Em tensão permanente, cracolândia de São Paulo explode mais uma vez
Um fotógrafo foi ferido por um tiro ao cobrir ação da Polícia Militar contra usuários de crack

A cracolândia, região de constantes conflitos na zona central de São Paulo, viveu mais um dia de violência nesta quinta-feira. A Polícia Militar jogou bombas de efeito moral contra usuários de crack, que atiraram contra eles pedaços de pedras e de paus. Um fotógrafo foi atingido por uma bala de arma de fogo enquanto trabalhava no local e está hospitalizado. Segundo a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, seis policiais se feriram, mas não há maiores informações sobre o estado de saúde deles. A reportagem também presenciou ao menos dois usuários machucados, um com um inchaço no braço e outro com um corte na cabeça.
O conflito começou por volta de 12h, enquanto crianças de uma escola estadual próxima saiam das aulas. Segundo usuários da droga, houve uma briga na área conhecida como fluxo, onde acontece o consumo do crack, e a polícia entrou na área e agrediu alguns deles. Com isso, os dependentes se revoltaram e começaram a atirar pedras e paus na direção dos policiais. A Força Tática foi acionada e usou munições não letais. "Olha aqui! Eu estava deitado, quieto e me bateram com um cassetete", reclamava um dos usuários a uma atendente de saúde que atua na área. Ele mostrava marcas vermelhas no braço, que estava inchado.
A Secretaria de Segurança Pública, por sua vez, afirma que policiais do patrulhamento de área fizeram uma abordagem na área quando cerca de 300 pessoas se aglomeraram e começaram a atear fogo em lixo, arremessar pedras e objetos contra a PM. "A polícia agiu para conter a confusão e foi solicitado apoio da Força Tática e da Guarda Civil Metropolitana. Seis policiais, entre integrantes do Corpo de Bombeiros e do policiamento local, ficaram feridos", afirmou o órgão, em nota. No entorno do fluxo era possível ver barricadas, montadas pelos dependentes, com sacos de lixo incinerados e caçambas viradas.
Por volta de 12h30, a situação já parecia controlada. Mas um novo conflito voltou a acontecer, que perdurou por algumas horas. O repórter fotográfico Carlos Gildário Lima de Oliveira, conhecido como Dario Oliveira, de 46 anos, foi atingido neste momento na perna direita. Segundo a Santa Casa de São Paulo, para onde ele foi levado, o artefato que o atingiu era de uma arma letal. No final desta tarde ele realizava exames, se encontrava estável, mas não tinha previsão de alta. De acordo com a Associação de Repórteres Fotográficos e Cinematográficos no Estado de São Paulo, outro profissional também foi atingido pela bala, mas foi salvo pelo celular que estava no bolso e desviou o artefato. A associação repudiou a violência contra jornalistas no exercício da profissão e pediu providências das autoridades para descobrir o autor do disparo.
À espera dos planos da prefeitura
Este é o segundo grande conflito ocorrido na região neste ano. Em 19 de janeiro, uma intervenção da polícia também iniciada após uma confusão entre usuários de crack também contou com o uso de bombas de borracha e gás lacrimogêneo. Depois disso, houve uma correria generalizada pelo centro de São Paulo e lojas da região acabaram depredadas.

Os conflitos na região têm aumentado a preocupação dos trabalhadores e ativistas que prestam auxílio aos dependentes de droga que se concentram na área. O prefeito João Doria (PSDB) afirmou no último dia 7 que pretende acabar com a cracolândia ainda neste semestre, implantando um novo programa de atendimento aos usuários, chamado Redenção, que ainda está sendo gestado. Até o momento, entretanto, não está claro como ele pretende retirar os usuários do fluxo e há uma preocupação de que políticas repressivas, como internações à força e uso da Polícia Militar, sejam o mote do novo programa, como aconteceu inicialmente com o Recomeço, implementado pelo Governo de Geraldo Alckmin. Nesta quinta, trabalhadores do Programa de Braços Abertos, implementado pela gestão do ex-prefeito Fernando Haddad, mostravam preocupação com os rumos do programa, elogiado por oferecer trabalho e moradia aos dependentes químicos.
