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Coluna
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Vinho e vergonha na cara

Deu a louca no mapa político. Sucupira saltou do litoral baiano para o planalto central do país

Como bem avisei na semana passada: festa de firma é um perigo. Viu só o que aconteceu no regabofe pantagruélico do Senado? A ministra Kátia Abreu fez do tucano José Serra um involuntário sommelier, sapecando-lhe vinho nas fuças. Notas de machismo encorpado, como diria o amigo Benett, chargista da curitibana Gazeta do Povo. O barraco teve origem na deselegância nada discreta do político paulista ao tratá-la como “namoradeira”.

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Perdão, meu jovem, mas o dramalhão da hora não tem nada de “House of Cards”, a série. Benvindo a Sucupira, a fictícia cidade de “O Bem-Amado”, escrita por Dias Gomes. É só trocar de vinho. Em vez do merlot metido da Capital Federal, um legítimo Jurubeba Leão do Norte. In Vino Veritas. Se bem que Sucupira, por mais que fosse filiada ao realismo-fantástico, jamais chegou a ter um personagem como Eduardo Cunha, figura digna de muxoxos das irmãs Cajazeiras e das embriagadas blasfêmias de Nezinho do Jegue.

Deu a louca no mapa político. Sucupira saltou do litoral baiano para o planalto central do país. Tem algo mais Odorico Paraguaçu, incluindo o uso do latim castiço, do que a missiva do vice-presidente?

Ao modo das moralistas irmãs Cajazeiras, este cronista de costumes vê sacanagem em tudo. Dá para comparar sim muitos episódios da crise política com a vida sexual e amorosa. O Temer, por exemplo, sabe que vive em um casamento de conveniência e, depois de longa temporada como marido conformado e chantagista, resolveu abrir uma D.R., a mitológica discussão de relação, no meio do boteco, para delírio dos garçons e bebuns.

Como nas discussões feministas, tudo é questão de protagonismo. O vice que versa em latim — de velha missa — quer reza. Ego inflamado na paquera com as sinhazinhas da Casa Grande e federações das indústrias, tentou inverter a cabeça da chapa mais de um ano depois das eleições. Tomou a pílula azul do golpismo, dizem os especialistas — a ilusão de poder é o maior dos afrodisíacos e provoca ereções de causar inveja ao tal de Príapo, o deus da paudurescência e da fertilidade.

Na ressaca moral, todavia, tudo como dantes: o vice não mais vicejava e lavou roupa suja em casa com a Dilma, essa prática caseira tão comum nos casamentos fracassados. Foram 50 minutos de D.R., agora interna, particular, como devem ser as discussões do gênero. Assim na política como na vida amorosa: uma D.R. séria normalmente dura um tempo de um jogo de futebol, com acréscimos, pode cronometrar, amigo.

E foram infelizes durante todo o processo de impeachment. À sombra, Temer é um poeta. No surto epistolar, como na carta que virou piada de salão, revelou o que temia no seu livro de poemas “Anônima Intimidade” (editora Topbooks):

“Escrever é expor-se. Revelar sua capacidade Ou incapacidade. E sua intimidade. Nas linhas e entrelinhas. Não teria sido mais útil silenciar? Deixar que saibam-te pelo que parece que és? Que desejo é este que te leva a desnudar-te? A desmascarar-te? Que compulsão é esta? O que buscas? Será a incapacidade de fazer coisas úteis? Mais objetivas? É por isso que procuras o subjetivo? Para quem a tua mensagem? Para ti? Para outrem? Não sei. Mais uma que faço sem saber por quê”.

Com o seu singelo poema, Temer, o sádico marido complacente, parece provar aquela tese do filme “Terra em Transe” (Glauber Rocha, 1967): "A política e a poesia são demais para um só homem".

Todo castigo para corno e petista é pouco a essa altura, provocam as testemunhas da D.R. puxada pelo vice em pleno cabaré de Sucupira. Casamento de conveniência tem data de validade. Sob pena de o ovo da serpente gerar seres inomináveis e inimputáveis como o também peemedebista Eduardo Cunha. Vade retro.

Com ou sem relacionamento de fachada, o que pode fazer a casa cair é algo mais sério do que a futrica: o desembestar da inflação, o carrinho do supermercado vazio e suas rodinhas enferrujadas diante da gôndola... O sol da segunda-feira na fila do desemprego... Aí sim mora o perigo. A vida real bem longe da ficção golpista de Sucupira.

Latim de botequim

O latim que o Temer gastou na carta vazada para Dilma — furaço do Blog do Moreno — inspirou este cronista a retomar um velho projeto de tradução de expressões nacionais para a língua morta. Repare:

Copulatum et malum remuneratum: fodido e mal pago, típica expressão da crise econômica.

Venus involucrum penis circensis: na hora brincante, não esqueça a camisinha.

Urge copulatum ad empacotum est: vai comer aqui ou quer que embrulhe?

Caprina pestilenta: cabra da peste.

Quot homines tot causae - relaxa, é só a cabecinha!

Animus peixeirum lucrandi fraternum: dá uma facada, pedir dinheiro a amigo.

Extra matrimonium cercatorium: ato de pular a cerca.

Pari passu penis excitatum: o sr. está dançando armado, o rapaz está com uma coca-cola no bolso.

Impotentia generandi humanum est: brochar é demasiado humano.

Vis corporalis introdutorium: sexo selvagem inadiável.

Mutatis mutandis forevis: o “prejú” sobrou de novo para mim; nessa parceria eu entro sempre com a retaguarda.

Alea jacta est: o mesmo que ligar o “foda-se”.

Caprina sine puditia: cabra sem-vergonha.

Habeas bovinus intra línea: tem boi na linha.

Simius antiquus intra cumbuca manus non metet: macaco velho não mete a mão em cumbuca.

Dominus jumentum! Frater tuo adjumentum!: seu burro! Ajuda teu irmão!

Cuique simius in cuique cornus: cada macaco no seu galho.

Res bolah: coisas do futebol.

Ego cornus tuus fragmentare: vou quebrar seu galho.

Vade autofragmentare!: vai te lascar!

Domus ferrari, spettus penis: casa de ferreiro, espeto de pau.

Orificium beborium proprietarium nulus: cu de bêbado não tem dono.

Vedi, vini; nulus copulatum: Fomos e voltamos e não comemos ninguém!

Xico Sá, escritor e jornalista, é comentarista do programa “Papo de Segunda” (GNT) e autor de “Os machões dançaram –crônicas de amor & sexo em tempo de homens vacilões” (ed. Record), entre outros livros. 

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