode estar à disposição da comissão técnica até o fim deste semestre.
Presentes diariamente na Arena Condá, Alan Ruschel e Neto, ao lado do goleiro Jackson Follmann, que teve a perna direita amputada, servem de inspiração para os 25 jogadores que o clube contratou nesta temporada. No processo de reinvenção do time, a Chapecoense manteve a fórmula que levou o clube à final da Copa Sul-Americana: apostar em jogadores baratos e experientes, com um histórico de bom comportamento em seus clubes anteriores. São os casos do goleiro Artur Moraes, 36 anos, que vestiu camisas tradicionais da Europa, como Roma-ITA e Benfica-POR, e do atacante Túlio de Melo, 32 anos, que já havia defendido o time catarinense em 2015. Para o lugar de Caio Júnior, a Chape resolveu dar um voto de confiança ao técnico Vágner Mancini, de 50 anos. Ele ganhou seu maior título há mais de uma década dirigindo um time pequeno: a Copa do Brasil, em 2005, pelo Paulista de Jundiaí.
"Apesar do pouco tempo de trabalho, tem sido uma experiência muito intensa ajudar na reconstrução da Chapecoense. O importante é que estamos evoluindo a cada jogo e alcançamos um bom patamar para a estreia na Libertadores", analisou Mancini. Embora tenha despertado a desconfiança dos torcedores com um início de temporada instável, a renovada equipe da Chape se encontrou no Campeonato Catarinense e conseguiu fechar o primeiro turno em segundo lugar, emplacando três vitórias consecutivas antes de estrear na Copa Libertadores.
A onda positiva não se restringe ao campo. Nos últimos seis meses, a Chapecoense foi o clube brasileiro que mais ganhou sócios — superou a marca de 18.000 novas adesões após o acidente. Na semana passada, fechou um patrocínio master para seu uniforme que renderá quase 5 milhões de reais neste ano. Além disso, o Verdão celebra os frutos de suas categorias de base, especialmente na Copa São Paulo de Juniores, em que o clube fez sua melhor campanha da história ao chegar às quartas de final. Entre os 30 jogadores inscritos na Libertadores, incluindo Alan Ruschel e Neto, quatro deles foram formados na Arena Condá.
Pela frente, a Chape tem um caminho difícil para passar da fase de grupos na Libertadores. Além do Zulia, ainda enfrenta Lanús, da Argentina, e o tricampeão Nacional, do Uruguai. Na próxima semana, o clube receberá o time argentino em casa e deve contar com o apoio maciço de seus torcedores, que, em um ritual que vem se repetindo no minuto 71 de cada partida como mandante, entoam o famoso grito de "Vamos, vamos, Chape!", em homenagem aos 71 mortos na tragédia da Colômbia.
OS SEIS SOBREVIVENTES
Alan Ruschel. 27 anos, brasileiro. Lateral-esquerdo. Foi o primeiro jogador resgatado com vida após a queda do avião. Ele já faz treinamentos com bola e deve voltar a jogar em maio.
Erwin Tumiri. 25 anos, boliviano. Técnico aeronáutico. Primeiro sobrevivente a receber alta médica, sofreu ferimentos leves e conseguiu ajudar a resgatar a comissária Ximena Suárez. Ele pretende seguir carreira como piloto de avião na Bolívia.
Jackson Follmann. 24 anos, brasileiro. Goleiro. Passou por diversas cirurgias e, em uma delas, teve a perna direita amputada abaixo do joelho. Foi o último sobrevivente a deixar o hospital. Está em processo de adaptação a uma prótese, mas já consegue caminhar sozinho.
Neto. 31 anos, brasileiro. Zagueiro. O último dos sobreviventes da tragédia esperou oito horas pelo resgate dos bombeiros. Mesmo recuperando-se de uma fratura na quinta vértebra lombar, ele se reapresentou ao clube em janeiro e já realiza trabalhos físicos em campo.
Rafael Henzel. 43 anos, brasileiro. Radialista. Apesar de uma pneumonia contraída no hospital e de fraturas nas costelas e no pé direito, acabou se recuperando mais rápido que o previsto. Tanto que retomou as transmissões dos jogos da Chape nesta temporada pela rádio Oeste Capital.
Ximena Suárez. 28 anos, boliviana. Comissária de bordo. Ficou presa em uma árvore e seu resgate levou quase duas horas. Passou três semanas no hospital, onde foi submetida a seis cirurgias. Ainda não recebeu nenhuma indenização pelo acidente.
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