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Tribuna
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

A responsabilidade das oposições

Anotada e registrada a responsabilidade política do petismo, as oposições, em particular o PSDB, têm compromissos com a nação

Fernando Henrique Cardoso

Diante da paralisia governamental, da expansão incontrolada da ação legislativa, da recessão econômica e do ativismo da Justiça, vê-se muita cobrança: e as oposições e o PSDB? Sumiram? Que farão com os mais de cinquenta milhões de votos que receberam? Compreende-se a angústia, mas é preciso distinguir os papéis da oposição e os do Governo.

Como no jogo de xadrez, o Governo joga com as pedras brancas, as iniciativas têm que partir dele. Tomou algumas no desespero, para enfrentar as agruras financeiras. Ao tomá-las foi buscar quadros e medidas no arsenal da oposição. Quer isso dizer que a oposição deve ficar paralisada? Não.

Política econômica é questão de dosagem e de credibilidade. A dose parece excessiva e todo esforço fiscal pode se esvair na falta de atividade econômica que encolhe a arrecadação. Segundo, sem um horizonte de esperança, qualquer ajuste pode ser letal.

Com este Governo não há recuperação de credibilidade à vista, pois o cristal se quebrou. E os escândalos de corrupção revelados diariamente se encarregam de corroer qualquer elo de confiança que o Governo queira tecer.

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Cabe às oposições mostrar no dia a dia, e não só no Congresso, que o sofrimento do povo é consequência da ação desatinada dos governos de Lula e Dilma – da dupla e não só da última – que desdenharam das boas práticas de gestão do Estado. Só na Petrobras, os prejuízos causados por decisões erradas para atender a pressões políticas chegam a 34 bilhões de reais, fora os seis bilhões de propinas! Que dizer do desrespeito sistemático da Lei de Responsabilidade Fiscal. É prova de imprudência no uso do dinheiro público.

É preciso reavivar a memória do povo, a cada instante, para mostrar que este ajuste violento não corresponde ao que foi pregado pelo PSDB, não é “o que o Aécio faria”. O ajuste vai cair nos ombros da população. O aumento de impostos pega todos, empresários e consumidores, desemprego e reajustes salariais abaixo da inflação pegam os trabalhadores. A alta das taxas de juros em doses excessivas aumenta a dívida pública e dificulta o próprio ajuste. Estas medidas podem eventualmente controlar a inflação, mas reduzem a massa salarial e diminuem o consumo. Como o Governo não corta despesas, a retomada do crescimento – se houver – terá sido conseguida a enorme custo para o povo.

O refrão das oposições deve ser: chegamos a tais medidas e ao descalabro atual porque os governos lulo-petistas foram irresponsáveis, não se preocuparam em controlar o gasto público e enganaram o povo, enveredando pela megalomania. Os royalties do pré-sal, diziam, vão resolver os problemas da educação, faremos ao mesmo tempo o trem bala, a transposição do São Francisco, a Norte-sul e a Transnordestina, sem falar nos 800 aeroportos! Concessão de serviço público é coisa de vende-pátria neoliberal. Daremos empréstimos no FIES e no Minha Casa Minha Vida, as bolsas acomodarão os miseráveis e o BNDES dará subsídios em abundância aos empresários. O Tesouro pagará a farra.

Tanto pior, melhor? Não. Anotada e registrada a responsabilidade política do petismo, as oposições, em particular o PSDB, têm compromissos com a nação. Nada justifica arruinar ainda mais o futuro, votando pela derrubada do fator previdenciário. Nada explica apoiar aumentos de gasto que no futuro serão pagos com mais impostos, mais inflação e mais ajustes. Em suma, a oposição deve criticar as políticas petistas e não se confundir com elas. Não deve, porém, votar contra os interesses da nação.

Espera-se mais das oposições. Espera-se que apresentem sua visão de futuro, apontando um rumo ao país. Espera-se que se comprometam com a construção de uma economia de baixo carbono, impulsionada pela inovação, regida por regras claras e estáveis, com agências regulatórias independentes, mais e melhor integrada ao mundo e às cadeias globais de valor.

Espera-se que defendam a re-industrialização do país, sem hesitar na crítica a políticas canhestras de conteúdo nacional que, sob a pretensão enganosa de estimular a produção local, acabam por isolar o Brasil e condená-lo à obsolescência tecnológica.

Espera-se que façam da educação não um slogan, mas de fato uma prioridade do Estado e da sociedade, que tenham a coragem de dizer que, embora avançando, o Brasil está ficando para trás em relação a países comparáveis ao nosso, que, frente à sombra que esse quadro projeta sobre o futuro do país, não receiem enfrentar dogmas e pressões corporativas que dificultam reformas e inovações indispensáveis a um salto de qualidade em matéria de educação.

Espera-se das oposições que sejam progressistas também no campo comportamental: que não defendam a redução da maioridade penal, mas sim a extensão da pena dos menores infratores em dependências que sejam condizentes com a dignidade humana; que apoiem como legítimo e justo o casamento entre pessoas do mesmo sexo; que não fujam ao debate sobre as drogas, que não temam proclamar que o encarceramento dos usuários é parte do problema e não da solução; que sejam assertivas na luta pela igualdade de gênero e contra o preconceito e a discriminação racial, com o uso adequado de cotas e demais medidas compensatórias; e que não aceitem retrocessos legais na questão das terras indígenas.

Espera-se das oposições, sobretudo, que reafirmem seus valores democráticos. Que digam, em alto e bom som, ser possível e necessário atuar contra a deliberada violação de direitos humanos, principalmente em países vizinhos, sem com isso ferir o princípio da não intervenção.

Da mesma maneira, espera-se que reiterem não ter o propósito antidemocrático de derrubar governos, mas tampouco o temor de cumprir seus deveres constitucionais, se os fatos e a lei assim o impuserem.

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