Em busca do voto de Deus em Iowa
Os evangélicos são a chave nas convenções na escolha do candidato republicano à Casa Branca
São centenas e centenas de vagas de estacionamento em volta de um edifício circular. Parece a paisagem dos centros comerciais que inundam os subúrbios das cidades norte-americanas. Mas não é um centro comercial. É uma megaigreja.
A Igreja Luterana da Esperança, em West Des Moines, evidencia o poder do evangelismo cristão em Iowa, no Meio Oeste dos Estados Unidos. Toda semana, uma média de 10.000 fiéis acorrem a esta igreja protestante. É a mais popular de Iowa. E está entre as 70 primeiras do país.
Os evangélicos — cristãos que defendem uma leitura literal da Bíblia — votaram, nos últimos anos, no Partido Republicano. Eles são a chave nas convenções partidárias de segunda-feira em Iowa na escolha do candidato conservador às eleições presidenciais de novembro. São os votantes mais ativos. A participação total nas convenções de 2012 rondou os 6%. A dos evangélicos ou renascidos [o termo para pessoas que se convertem ou redescobrem o cristianismo] foi de 57% na votação dos candidatos republicanos.
Em 2008, as convenções republicanas foram vencidas por Mike Huckabee, o candidato que mais cortejou o voto evangélico. Em 2012, Rick Santorum. Seguindo essa lógica, o vencedor de segunda-feira deveria ser o senador Ted Cruz. Mas Iowa (o primeiro Estado a votar) e esta campanha são imprevisíveis. Cruz mantém uma disputa acirrada nas pesquisas de Iowa com Donald Trump. O magnata, que encabeça as pesquisas nacionais, é menos ortodoxo que Cruz na defesa dos valores tradicionais, mas nas últimas semanas intensificou sua aproximação do público evangélico e recebeu o apoio de um filho do reverendo Jerry Falwell, ideólogo nos anos setenta do ativismo da direita religiosa.
Não há cartazes políticos na Igreja Luterana da Esperança, localizada em uma grande avenida nos arredores de Des Moines, a capital de Iowa. Em um muro no interior se lê: ‘Compartilhe o amor eterno de Jesus Cristo’. É uma igreja muito peculiar. Um edifício baixo e austero de ladrilhos em um complexo de nove hectares inaugurado no ano 2000. O interior é moderno. Tem um corredor circular — com cafeteria, sala de exposições e loja — que leva à nave principal: uma amplíssima sala em forma de meia-lua com 2.800 poltronas de cinema distribuídas em dois níveis.
Melissa, de 45 anos, vai à igreja duas vezes por semana. É uma das 14.000 sócias do centro religioso, que teve em 2015 um orçamento de sete milhões de dólares. Na segunda-feira prevê votar em um candidato republicano que defenda os “valores cristãos”, mas não decidiu em qual. “Minha fé tem um impacto em meu processo de decisão”, explica à porta da igreja.
A 12 quilômetros de distância, em Urbandale, está a sede de O Líder da Família, uma organização cristã. Seu presidente é Bob Vander Plaats, o ativista evangélico mais influente de Iowa. Vander Plaats apoia a candidatura de Cruz e participa de seus atos. O senador recebeu também o apoio de pastores locais. Em 2012, Vander Plaats respaldou Santorum. Em 2008, Huckabee. Nos corredores da sede, estão penduradas numerosas fotografias dele com políticos conhecidos.
“Nos afastamos do coração de Deus e agora estamos vendo onde isso nos levou. É o momento de voltar aos princípios básicos”, diz o ativista em uma entrevista em seu escritório. Acredita que os EUA se afastam do excepcionalismo, dos valores cristãos que, afirma, tolhe a liberdade individual e a prosperidade coletiva. Vê no aborto ou na legalização do casamento homossexual ataques à moral do país.
O movimento evangélico não ganhou protagonismo político nos EUA até o final dos anos setenta e princípio dos oitenta. Iowa foi um laboratório: grupos religiosos transformaram o aborto em um tema político e isso colaborou para que, em 1978, um senador republicano derrotasse de surpresa um democrata. Esse evento e a iniciativa nacional do reverendo Falwell contra a revolução cultural e de costumes nos anos sessenta e setenta deram força ao movimento.
O evangelismo não se associou sempre ao Partido Republicano. Ser evangélico ajudou, em 1976, o democrata Jimmy Carter a ganhar inesperadamente as convenções de Iowa, que propiciaram sua chegada à Casa Branca. Mas, com o tempo, os evangélicos se tornaram uma clientela fiel dos republicanos. Agora, não se pode permitir ignorá-los. Na campanha em Iowa, há concorrência entre os candidatos republicanos para demonstrar quem é mais fiel aos valores cristãos.
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