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Papa Francisco admite a possibilidade de uso de contraceptivos contra o zika

Francisco condena o aborto, mas fala da contracepção como “um mal menor”

O papa Francisco se dirige aos jornalistas a bordo do avião que o leva do México para a Itália, em 18 de fevereiro.Foto: atlas | Vídeo: ATLAS
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Durante seu voo de regresso a Roma depois de seis dias de intensa viagem pelo México, o papa Francisco se abriu à possibilidade de que a Igreja católica admita o uso de contraceptivos para evitar o contágio do zika vírus nas regiões afetadas, mas se negou de forma taxativa a permitir o aborto como “mal menor”, mesmo nos casos de grave malformação congênita. Jorge Mario Bergoglio recordou que, nos anos sessenta, Paulo VI permitiu às freiras do antigo Congo belga “usar contraceptivos para casos de estupro”.

Mas daí a deixar de condenar a prática do aborto vai um abismo insuperável, advertiu Francisco durante uma coletiva de imprensa de uma hora. “O aborto não é um mal menor”, disse, “é um crime, um mal absoluto, é descartar um para salvar o outro, como faz a máfia”. A posição do Papa, embora previsível em relação ao aborto, abre uma porta para a tolerância do uso de contraceptivos. “Não confundir o mal de evitar a gravidez, por si só, com o aborto. O aborto não é um problema teológico: é um problema humano, é um problema médico, vai contra o juramento hipocrático que os médicos têm de fazer. Por sua vez, evitar a gravidez não é um mal absoluto”, disse, em referência à situação criada pela expansão do zika vírus.

“Falamos em termos de conflito entre o quinto mandamento [não matar] e o sexto [não cometer adultério]. Paulo VI, o grande, em uma situação difícil na África permitiu às freiras usarem contraceptivos para casos em que foram violentadas. Também eu exortaria os médicos a que façam de tudo para encontrar vacinas contra esses mosquitos [o Aedes aegypti, que transmite o zika]”, acrescentou.

Diante da polêmica suscitada depois da publicação esta semana de informações que apontam a uma suposta relação íntima de João Paulo II com uma mulher, Bergoglio minimizou a importância do assunto. “Era uma coisa que se sabia”, disse, “há até livros sobre isso. João Paulo era um homem inquieto. E eu direi, além disso, que um homem que não sabe ter uma boa relação de amizade com uma mulher — e não falo dos misóginos, que são doentes — é um homem ao qual falta alguma coisa. Eu gosto sempre de escutar o parecer de uma mulher. E te dão tanta riqueza. Olham as coisas de outro modo. Uma amizade com uma mulher não é pecado. Uma relação amorosa com uma mulher que não seja a sua mulher é pecado. Entendido?”.

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Bergoglio, que durante seu primeiro dia no México ajustou as contas com uma hierarquia eclesiástica sobre a qual ainda pesa a sombra do fundador dos Legionários de Cristo, foi interpelado sobre a prática — até agora habitual na Igreja — de transferir os padres pedófilos para ocultá-los da ação da justiça. “Um bispo que muda um sacerdote de paróquia quando se detecta uma pedofilia”, disse o Papa, “é um inconsciente, e o melhor que pode fazer é apresentar a renúncia. Claríssimo?” Em seguida acrescentou que o Vaticano continua trabalhando, sob sua direta supervisão, para acelerar os mecanismos de prevenção e condenação. Bergoglio prestou homenagem a Bento XVI por iniciar a investigação contra Marcial Maciel e determinar tolerância zero com a pedofilia: “Eu dou graças a Deus por ter sido destampada essa panela [a dos abusos a menores por parte de religiosos] e é preciso continuar destampando-a. E tomar consciência. É uma monstruosidade, porque um sacerdote está consagrado para levar uma criança a Deus e aí se aproveita dela como em um sacrifício diabólico, a destrói”.

Durante sua estadia no México, o Papa se referiu em múltiplas ocasiões ao drama dos mortos e desaparecidos por culpa do narcotráfico e do crime organizado. Ainda assim, houve certa polêmica pela decisão de Bergoglio de não se reunir com os parentes dos “43 de Ayotzinapa”. Francisco justificou a decisão dizendo que houve alguma tentativa de sua parte, mas foi descartada depois de se constatar a quantidade de grupos, “inclusive que se enfrentavam entre si”, e do fato de ser “praticamente impossível receber a todos”. Bergoglio acrescentou: “A sociedade mexicana é vítima dos bandos do narcotráfico e dos traficantes de pessoas. É uma dor muito grande que esse povo não merece”.

Durante sua estada no México, o Papa estimulou os jovens a ter sonhos. Um jornalista perguntou a Bergoglio qual era seu sonho. Não demorou nem um segundo para responder: “Meu sonho é viajar para a China”. Questionado sobre o pré-candidato republicano Donald Trump, aspirante à Casa Branca, o Papa foi duro: "Uma pessoa que pensa apenas em construir muros, onde quer que seja, e não em construir pontes, não é um cristão".

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