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A batalha contra o tempo

A luta dos atletas para conquistar marcas impossíveis gerou outra competição nos: a tecnológica Apresentamos os marcos do desafio dos relojoeiros suíços para cronometrar grandes recordes

Xosé Hermida
Sistema dá o tiro de largada através de um sinal sonoro para corredores.
Sistema dá o tiro de largada através de um sinal sonoro para corredores.

Ao lado de Jesse Owens, quando deixou Hitler de cara fechada nos turbulentos Jogos de Berlim 1936. Enterrado na caixa de areia do estádio da Cidade do México, em 1968, para confirmar que foi real aquele salto extraterrestre de Bob Beamon, de 8,90 metros. Acima da piscina para esclarecer o duelo de milímetros entre Michael Phelps e Milorad Cavic em Pequim, há oito anos. Em todos esses marcos da lenda olímpica estava presente, no segundo plano, para testemunhar o momento, o enviado de um relojoeiro suíço.

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A luta dos atletas contra o tempo começou sendo questão de segundos; em seguida, desceu para um combate que se decidia por décimos e terminou em uma batalha microscópica que está por um centésimo. A sucessão de marcas impossíveis colocou o desenlace de muitas competições fora do alcance do olho humano. Para resolver o problema, é necessário um sofisticado sistema de câmeras e alertas eletrônicos.

“O esporte precisa de um campo de jogo, participantes e um vencedor. Nosso trabalho é ajudar este último”, diz Alain Zobrist, CEO da Swiss Timing, a divisão da histórica empresa Omega, que no Rio de Janeiro cronometrará os Jogos Olímpicos pela 27ª vez desde 1932. Proclamar um vencedor pode ser mais difícil do que parece. Em Los Angeles 84 chegou-se a fazer descer do pódio a francesa Michèle Chardonnet, em lágrimas, quando estava para receber a medalha de bronze depois de empatar no terceiro lugar nos 100 metros com barreiras. Meses depois, ela recuperaria o prêmio. Já na piscina olímpica de Roma 60, os juízes também ficaram divididos na hora de anunciar o veredito sobre o vencedor dos 100 metros nado livre.

A Photosprint proporcionava uma imagem 30 segundo depois do fim das corridas.
A Photosprint proporcionava uma imagem 30 segundo depois do fim das corridas.

Na pré-história dos Jogos Olímpicos, a complexidade da luta contra o tempo, eterna fonte de controvérsias, era resolvida no olho. Cada juiz tinha seu cronômetro e, como as marcas não costumavam coincidir, fazia-se a média de todos os tempos cronometrados. Foi em 1932 que o Comitê Olímpico Internacional (COI) unificou a cronometragem. Muito perto de Lausanne (Suíça), onde fica a sede da organização esportiva, eram feitos os melhores relógios do mundo. Um dos fabricantes, a Omega, tinha um cronômetro com dois ponteiros de segundos, um dos quais podia ser parado para contabilizar o tempo intermediário enquanto o outro continuava a avançar. Com 30 aparelhos desses os suíços embarcaram para Los Angeles contratados pelo COI.

O primeiro desafio veio no atletismo, nos 100 metros rasos. Os norte-americanos Metcalfe e Tolan cruzaram a linha de chegada juntos. Havia tempos registrados por seis cronômetros: cinco deram o mesmo tempo aos dois; o outro, um segundo a mais para Tolan. Mas os juízes confiaram num filme e proclamaram vencedor este último. Acabava de começar a corrida tecnológica nos Jogos Olímpicos.

Câmeras de alta velocidade para cada raia da piscina olímpica.
Câmeras de alta velocidade para cada raia da piscina olímpica.

O que aconteceu em 1932 se repetiu em 1960, na piscina de Roma. Havia 15 anos que já se usava um sistema muito mais preciso nas corridas de atletismo, a photo finish, uma célula fotoelétrica colocada na linha de chegada e conectada a uma câmera. Na natação tudo era mais rudimentar. E a grande confusão veio na final dos 100 metros estilo livre. Os cronômetros apontaram como vencedor o norte-americano Larson, com um segundo de vantagem sobre o australiano Devitt, mas metade dos juízes tinha visto o contrário. Com o júri dividido, o presidente confiou no seu olho e usou o voto de Minerva para dar o ouro a Devitt.

Europeu de Atletismo de Budapeste, em 1966. A mítica escada de onde se fazia a medição das chegadas.
Europeu de Atletismo de Budapeste, em 1966. A mítica escada de onde se fazia a medição das chegadas.

Esse episódio estimulou a busca por um método mais confiável, e em 1968 os engenheiros da Omega apresentaram o painel de toque na piscina, com o qual os nadadores sinalizavam sua chegada. Um grande avanço, embora 32 anos depois, em Pequim, também foram necessárias câmeras de alta precisão para apontar o vencedor da final dos 100 metros borboleta entre Cavic e Phelps, decidida em favor do norte-americano por um centésimo de segundo, a menor margem possível. A tecnologia, explica o CEO da Swiss Timing, permitiria registrar até milionésimos de segundo. Mas não serviria para nada: seriam necessários instrumentos para medir com a mesma precisão até o invisível todas as raias da piscina.

No atletismo, as câmaras da linha de chegada podem fazer até 10.000 imagens por segundo atualmente. Ainda assim, técnicos e juízes precisaram de 10 minutos para decifrar a photo finish da final dos 100 metros no Europeu de Atletismo de Barcelona 2010. Quando perguntado se não há margem de erro, Zobrist é enfático: “Não há. Não podemos cometer nenhum erro. Por isso nossa responsabilidade é tão grande”. Uma das últimas inovações da empresa suíça foi o tiro de partida que cada atleta recebe com um sinal sonoro em seu calcanhar para garantir a todos o mesmo tempo de resposta. No Rio –onde os 30 cronômetros de 1932 se transformaram em duas toneladas de equipamentos e 480 profissionais– será homologado um sistema que aperfeiçoa a detecção das largadas queimadas. Como os atletas na pista, os herdeiros do velho relojoeiro têm o compromisso de capturar o tempo: “Um segundo será sempre um segundo, mas a tecnologia não para. E cada vez será mais e mais precisa”.

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